É incrível como, em poucos dias de mandato, o novo presidente norte-americano, Donald Trump, conseguiu trazer tanta confusão às relações diplomáticas e comerciais (além das étnicas) no mundo inteiro – e isso sem contar as reações extremadas, dentro de seu próprio país, contra ou a favor das intervenções já adotadas ou anunciadas. Defensor de uma política externa isolacionista, ele não apenas decidiu realmente construir um muro separando os Estados Unidos do México – algo que parecia ser não mais que conversa fiada de campanha –, como também abandonou o Acordo Transpacífico, TPSEP, cuja criação acaba de completar seu primeiro ano.
Esta decisão, especificamente, causou perplexidade não só entre os seus países membros como também naqueles que compõem outros blocos econômicos. São esperadas outras decisões, como a provável imposição de barreiras econômicas ao México (além do muro) e uma possível retaliação comercial contra a China, país historicamente visto pelos americanos como protecionista. Em suma, a nova política externa americana vai afetar significativamente as direções de tráfego nos negócios internacionais.
E o Brasil, como fica nesse novo desenho? Apesar de essas tantas incertezas delinearem um cenário mais complicado para todos os países, há uma perspectiva – racional, diga-se – de que o vácuo deixado no comércio mundial pela nova política externa americana abra espaços importantes para países como o Brasil. Pode acontecer, por exemplo, uma maior aproximação econômica e diplomática com uma China mais disposta a fazer negócios e a ampliar seus investimentos no país, e com os países-membros da Aliança do Pacífico, especialmente aqueles de menor expressão econômica, que, de repente, ficaram ao relento.
Para que o Brasil possa se inserir nesse novo contexto mundial será fundamental que nossa política comercial seja revista e atualizada, de modo a habilitar-se a participar das novas correntes multilaterais que precisarão surgir. O cenário atual tem sido percebido pelo governo brasileiro não como uma ameaça, mas como uma oportunidade que, se devidamente aproveitada, poderá ajudar, e muito, na recuperação da combalida economia brasileira. O próprio ministro de Indústria e Comércio, Marcos Pereira, em recentes declarações, mostrou ter esta percepção. Segundo ele, as medidas protecionistas de Trump podem ser favoráveis ao Brasil, na medida em que as mudanças de rumo do governo americano deixaram insatisfeitos muitos países, que precisarão criar novos alinhamentos. Pereira acredita que o Mercosul, desde a saída da Venezuela do bloco, passou a ser visto de forma diferente pela União Europeia, que inclusive tem mostrado mais disposição para negociar. É de se considerar, também, uma consequência colateral – e positiva – para o governo brasileiro: participar deste novo desenho do comércio global exigirá do país um atestado de saúde financeira, fiscal e econômica de que hoje não dispõe. Um argumento e tanto para justificar e acelerar a aprovação das que reformas propostas por Michel Temer, tanto as que já tramitam no Congresso quanto as que precisarão vir depois.
Todos os aspectos considerados nestes cenários são efetivamente positivos. E o são, simplesmente, pelo fato de Donald Trump não ter sequer cogitado adotar medidas restritivas contra os países da América do Sul. Mas como não se sabe o que lhe passa pela cabeça, e de repente ele resolver implicar conosco, tudo muda e a oportunidade vira ameaça. Que Deus nos livre!