Apolítica brasileira é majoritariamente masculina. Uma prova disso é que, mesmo as mulheres constituindo 52,8% do eleitorado brasileiro, o índice de representatividade política feminina é pífio. No Congresso, por exemplo, apenas 15% dos parlamentares são mulheres. No Senado, o número desce para 14%.
Uma estimativa levando em consideração esse percentual traz uma assustadora conclusão: para chegar à equidade de gênero na Câmara dos Deputados e Senado, o Brasil precisará de 120 anos, segundo cálculo feito pelo UOL.
A fim de compreender essa realidade, o Edição do Brasil conversou com a advogada, mestra em direitos e garantias fundamentais e consultora de direitos e políticas públicas de mulheres, Renata Bravo. “Até 2015 o Senado não tinha banheiro feminino. A partir disso, é possível compreender que ali mulheres não eram bem- -vindas”, garante.
A representatividade feminina na Câmara é de 15% e no Senado 14%. A que você atribui esse cenário?
Muitos são os fatores que levam a esse cenário. Um deles é a falta de investimento e incentivo às candidaturas femininas. Quando elas acontecem, são laranjas, ou seja, utilizadas para desviar dinheiro do fundo eleitoral.
Outro motivo é que as mulheres foram impedidas de falar publicamente durante séculos. Tanto que, até 2015, o Senado não tinha banheiro feminino. A partir disso, é possível compreender que ali as mulheres não eram bem-vindas.
Em toda a história da política brasileira tivemos uma única presidenta mulher, que foi destituída do cargo no segundo mandato sob muitos ataques misóginos que, certamente, não aconteceriam se fosse um homem no lugar dela.
Dados do UOL apontam que o Brasil levaria 120 anos para alcançar a equidade de gênero na política. Por que tanto tempo?
As políticas públicas para garantir a equidade de gênero no Brasil são tímidas. Se a gente pensar que tem menos de 100 anos que as mulheres ganharam o direito de votar, vem à reflexão: quem decidia nosso futuro? Os homens.
Tudo é muito recente, como a lei de cotas de gênero, que garante que mais mulheres possam ingressar na política, mas que vive sob ameaça daqueles que não querem perder espaço. Além do que é necessário ser conquistado, nos últimos 5 anos estamos vivendo uma “ressaca” das ondas feministas, ou seja, estamos vendo grupos que não aceitam que as mulheres tenham seus direitos conquistados e querem cortar pela raiz o que já foi garantido.
Falta interesse nas próprias mulheres de se candidatar?
Isso não é algo que foi construído. Nossos interesses surgem a partir do que a gente vive na nossa família, escola, faculdade, grupo de amigos e no trabalho. Historicamente não foi garantido às mulheres o espaço público-político, sendo destinado a elas o espaço doméstico-privado.
Ainda hoje, vemos nas paredes das galerias dos prédios públicos (Tribunais de Justiça, Assembleias Legislativas, Câmaras de Vereadores) apenas fotos de homens ocupando os espaços de lideranças e de decisão. Não é deliberado que elas não tenham tanto interesse em se candidatar, mas a estrutura montada para gente é mais difícil e foi construída para que não pensássemos que o espaço também é nosso.
O que precisaria ser feito para aumentar a participação feminina na política?
As mulheres participam da política, afinal, fazemos isso quando temos que garantir o acesso à saúde de nossos filhos, quando estamos nas associações de comunidades, quando nos unimos para reivindicar melhorias para as comunidades. Isso é política. O que precisamos é de maior participação na política institucional e é aqui o grande problema que enfrentamos e onde precisamos avançar.
É importante buscar maneiras de garantir que exista um espaço de disputa e condições para que mulheres concorram de igual para igual. As siglas precisam investir nessas candidaturas porque uma campanha precisa de recursos, materiais, divulgação e pessoal.
Outro caminho é o das instituições, que devem garantir que as mulheres que consigam alcançar a política institucional sejam apoiadas e não se sintam desestimuladas a continuar.
Qual a importância da participação das mulheres na política?
Existe um estudo recente de pesquisadores da Fundação Getulio Vargas e do Insper que mostra que a participação de mulheres na política tem o poder de influenciar adolescentes a se interessarem mais pelo tema. Isso mostra que quando a gente altera a fotografia do que acostumamos a ver – homens brancos, mais velhos, ricos, heterossexuais – outros atores sociais passam a ter mais interesse em se informar, participar e se engajar. Além disso, a representatividade é importante.
Existem também estudos que mostram que nos lugares onde há mais participação de mulheres na política institucional, os níveis de corrupção são menores. Quando elas estão nos espaços de decisão, todo mundo sai ganhando e a construção da sociedade é mais justa, mais representativa e igualitária.