Até 1994, os estados e municípios brasileiros podiam se endividar livremente junto aos bancos privados ou oficiais utilizando a Antecipação de Recursos Orçamentários (ARO). Inclusive, existiam também bancos estaduais que emprestavam aos seus donos. Com o Plano Real (que não foi só a troca de moeda) esta liberalidade foi extinta e os estados passaram a ter necessidade de aprovação do Tesouro Nacional, além de se compromissarem a cumprir metas fiscais. A privatização de bancos estaduais, Credireal e Bemge, foi o passo seguinte. A Minascaixa foi extinta anteriormente pelo governo federal por insuficiência financeira.
Relembre-se ainda que a dívida mobiliária acumulada de Minas era superior a R$ 12 bilhões, tinha juros de mercado e prazos curtos. Com a renegociação, o governo federal assumiu dívidas que não eram dele e refinanciou aos estados com prazos de até 30 anos e juros fixos de 6 a 7,5% (proporcionais à entrada dada), mais a indexação pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). Minas Gerais deu somente 10% de entrada, exceção aberta para nós, porque a quase totalidade dos estados e municípios teve de desembolsar 20%. Foi uma decisão difícil, evidentemente, pois à época não autorizei a privatização da Cemig. Houve exploração eleitoral em 1998 dizendo o contrário, uma grossa mentira.
O valor do estoque da dívida foi reduzido em cerca de 20%. O refinanciamento somou R$ 14,5 bilhões, sendo cerca de R$ 10 bilhões de obras e ações de governos anteriores, inclusive aquelas com organismos internacionais, como a duplicação da Fernão Dias, os financiamentos na área agrícola, os programas de apoio aos municípios (SOMMA) e o programa “Qualidade na Educação” foram incluídas. Somado a este valor foi acrescido o financiamento de R$ 4 bilhões para saneamento financeiro do Banco do Estado de Minas Gerais (Bemge) e Credireal. Metade deste valor foi destinado à formação de Fundos de Previdência dos funcionários dos dois bancos e também dos funcionários da antiga Minascaixa.
Empréstimos de difícil liquidação foram transferidos para o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), tendo rendido cerca de R$ 2 bilhões até hoje. Todas estas providências foram tomadas sob supervisão e apoio do Tesouro Nacional e do Banco Central. A privatização dos bancos foi alvo de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), que nada encontrou de irregular porque não houve. A Centrais de Abastecimento (Ceasa) foi transferida ao governo federal para privatização como abatimento da entrada financeira exigida.
Pedro Malan e Pedro Parente, pelo governo federal, e João Heraldo Lima e Luiz Antonio Athayde, pelo governo de Minas, foram responsáveis por dezenas de reuniões durante muitos meses de complexa negociação. Walfrido dos Mares Guia, então vice-governador, e o ex-ministro Paulo Haddad, também colaboraram durante todo o longo processo que envolveu as equipes técnicas e a Procuradoria do Estado sob a direção de Arésio Dâmaso e Silva.
Passados 25 anos, vários governos tiveram a oportunidade de alterações. Houve uma mudança no indexador para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e inclusão de limite máximo de incidência de taxas com base na Selic que pouco significaram a longo prazo. O último financiamento internacional expressivo foi ainda no governo Aécio Neves, que retomou as negociações paralisadas pela “moratória mineira de 1999”e com estes recursos asfaltou o acesso a 218 cidades mineiras.
A dívida cresceu e passou de R$ 110 bilhões em 2014 para cerca de R$ 160 bilhões atualmente. Este acréscimo é fruto de juros e correções nos últimos 5 anos, sem nenhuma contrapartida em obras ou ações. O governo mineiro nada pagou neste período autorizado por liminares do Supremo Tribunal Federal (STF), que é o grande diferencial das finanças públicas estaduais. Foram divulgadas informações de que dos R$ 160 bilhões, cerca de R$ 100 bilhões são dívidas assumidas pelo governo federal e os outros R$ 60 bilhões de empréstimos avalizados pelo Tesouro Nacional, posteriores à renegociação geral de 1998.
Se as condições pactuadas em 1998 com pagamento de 13% da receita tivessem sido cumpridas, a situação provavelmente seria diferente. Não é fácil resolver, mas aí está o principal ponto a ser discutido pelo Secretário da Fazenda, a exemplo do exitoso trabalho realizado e concluído em 1998. Falar é fácil, difícil é fazer.