Os desrespeitos, os abusos e os maus-tratos físicos e psicológicos durante a gestação ou no momento do parto são, infelizmente, mais comuns do que pensamos. A violência obstétrica é um problema que atinge várias mulheres em um momento muito delicado de suas vidas, que é a gravidez.
Esse assunto voltou à tona devido a uma denúncia do Ministério Público contra dois médicos obstetras do Hospital Municipal de Governador Valadares, acusados de praticar aborto sem o consentimento da gestante. O caso ocorreu em 2022, na época, a vítima estava com 39 semanas e deu entrada com dores no baixo ventre, depois de horas aguardando atendimento, o bebê faleceu.
Para discutir o assunto, o Edição do Brasil conversou com a Dra. Inessa Beraldo, médica e presidente da Associação de Ginecologistas e Obstetras de Minas Gerais (Sogimig).
O que pode ser considerado violência obstétrica?
A violência obstétrica é uma questão discutida globalmente. Esse termo foi introduzido pela primeira vez em 2007, na Lei Orgânica da Venezuela, destacando a necessidade de abordar as práticas durante a assistência médica. Em 2014, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu a violência obstétrica como uma realidade que precisa ser combatida. Atualmente, o termo mais adequado é ‘maus-tratos na assistência ao parto e nascimento’, que se refere a qualquer comportamento ou prática, intencional ou não, que desrespeita, agride ou causa danos físico e psicológico à mulher durante o parto e o período perinatal.
Como é possível identificar este tipo de violência?
Não há indicadores e parâmetros específicos para mensurar os maus-tratos, sendo estes identificados através de relatos de experiências de mulheres, auditoria de procedimentos hospitalares e a observação de práticas que não seguem as diretrizes e recomendações da OMS para um parto baseado em evidências científicas.
Quais as consequências físicas e mentais que essa violência pode trazer?
As consequências físicas podem incluir lesões desnecessárias e complicações pós-parto. As consequências mentais e emocionais podem envolver uma experiência negativa do parto, trauma psicológico, transtorno de estresse pós-traumático, depressão pós-parto, ansiedade e medo de futuras gestações e partos.
Quais medidas poderiam ser tomadas para diminuir esses casos?
Medidas para diminuir a violência obstétrica incluem: formação e capacitação contínua dos profissionais de saúde; assistência obstétrica baseada no respeito, segurança e ciência, garantindo direitos e autonomia das mulheres durante o parto; educação em saúde, informando gestantes e familiares sobre os procedimentos mais adequados durante a assistência ao parto e nascimento, com a construção conjunta do plano de parto; criação de canais seguros para denúncias; promoção de campanhas de conscientização pública sobre o problema e implementação de políticas de humanização do parto.
Na sua opinião, há grande despreparo das equipes de assistência médica ao lidar com mulheres?
As equipes de assistência obstétrica precisam se atualizar e treinar constantemente para lidar com as necessidades específicas das mulheres durante o parto e também para promover mudanças na cultura hospitalar em favor de uma experiência positiva do parto.
Faltam ações que possam ser úteis na estruturação de políticas públicas, leis e boas práticas no Brasil?
Várias ações e campanhas são realizadas por associações de especialidade e pelo Ministério da Saúde, demonstrando que existem maneiras mais adequadas para a realização de uma assistência obstétrica focada na mulher, levando em consideração as vontades e desejos das pacientes, sem deixar de lado a ciência e a segurança na assistência ao parto e nascimento, como o incentivo ao pré-natal de qualidade e ao plano de parto.