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Lei de Cotas para ensino federal é reformulada

Além de aprimorar a política, texto altera critérios socioeconômicos – Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

No final de outubro, o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei (PL) que reformula e amplia o sistema de cotas no ensino federal. O PL 5.384/2020 prevê que, entre outras mudanças, os candidatos cotistas passarão a concorrer também nas vagas gerais, e apenas se não conseguirem nota para ingresso, concorrerão às vagas reservadas. A revisão do texto ocorre 11 anos após a sanção da chamada primeira Lei de Cotas.

Além de aprimorar a política para ingresso nos estabelecimentos federais de ensino superior ou de ensino médio técnico, o texto altera critérios socioeconômicos e insere os quilombolas entre os beneficiados. Atualmente, metade das vagas para estudantes oriundos de escola pública é assegurada às famílias que ganham até 1,5 salário mínimo por pessoa. Pela proposta aprovada, a renda máxima será de um salário mínimo.

A professora de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenadora docente do Grupo Enegrecer de inclusão racial na pós-graduação, Daniela Muradas Antunes, conversou com o Edição do Brasil para esclarecer mais detalhes sobre o tema.

Como funciona a lei de cotas?
A lei reserva 50% das vagas nas instituições de ensino federal e institutos federais de educação para estudantes de baixa renda egressos do ensino público, considerando o critério racial (pretos, pardos e indígenas).

Qual é a importância dessa norma para o Brasil?
Trata-se de uma relevante política de inclusão social e étnica, colaborando para a redução das desigualdades iniciais de acesso ao ensino público de qualidade e que visa reduzir as diferenças no mercado de trabalho em um país de notáveis contrastes nessa área e também na renda, em perspectiva étnico-racial.

Com a atualização do Senado, quais foram as principais mudanças?
A nova legislação possui revisões importantes. Por exemplo, traz a política de uma norma explícita acerca de sua aplicação em programas de pós-graduação e permite ao cotista também ser pontuado para o acesso às vagas de ampla concorrência.

Mesmo com essa reformulação, em sua opinião, a legislação ainda precisa de mais avanços?
Sim, a melhoria de inclusão racial em pós-graduação depende de uma política mais abrangente de incentivo desde a graduação de pesquisa e outras ações universitárias, e adaptação de programas e projetos às realidades e necessidades dos cotistas. Especialmente com respeito à assistência estudantil, o acesso a bolsas e incentivos específicos para formação em línguas estrangeiras e bens culturais e outros aspectos que podem reequilibrar as oportunidades acadêmicas.

Quando a lei foi promulgada, em 2012, muito se dizia que iria ter uma queda na qualidade de ensino das universidades. Isso realmente aconteceu?
A implementação de cotas nunca afetou a qualidade do ensino superior. Em termos de médias globais não foram registradas grandes discrepâncias entre cotistas e estudantes de ampla concorrência na UFMG, por exemplo. Muito porque, a despeito de uma maior qualidade do ensino médio privado, ainda existe um fosso entre os ensinos médio e universitário. Outros fatores comportamentais atuam também para um maior engajamento e podem explicar essa relativa paridade de resultados. Além disso, a inclusão racial e étnica exigiu das instituições a ampliação de seus debates, de perspectivas de estudos considerando o entendimento étnico-racial, que nos mostram que a política colaborou para o aprimoramento em seus pilares de pluralismo de pensamento e interação com os problemas sociais.

Podemos dizer que essa lei ajudou a solucionar alguns problemas raciais do país?
Sim, a política permitiu efetivamente o ingresso ao ensino superior e tecnológico de parte da população excluída desse acesso e colabora para uma redução das desigualdades no mercado de trabalho.