De acordo com especialista, cerca de 60% dos pais não tem ideia do que seus filhos estão acessando (Foto: divulgação)
Tablets, celulares e computadores tomaram o lugar de brincadeiras como pique-cola, esconde-esconde, corre cotia, rouba bandeira etc. Hoje, estima-se que cerca de 80% das crianças e adolescentes usam a internet com frequência. Mas, o uso excessivo desses aparelhos pode ser prejudicial, tanto para o desenvolvimento, quanto para o comportamento desses indivíduos. Pensando nisso, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), divulgou, na semana passada, um manual sobre os impactos que a tecnologia e o mundo digital pode causar na saúde da criança.[J1]
De acordo com o documento, o uso excessivo de tecnologia pode estar ligado a ansiedade, mal cada vez mais frequente nessa faixa-etária. Além disso, a prática pode estimular sexualização precoce, cyberbullying, comportamento violento, transtorno de sono, má alimentação, baixo rendimento escolar, lesões por esforço repetitivo, dificuldades em criar relações sociais e exposição precoce à inúmeros assuntos, dentre outros.
Para o membro da Sociedade Mineira de Pediatria (SMP), Marco Antônio Gama, esse hábito é maléfico, pois a infância é a fase de desenvolvimento cerebral. “Muitos pais acham que a criança é esperta por saber mexer no aparelho, mas, na verdade, se trata de um adestramento digital. Ela precisa do tempo dela para descobrir as coisas por si. Ou seja, precisa pegar um brinquedo, morder, cheirar, jogar, para entender o que se passa a seu redor”.
A oftalmologista Luciana Carvalho aponta o uso como sendo nocivo também para a visão da criança. “Quando estão na frente dos aparelhos a criança pisca menos do que é necessário e isso provoca um ressecamento da superfície ocular, uma vez que a lágrima tem um mecanismo de proteção e renovação das células dessa superfície”.
Ela acrescenta que as consequências disso, no fim do dia, são: desgaste na visão, olhos vermelhos, coceira, além de maior frequência de alergia e infecções no olho. “A radiação da luz azul, presente nesses aparelhos, têm efeitos prejudiciais para a retina. Contudo, como essas tecnologias começaram a ser usadas há 10 a 15 anos, ainda não se sabe a real potencialidade desses danos em longo prazo”.
Tempo ideal
Gama aponta qual é o período indicado para cada idade utilizar eletrônicos e explica que ele deve ser de acordo com as regras estabelecidas pelos pais. “Abaixo dos 2 anos, a criança não deve usar. De 3 a 5 anos, é permitido até 1 hora por dia. Acima dos 5, pode-se aceitar até 2 horas. Mas tudo com condições como, por exemplo, boas notas e rendimento escolar, horários para tomar banho, se alimentar etc”.
O membro da SMP informa que há uma dificuldade dos pais em seguir essa disciplina. “Eles deixam a situação chegar ao extremo para então por limites ao uso. Isso só acontece quando o filho tira nota vermelha na escola ou faz alguma outra coisa errada. Na verdade, eles devem compensar a criança de acordo com o dia a dia”.
A psicóloga Natália Faria destaca que a criança aprende o que vivencia e que, assim, esse comportamento de ficar horas na frente do aparelho, certamente, foi ensinado pelos responsáveis. “A primeira atitude a ser modificada é a deles, pois não adianta proibir uso do aparelho dos filhos se eles próprios não conseguem ficar sem”.
Atento ao que foi dito pela psicóloga sobre os pais serem exemplos, um grupo de mães se reúnem às quartas e domingos para jogar queimada com seus filhos. “Hoje, as crianças não sabem como era divertido brincar com os amigos na rua e sem riscos. Então, tentamos trazer isso de volta e mostrar a eles o que é diversão de verdade”, comenta uma das integrantes do grupo, a cabeleireira Fabiana Gonçalves.
Ela tem dois filhos, um de 2 e outra de 8 anos e conta que os dois gostam de brincar com os aparelhos. “A mais velha gosta de assistir séries em um aplicativo e o menor desenhos. Mas, eu tento controlar e fazer com que eles optem por outros brinquedos para variar um pouco”, comenta.
Fora de controle
Uma outra questão é a de que o uso abusivo desses aparelhos abre portas que, às vezes, os pais não controlam. Gama conta que cerca de 60% dos pais não tem ideia do que os filhos estão acessando. “É preciso estar informado e participar no mundo digital para que se entenda o que as crianças estão usando. E isso tem que ser feito no âmbito familiar”.
Ele ainda acrescenta: “A internet não é um local de privacidade. Um exemplo disso são as redes sociais, proibidas até os 13 anos. Os pais respondem judicialmente por qualquer coisa que eles cometam online. Além disso, existem pessoas que podem ser pedófilos ou criminosos e colocam nome e idade diferente para pegar dados da família por meio das crianças”.