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Denúncias de intolerância religiosa crescem mais de 60% em um ano

Foto: Freepik.com

 

Apesar de ser considerado um país laico, usar um símbolo de sua própria religião e ser ofendido por isso tem se tornado cada vez mais comum no Brasil. No mês passado, viralizou nas redes o caso de uma mulher que foi insultada quando voltava para casa, de metrô, na Bahia, por usar adereços comuns ao candomblé, enquanto um homem proferia palavras ofensivas a ela. O registro de denúncias sobre intolerância religiosa feitas ao Disque 100, um serviço do governo federal, cresceu 64,59% de 2022 para 2023, saltando de 898 para 1.478. Já o número de violações cresceu ainda mais (79,39%), indo de 1.184 para 2.124 de um ano para o outro.

De acordo com o painel da Ouvidoria, as pessoas violadas com mais frequência são pertencentes, nessa ordem, às religiões umbanda, candomblé, outras declarações de religiosidades afro-brasileiras, evangélicos e católicos. Os estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Bahia são os que mais têm denúncias.

Entre as queixas, as de violação à liberdade de crença ocupam o primeiro lugar, seguidas das de violação à liberdade de culto e, por fim, as de violação à liberdade de não crença. Em 2023, a pena para quem pratica intolerância religiosa foi aumentada e quem comete esse crime pode pegar de dois a cinco anos de prisão. É a mesma pena prevista para o crime de racismo. Em 2022, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também criou a Política Nacional de Promoção à Liberdade Religiosa e Combate à Intolerância no âmbito do Judiciário brasileiro.

Segundo o advogado Guilherme Andrade, baseado no artigo 208 do Código Penal, configura o crime de intolerância religiosa “zombar de alguém publicamente, por motivo de fé ou por exercer alguma função religiosa, como também impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso e menosprezar publicamente ato ou objeto de culto religioso”. Além disso, ele também lembra que “o artigo 5º da Constituição Federal prevê que a liberdade de consciência e de crença não pode ser violada, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.

A professora de Ciências da Religião Roberta Costa diz que a intolerância religiosa é um conjunto de ideologias e atitudes ofensivas a crenças e práticas espirituais. “É um crime de ódio que fere a liberdade e a dignidade humana. O indivíduo costuma usar palavras ofensivas ao se referir ao grupo religioso atacado e aos elementos, divindades e hábitos da religião. Há casos em que o agressor desmoraliza símbolos religiosos, destruindo imagens, roupas e objetos ritualísticos. Em situações extremas, a intolerância religiosa pode se tornar uma perseguição”.

Segundo ela, “apesar da evolução dos sistemas internacionais de proteção aos direitos humanos, a violação maciça e sistemática ao direito de liberdade religiosa no Brasil ainda é uma realidade constante, principalmente, aos adeptos da umbanda, quimbanda, candomblé e outras expressões de fé de origem africana. “Isso resulta, inclusive, em contínua perseguição religiosa, que muitas vezes se converte na prática de crime de ódio. Ao longo da história do Brasil, as religiões de matriz africana foram desumanizadas e demonizadas, bem como seus praticantes foram, de modo perverso, socialmente marginalizados”.

Roberta afirma que é necessário mudanças no modo de agir e pensar da sociedade. “Nós temos por dever respeitar as diferenças no campo do sagrado, promover o acesso à informação, com conhecimento, discussões e debates, além de lutar por políticas públicas que estimulem a tolerância e a liberdade”.