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37,5% das brasileiras sofreram alguma agressão no último ano

Foto: Freepik.com

 

De acordo com pesquisa do Datafolha encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mais de 21 milhões de brasileiras, 37,5% do total de mulheres, sofreram algum tipo de agressão nos últimos 12 meses. O relatório também mostra que 5,3 milhões de mulheres, 10,7% do total da população feminina do país, relataram ter sofrido abuso sexual e/ou foi forçada a manter relação sexual contra a própria vontade nos últimos 12 meses, ou seja, uma em cada 10.

A ampla maioria das agressões ocorreu na presença de terceiros, 91,8%. Em 47,3% desses casos, quem presenciou foram amigos ou conhecidos; em 27%, os filhos; e em 12,4%, outros parentes. Para discutir a gravidade do assunto, o Edição do Brasil conversou com Alice Bianchini (foto), conselheira do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM) e vice-presidenta da Associação Brasileira de Mulheres de Carreiras Jurídicas (ABMCJ).

 

Sobre a realidade da violência contra a mulher, existe uma tendência de crescimento ou o número de casos se mantém estável?

Quando se trata de medir a violência em um país, há uma convenção mundial no sentido de se analisar o número de mortes registradas no sistema de saúde. No caso, estamos falando de mortes de mulheres. Então, não se trata da mulher denunciar mais, ou menos, mas de cadáveres femininos contabilizados ano a ano. E o que se vê nessa estatística é, sim, um aumento dos casos de feminicídio a cada ano que passa.

 

Como a violência contra a mulher se manifesta nas diferentes faixas etárias, etnias e classes sociais?

Os estudos mostram que as mulheres negras são as mais vitimadas. Outro dado que chama a atenção é a quantidade de mortes de mulheres nas regiões brasileiras com maior concentração de comunidades indígenas. O que se pode analisar é que nos locais em que há menos equipamentos de proteção à mulher (delegacias especializadas, CREAS, defensoria pública, entre outros), os índices de violência são mais expressivos, o que nos faz concluir que o investimento em políticas públicas para mulheres é fundamental para alterar essa situação.

 

Você acredita que as leis existentes, como a Lei Maria da Penha, têm sido eficazes na proteção das mulheres ou há lacunas no seu cumprimento e aplicação?

Nos últimos anos, principalmente a partir de 2021, houve uma profusão de leis que tratam da condição feminina no Brasil. Em levantamento que fiz recentemente e que se encontra publicado no site da ABMCJ, podemos encontrar mais de 50 leis editadas entre 2021 até o ano de 2024. Elaborar leis é importante, mas também é preciso fiscalizar para que ela se torne uma realidade. Por exemplo, a lei que determina que as delegacias especializadas na defesa da mulher funcionem todos os dias da semana, por 24 horas. O número de delegacias é muito baixo no Brasil e praticamente nenhuma delas funciona de acordo com o previsto na lei.

 

Como melhorar a abordagem de apoio às mulheres que sofrem agressões, desde a denúncia até o acompanhamento psicológico e social?

Precisamos atuar na prevenção da violência, por meio de projetos que atuem na forma de pensar na sociedade. Há, infelizmente, uma enorme tolerância em relação ao abuso contra a mulher, fazendo com que ainda seja persistente a ideia de que “em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”. A pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública aponta que 92% das violências foram testemunhadas por alguém, e essa pessoa normalmente nada fez em relação à ocorrência que presenciou. E o que é grave, quase 30% foram testemunhadas pelos filhos, o que vai causar danos psicológicos muito graves, o que pode comprometer as futuras gerações.

 

O que pode ser feito para combater o ciclo de violência, considerando que muitos casos não são denunciados?

A pesquisa mostra que quase metade das mulheres vítimas de violência não fez nada em relação à última agressão sofrida. Na mesma sondagem são identificados os motivos que levaram à inação da vítima, um deles é o medo de vingança do agressor. Nesse ponto, uma política pública é o encaminhamento do agressor para grupos de reflexão, conforme determina a Lei Maria da Penha. O impacto desses programas na vida do homem que cometeu a violência é muito positivo, levando uma pequena parcela (cerca de 4%) voltar a praticar a violência. No entanto, temos apenas cerca de 400 grupos espalhados pelo país e o orçamento para políticas voltadas à mulher vem diminuindo desde o ano de 2015.