A lista escândalos que envolvem o setor de alimentos no Brasil e no mundo tem aumentado. Soda cáustica no leite, rato no refrigerante, carne na batata frita, resíduos no extrato de tomate ou no salgadinho etc. Para se ter uma ideia, em uma breve pesquisa nas redes sociais, quando perguntamos se alguém se lembrava de casos semelhantes do segmento, vários vieram à tona. A recente Operação Carne Fraca – em que várias empresas foram acusadas de vender produtos adulterados –, revelou os problemas que as empresas brasileiras enfrentam em relação a falta de ética empresarial que, por sua vez, influenciam negativamente na economia do país.
O professor de ética nos negócios da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), Roberto Patrus, avalia que as empresas não estão preparadas para lidar com situações desse porte. A ética é essencial em todas as profissões, mas, por muitas vezes, não é preciso pesquisar muito para perceber que o lucro tem ultrapassado essa premissa.
Patrus diz que os princípios morais são feridos diariamente nos mais variados tipos de negócios, desde uma entrega não realizada até informações irreais. “Acredito que é do costume brasileiro não ter um rigor aos regulamentos. A nossa cultura é do improviso e do jeitinho e, também, é flexível – que tem o lado bom, mas tem o lado de não seguir os parâmetros. Em geral, isso ocorre quando a empresa não tem uma cultura forte e nem uniformidade de atuação, como falhas de comunicação”, conclui.
Em produção
Após a repercussão da Operação Carne Fraca, a Anvisa, em nota, pontuou que o controle e fiscalização de alimentos no Brasil é uma responsabilidade compartilhada entre órgãos e entidades da Administração Pública, com destaque as pastas da agricultura, da pecuária e do Sistema Único de Saúde, com responsabilidades e atribuições distintas. Ou seja, antes de um produto ser liberado para consumo, é necessário uma série de licenças, autorizações e selos de inspeção.
A professora de engenharia de alimentos e nutrição Tânia Silveira explica que, dependendo do âmbito da atuação da indústria, é preciso ter selos de inspeção e regulamentação. “Depois de todo esse processo, os produtos devem ser processados com base nas boas práticas de fabricação e higiene para que chegue ao consumidor de forma adequada e sem riscos à saúde”.
Tânia afirma que as empresas do setor têm tomado mais cuidado em cumprir os preceitos de boas práticas. “Pela quantidade de empresas podemos dizer que são poucas as fraudes. Dependendo do ramo, a fiscalização é intensa e diária. Para realizar esse trabalho, existem mais de 11 mil fiscais federais”.
Segundo ela, quando ocorrem escândalos no setor, eles conseguem apurar de forma rápida, mas, muitas vezes, a divulgação não ocorre com a mesma velocidade. “Atuei muitos anos no setor de laticínio, a fiscalização era diária. O leite chegava e tinha fiscais do Ministério da Agricultura para inspecionar o produto”.
A professora diz ainda que, há alguns anos, teve o caso do leite adulterado com formol e que, recentemente, saiu a sentença. “Pessoas foram processadas, autuadas e fiscais foram afastados. Além disso, houve também multas aplicadas para a empresa”. Para ela, esse desfecho é importante para que a sociedade tenha um feedback, pois existem ocorrências que são falsas ou interpretadas de forma incorreta.
Tânia acrescenta que: “Esse caso da carne, por exemplo, tem muitas questões mal interpretadas. É preciso falar sobre a adição de substâncias nos produtos – na carne fresca embalada não é permitido nenhum aditivo, mas em produtos derivados sim. Não podemos generalizar. É preciso verificar se a empresa está adicionando a quantidade permitida pela legislação brasileira, pois se estiver utilizando de maneira inadequada, configura fraude”.
[table “” not found /]
Imagem em ação
Diante de crises empresariais, a imagem da marca é colocada em xeque, em alguns casos é impossível reverter a situação. O professor de marketing Guilherme Guerra explica que as marcas são como pessoas e têm um histórico. Segundo ele, matematicamente, não existe uma fórmula para recolocação da empresa, pois depende do grau do problema.
“No caso da Operação Carne Fraca, sobre a BRF e a JBS, não foi nada provado – podemos dizer que foi algo pequeno, pois suas marcas são antigas e conceituadas. Acredito que não haverá nenhum resquício para elas. Mas, em casos mais graves, como o da British Petroleum, no golfo do México – explosão e vazamento de petróleo –, demanda mais dinheiro e esforço para reverter o quadro. As marcas precisam se posicionar mostrando que o que aconteceu foi um erro e que ele não se repetirá – sob o risco, inclusive, de fechar as portas”.
Guerra destaca ainda que o gerenciamento de crise é essencial e que as empresas deveriam ter essa questão no seu DNA, antes dela acontecer. “Quais são as ações que a empresa tem feito para inibir esse tipo de situação? O caso da Carne Fraca, por exemplo, foi mais um de corrupção do que um processo que está errado. As empresas precisam ter um comitê de ética, uma governança coorporativa para impedir que isso ocorra novamente”.
Para ele, pior que o escândalos coorporativos é a visão que o público tem do país. “A marca Brasil está perdendo muito mais no mercado internacional do que as marcas especificas. Lá fora temos a imagem de um país desorganizado e corrupto, com isso, os concorrentes aproveitam para pegar um mercado que era nosso. O país terá que investir muito para reverter a imagem da marca Brasil”, conclui.
[table “” not found /]