Segundo relatório lançado pelo Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância (Unicef), 1,6 milhão de crianças não receberam nenhuma dose da vacina DTP, que previne contra difteria, tétano e coqueluche, entre 2019 e 2021, no Brasil. Globalmente, esse número chega a 48 milhões.
Nesse período, 1,6 milhão de crianças não tomaram nem a primeira dose (DTP1), e outras 700 mil tomaram a primeira e/ou a segunda dose, mas não tomaram a terceira (DTP3). Isso leva a um total de 2,4 milhões de crianças não imunizadas. Os dados são semelhantes contra a pólio, que também conta com três vacinas, 1,6 milhão de crianças não receberam nem a primeira dose (VIP1), entre 2019 e 2021.
De acordo com a Unicef, para uma criança ser considerada imunizada, ela precisa tomar todas as doses recomendadas de cada vacina, inclusive as de reforço, quando indicadas. O relatório global usa como base a tríplice bacteriana (DTP), que conta com três vacinas. No Brasil, a DTP é oferecida como “pentavalente”, protegendo também contra hepatite B e contra haemophilus influenzae tipo b.
Segundo o relatório, a pandemia exacerbou as desigualdades existentes. As que não estão sendo vacinadas vivem nas comunidades mais pobres, remotas e vulneráveis. Nesses domicílios, uma em cada cinco crianças não recebeu nenhuma dose, enquanto nos mais ricos, apenas uma em 20. O estudo identificou ainda que crianças não vacinadas vivem frequentemente em comunidades de difícil acesso, tais como zonas rurais ou favelas urbanas.
Youssouf Abdel-Jelil, representante do Unicef no Brasil, aponta que esses indivíduos foram deixados para trás, ficando desprotegidos de doenças sérias e evitáveis. “As crianças nascidas pouco antes ou durante a pandemia agora estão ultrapassando a idade em que normalmente seriam vacinadas, ressaltando a necessidade de uma ação urgente para alcançar aquelas que perderam as vacinas e prevenir surtos e a volta de doenças já erradicadas no Brasil, como a pólio”.
Importância da vacinação
A médica infectologista, Raquel Bandeira, destaca que na primeira infância é onde acontece a maioria dos óbitos causados pelas doenças infecciosas. “Por ser o primeiro contato da criança com ambiente externo, com novos vírus e bactérias, acaba sendo mais suscetível a uma enfermidade. Por isso, a vacinação infantil é tão importante, porque vai ser o primeiro contato com uma patologia e se ela desenvolver, tem grande chance de ter a forma mais grave e com maior risco de morte”.
Ela pontua também que esse desinteresse pela vacinação foi por vários motivos associados. “Primeiro, o enfraquecimento da estratégia de saúde da família nos últimos anos. A gente teve também alteração no Bolsa Família, que para receber o benefício teria que ter o cartão de vacina completo e isso não acontecia mais, e o motivo principal, as fake news propagadas na internet. São vacinas, que inclusive, são extremamente antigas, seguras, que todo mundo já tomou, com baixo efeito adverso”.
A médica complementa que, além das fake news, também não há um incentivo para as crianças tomarem o reforço. “Os pais têm que entender que se existe outras doses da vacina é porque a imunidade completa ainda não foi atingida, sendo fundamental a dose de reforço para ter essa garantia. O impacto da não vacinação é a reintrodução de doenças que antes estavam controladas ou mesmo extintas”.
O advogado Douglas Damasceno tem uma filha de um ano. “Ela ainda não vacinou com a DTP, pois ainda não completou 15 meses de vida. Mas já tomou as três doses da pentavalente, que possui a DTP em sua composição. A vacina é crucial para o desenvolvimento saudável e na prevenção de doenças, que hoje, graças à tecnologia, podem ser evitadas”.