O período das convenções partidárias começa no final de agosto e os candidatos que almejam disputar a prefeitura devem ficar atentos aos desafios que estão no caminho. Isso porque além das dificuldades usuais, a crise sanitária sem precedentes arrasou as finanças municipais. Sendo assim, os futuros chefes do Executivo terão que lidar e resolver os problemas urgentes nos próximos 4 anos de mandato para conseguirem a recuperação econômica e desenvolvimento da cidade. Sobre esse tema, o Edição do Brasil conversou com o especialista em gestão pública Gustavo Mattar.
Quais são os impactos financeiros da pandemia para as prefeituras?
Existem dois grandes problemas: o primeiro é com relação a queda vertiginosa das receitas. Pessoas desempregadas, redução de renda e empresas que fecharam as portas. Tudo isso impacta na arrecadação própria do município que é baseada no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). É uma diminuição que não estava prevista no orçamento.
O segundo é o aumento dos gastos que não estavam planejados. As prefeituras precisam investir mais na área da saúde para controle e combate a pandemia. É melhoria em estrutura, compra de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), insumos e profissionais. Tudo isso vai acabar resultando em um déficit nas contas públicas este ano, ou seja, as despesas estão sendo maiores que os recebimentos.
Ainda sobre o problema monetário, este ano é o último de gestão e também de entrega. Normalmente é quando os prefeitos inauguram obras, visando demonstrar os melhores feitos da administração já de olho na campanha eleitoral. Porém, todos foram pegos de surpresa pela crise sanitária, sendo que alguns já tinham todos os recursos para finalizar as ações, enquanto outros ainda não. Poderemos ter um quadro de grande contingente de obras inacabadas.
Municípios menores sofrem mais que as grandes cidades?
Em questão financeira, sem dúvida. Como já ocorre antes mesmo do coronavírus, as cidades pequenas não têm uma boa receita própria e possuem uma fragilidade e dependência do estado e da União. Em um cenário desses, no qual todos estão em situação crítica, acaba que os recursos repassados também são menores.
Os futuros prefeitos vão enfrentar um desafio ainda maior?
A gente não sabe ainda ao certo quando serão as eleições, embora estejam marcadas para novembro. Tudo depende do quadro de evolução da pandemia, mas existe uma dificuldade em cumprir o calendário eleitoral. Resolvido este problema, acredito que os principais desafios serão como combater o vírus, já que ainda não possui uma vacina eficaz, e a recuperação econômica. Os prefeitos vão pegar o comando de uma terra arrasada e os próximos 4 anos de governo serão para reconstrução.
Eles sofrem muita pressão do empresariado devido às medidas restritivas de isolamento e fechamento do comércio. Os futuros chefes do Executivo terão que trabalhar esses dois lados com equilíbrio e estar atentos ao que outros municípios, estados ou países estão fazendo para que ele também possa aplicar na sua cidade. Sobretudo, tem que estar pautado pela ciência para auxiliar na tomada de decisões.
As prefeituras terão que enxugar os gastos em 2021?
Não necessariamente, mas o dinheiro terá que ser bem controlado. Não se pode conter muito as despesas agora, pois é um momento em que a população está precisando mais. Tudo terá que ser reavaliado e adequado de acordo com a situação. No entanto, os investimentos são importantes, principalmente para o desenvolvimento das cidades.
As despesas na saúde impactam no investimento em outros setores?
Esse é um problema, pois todos os olhares estão voltados para a saúde e as outras áreas que também são deficitárias ficam sem atenção. Pelo atual momento, outras pastas acabam sendo um pouco ignoradas como cultura, turismo, esporte e lazer e transporte. A Constituição obriga os municípios a desembolsarem pelo menos 15% de suas receitas com saúde e 25% com educação. Essas são as duas grandes áreas que mais gastam.
Como fica a questão do ensino público?
Em março, desde que foi declarada a pandemia no Brasil, todas as aulas foram suspensas e sem previsão de retorno. Muitas escolas estão tentando manter educação a distância, apesar das dificuldades de equipamentos e acesso à internet dos estudantes. Infelizmente, alguns especialistas da área dizem que esse dano causado não será resolvido com a simples reposição das aulas. Ainda vai demorar um tempo para recuperar essa perda de conhecimento.
Em São Paulo, por exemplo, estão sendo elaboradas diretrizes para oferecer um quarto ano opcional para alunos do ensino médio da rede pública em 2021. Os estudantes de outras séries terão que reaver os prejuízos no decorrer dos próximos anos letivos. Por fim, a educação tende a se adequar e transformar em um modelo híbrido, promovendo uma mistura entre o ensino presencial e on-line. Cada cidade vai tratar a questão de uma maneira.
Como o governo federal pode ajudar os municípios?
Existe o auxílio emergencial de R$ 600 destinado diretamente à população que necessita, assim como crédito para empresas. Também temos os repasses estaduais e federais que já são programados. Outra situação que auxilia muito são flexibilizações e suspensões em relação à responsabilidade fiscal. Têm vários estados que precisaram parar de pagar suas dívidas com a União de forma que desse um fôlego nas finanças. A mesma situação também pode acontecer nos municípios. Apesar do cenário bastante crítico, pelo que tenho visto, as prefeituras estão bem controladas no quesito obtenção de empréstimos.
Tem acontecido uma desarticulação entre as esferas federal, estadual e municipal no sentido de ter um conflito entre presidente, governadores e prefeitos nas medidas de combate à pandemia, o que atrapalha muito a situação. Além disso, estamos em ano eleitoral e o clima deixa os políticos mais aflorados. Esse também pode ser um desafio dos futuros prefeitos de construir bons relacionamentos com o governo do estado e federal na busca de recursos para seu município.
Existe alguma estimativa de quanto tempo pode levar para resolver os problemas?
Na gestão pública, trabalhamos com ciclos de 4 anos. Mas existem alguns estudos mostrando que talvez possamos demorar até uma década para voltarmos ao que era antes. A próxima gestão será para minimizar os impactos, resolver os problemas mais agudos e começar a estimular a economia. Serão 4 anos difíceis de déficit e dificuldades de pagamentos e arrecadação. Somente depois disso, teremos um período de recuperação, crescimento e desenvolvimento. Essa é uma previsão otimista, pois já ouvi outros especialistas afirmando que poderá levar ainda mais tempo.
A escolha de um bom gestor é importante?
A população precisa estar atenta aos acontecimentos de seu município, analisar o trabalho feito nos últimos 4 anos para poder escolher um bom representante em 2020. Os políticos que vão comandar as prefeituras no ano seguinte vão enfrentar um grande desafio e precisam estar bem preparados. Por isso a importância de eleger um profissional capacitado para não cair no amadorismo.