Segundo um relatório divulgado pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), o Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico) registrou 236.400 pessoas (1 em cada mil) vivendo em situação de rua, em 2022. O diagnóstico aponta que, desse total, 62% estão na região Sudeste, sendo o Distrito Federal a unidade federativa com maior percentual. O perfil dessa população é majoritariamente composto por homens (87%), adultos (55%) e negros (68%).
Para entender mais sobre o assunto, o Edição do Brasil conversou com a antropóloga e professora do programa de pós-graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), Regina Medeiros.
Quais as razões para o elevado índice de pessoas em situação de rua?
O número de pessoas nas ruas das cidades não é um fenômeno específico do Brasil e nem da sociedade atual. Isso pode ser observado em maior ou menor grau nos países considerados de primeiro mundo, como na Europa, Estados Unidos e outros. Os motivos que levam as pessoas a viverem nas ruas são multifatoriais, com ênfase nas crises provocadas por questões políticas e econômicas.
O estudo apontou que em relação às violações de direitos humanos, os homens negros e jovens são às principais vítimas. Por que esse grupo é o mais atingido?
A violação aos direitos humanos é decorrente de problemas estruturais provocados pela desigualdade social, de raça, cor, gênero, sexo, entre outros. Com base nesses parâmetros é instaurada uma seletividade social, definindo quem deve morrer ou ser violentado e quem deve viver e ser protegido. Assistimos no Brasil e em outros países do mundo, pessoas pobres, negras, jovens e que vivem nas periferias sendo presas, violentadas e mortas. Enquanto que, pelos mesmos atos, as de classe média alta, brancas, que residem nas regiões ricas estão sendo protegidas.
A proteção à população em situação de rua foi estabelecida como prioridade para os planos de ação do Sistema Único de Assistência Social (Suas). Você acredita que somente essa medida vai conseguir resolver o problema?
De forma nenhuma. As medidas, planos e programas políticos são importantes, contudo, não garantem absolutamente nada, principalmente para a população que vive na rua, considerada por esses mesmos órgãos como invisível, desnecessária, perigosa e não produtiva. Esse fenômeno só pode ter resultados benéficos, se as pessoas que vivem nessa situação participarem do processo e forem pensadas como cidadãos de direito.
Essa ação pretende envolver não somente o Executivo, mas também o Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e organizações da sociedade civil. Qual é a relevância do ato?
A importância de conjugar o Executivo, Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e organizações da sociedade civil é reunir esforços para a elaboração de políticas públicas. Porém, é necessário que elas sejam implementadas integralmente, que recebam recursos suficientes e que tenham a participação popular para garantir que, de fato, atendam às necessidades básicas de seres humanos que estão em situação de pobreza e miséria.
Quais medidas o poder público poderia tomar para sanar a questão?
Seriam políticas públicas qualificadas e contínuas direcionadas a atender essa população, como formação de mão de obra, inserção no mercado de trabalho, moradia, acesso à escola, serviços de saúde e de proteção social.
Você acredita que o número deve aumentar ou diminuir nos próximos anos?
Essa situação tende a piorar, como foi constatado nas pesquisas realizadas. Houve um aumento de aproximadamente 31% de 2021 para 2022, período pós-isolamento por razão da COVID-19. E isso se deve ao desemprego, trabalhos com baixa remuneração e informais, falta de condições de custear moradia, recessão, processo de imigração e sofrimento social.