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Brasil é responsável por 40% da perda mundial de florestas

Segundo a Universidade de Maryland, país desmatou cerca de 1,5 milhão de hectares | Foto: Shutterstock

 

Cristiane Mazzetti | Foto: Arquivo pessoal

O Brasil foi responsável por 40% da perda de florestas nativas do mundo em 2021. Foram cerca de 1,5 milhão de hectares desmatados, o equivalente a quase 10 municípios de São Paulo. Os dados foram divulgados pela Global Forest Watch, plataforma de monitoramento da Universidade de Maryland. O mapeamento é feito há duas décadas a partir de análises de imagens de satélite. O estudo aponta que o país vem destruindo áreas gigantes de floresta, com taxa acima de 1 milhão de hectares, desde 2016. Para falar sobre o tema, o Edição do Brasil conversou com Cristiane Mazzetti, especialista em florestas do Greenpeace.

Qual o panorama das florestas brasileiras?
O quanto foi perdido nos últimos anos? O Cerrado já perdeu metade da sua formação original e o Pantanal teve mais de um quarto do bioma queimado em 2020. Já a Amazônia tem batido as maiores taxas desde 2006 e com tendência de ascensão. Números mais recentes de 2021, do relatório anual do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), registraram 13 mil km² de área desmatada.

Quais são as principais causas do desmatamento?
A principal delas é a expansão da agropecuária nos biomas brasileiros. Na Amazônia, a pecuária é o maior vetor do problema. Mas, nos últimos anos, cerca de um terço do desmatamento também ocorreu em florestas públicas não destinadas, um forte indicativo de grilagem (roubo de terras públicas). A expansão para o cultivo de soja também se dá a partir da conversão de ecossistemas naturais.

Quais podem ser as consequências climáticas dessa destruição?
O desmatamento causa a emissão de gases do efeito estufa, aumentando a concentração deles na atmosfera e elevando o aquecimento do planeta. Ou seja, a destruição da Amazônia e de outros biomas no Brasil, contribui com a intensificação e frequência de extremos climáticos, como inundações e crises hídricas. Isso acaba trazendo prejuízos para toda a sociedade, como acréscimo na conta de energia, no preço dos alimentos e risco de racionamento.

De que forma o Greenpeace contribui para mitigar o problema?
O Greenpeace tem trabalhado com ações que levam ao desmatamento zero por mais de uma década. Em 2015, entregamos ao Congresso um Projeto de Lei (PL) sugerindo que qualquer desmatamento seja ilegal. Além disso, o Greenpeace participa da Moratória da Soja, um compromisso assumido pelas principais traders após uma campanha conectando a expansão desse grão na Amazônia com a perda de florestas. Apesar de ter limitações, o acordo conseguiu diminuir drasticamente essas atividades.

O Greenpeace tem exposto uma série de dinâmicas relacionadas ao desmatamento. Recentemente, abordamos muito o tema da grilagem e pressionamos para que os PLs em discussão no Congresso não sejam aprovados. Isso porque afrouxariam os critérios da regularização fundiária e legalizariam a grilagem de terra, estimulando novas invasões e perda de um patrimônio de todos os brasileiros.

Os números do desmatamento só têm crescido. Por que a fiscalização não é eficaz?
Nos últimos anos, observamos uma paralisação completa do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm), além de queda expressiva no número de autuações ambientais, militarização do combate ao desmatamento, ao passo que os órgãos ambientais foram enfraquecidos. Com uma fiscalização nada eficaz, a sinalização que se passa é que o crime será tolerado. Sendo assim, grileiros, madeireiros e desmatadores avançam sobre a floresta.

Como você avalia a atuação do atual governo para conter o desmatamento?
Não há esperanças de que o governo atual reverterá a perda de florestas. Mas sim, é possível. No passado, a partir de uma série de ações e políticas públicas, o desmatamento caiu 80% entre 2004 e 2012. Isso significa que o Brasil já conhece o caminho, mas o que funcionou antes tem sido sistematicamente ignorado pelos governantes.

Quais medidas precisam ser tomadas para mudar essa realidade?
Seria necessário um projeto articulado de combate nos moldes do PPCDAm. Também a criação e implementação de áreas protegidas (Unidades de Conservação e Terras Indígenas), a fim de garantir a proteção de florestas públicas ainda não destinadas, além de acabar com a grilagem.

É preciso ainda o fortalecimento e liberação de recursos para o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), bem como a retomada do protagonismo desses órgãos no combate à destruição.

Por fim, a rejeição por parte do Congresso de propostas de alteração na legislação que enfraquecem a proteção ambiental e estimulam ainda mais o desmatamento, como é o caso do PL da grilagem, do licenciamento e das propostas que visam abrir terras indígenas para atividades predatórias.

É possível que outros países apliquem sanções ao Brasil por não preservar as florestas?
Não necessariamente sanções, mas restrições para a entrada de produtos que estejam ligados ao desmatamento estão sendo debatidas em legislações, como no âmbito da União Europeia, Reino Unido, Estados Unidos. Essas leis discutem mecanismos nos quais empresas que enviam commodities de risco para esses países devem provar que não existe relação com desmatamento. O mundo tem sinalizado que não tolera isso mais, e o Brasil tem plenas condições de atender esse chamado tão necessário para conter a crise do clima e a rápida perda de biodiversidade.