A expectativa de que o crescimento sustentável da economia, em torno de 3% ao ano, poderia ocorrer de forma indefinida, aparentemente ignorando sequelas previsíveis como a escalada da inflação ou agravamento das contas externas, é um erro. Nosso crescimento potencial é bem mais baixo do que o governo supõe, e sua política de impulsionar a demanda pelo aumento do consumo e do gasto público, apenas deixou essa vulnerabilidade mais clara.
Como o cenário econômico segue marcado por expectativas desancoradas, projeções de inflação elevadas, resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho, este prescreve uma política monetária em patamar significativamente contracionista por período prolongado, para assegurar a convergência da inflação à meta.
Em outras palavras, os membros do colegiado do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central deixaram patente que o ciclo de aperto monetário, além de não estar longe do fim, deverá prosseguir nos próximos meses. Realçam ainda que a política monetária já tem contribuído e seguirá contribuindo para a moderação do crescimento, além de produzir impactos no mercado de crédito, nas sondagens empresariais, no mercado de câmbio, no balanço das empresas, assim como na moderação de alguns indicadores de atividade e de mercado de trabalho.
Em uma crítica indireta à condução errática da gestão econômica do governo, observam ainda o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento do crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo da desinflação em termos de atividade.
Ao admitir que os efeitos da política monetária restritiva se aprofundem nos próximos trimestres, o comitê identificou o aumento do comprometimento da renda familiar com o serviço das dívidas pode antecipar menor demanda por crédito. Segundo ata divulgada, justificam a elevação da Selic em 0,5%, ao patamar atual de 14,75% ao ano, o maior em 20 anos.
A parcela do orçamento das famílias brasileiras comprometida com o pagamento de dívidas voltou a aumentar e já está em nível similar ao período do lançamento do programa Desenrola, em 2023, para estimular a renegociação de débitos e reduzir o elevado endividamento dos brasileiros. Em um período de aperto monetário e endividamento em alta, os bancos tendem a restringir a oferta de empréstimos, e o que sobra para as famílias em dificuldades é recorrer a modalidades com juros mais altos, como o cheque especial, o rotativo do cartão e o crédito pessoal. Entre os principais vilões continuam a ser os alimentos e serviços em geral, que afetam os mais vulneráveis ao endividamento. Com parte do orçamento consumido por dívidas e gastos fixos, muitos responsáveis por domicílios são levados a novos empréstimos.
Em contraste com o que deveria estar sendo feito há muito, estamos neste exato momento apenas testemunhando as autoridades darem voltas e mais voltas – por enquanto improdutivas – em torno do que podemos chamar do X da questão, ou seja, o estreitamento do espaço para investir em infraestrutura, considerando agora também as fraudes do tipo que tem ocorrido no INSS, onde logo se tornarão enormes pressões políticas para o governo assumir uma nova e expressiva conta e, portanto, agravar, em vez de melhorar a situação. Um primeiro passo na tentativa de frear irregularidades foi dado pelo próprio INSS, que determinou o bloqueio de todos os benefícios previdenciários para o registro do desconto de novos empréstimos. Lembrando ainda que no início de 2024, a Controladoria-Geral da União (CGU) soltou um relatório apontando irregularidades na concessão de consignado para aposentados e pensionistas.
Para completar, infelizmente, não estando sozinha como estatal, a nova crise dos Correios é um paradigma no setor postal que a empresa não soube acompanhar, quando ainda não tinha concorrência no que seria sua vocação natural, após as mudanças tecnológicas que a levaram a substituir cartas e telegramas por e-mails e mensagens de WhatsApp à logística, sobretudo a entrega de encomendas e compras on-line. O modelo de negócio, o tamanho e a eficiência da estatal, principalmente com sua utilização mais política do que profissional, estão no centro da crise.
O prejuízo da empresa em 2024 foi de R$ 2,6 bilhões. Os argumentos a favor da venda de ativos são verdadeiros. O país não tem como financiar investimentos na modernização de sua infraestrutura sem privatizações, entrega de serviços à exploração das empresas privadas em diversas áreas onde a presença do Estado deixou de ser necessária. Temos que pressionar para que os responsáveis entendam a necessidade e urgência de usar o Estado para lidar com as falhas do mercado, faltando-lhes a devida competência para tal.