O levantamento Covitel, realizado pela Vital Strategies, organização global de saúde pública, e pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), mostra que a incidência do diagnóstico de depressão cresceu 40% no Brasil entre o período pré-pandemia e o primeiro trimestre de 2022. A pesquisa ouviu 9.004 pessoas de todas as regiões do país com idade entre 18 anos e 65 ou mais – cerca de 58% dos entrevistados eram mulheres. Segundo a publicação, o percentual de brasileiros que relataram ter a doença saltou de 9,6% em 2019 para 13,5% no começo deste ano.
O levantamento destacou que, no período pré-pandemia, a depressão era mais frequente no grupo com idade igual ou maior que 65 anos. Esse cenário sofreu uma mudança significativa no primeiro semestre deste ano, quando foi observada prevalência semelhante no número de diagnósticos em quase todas as faixas etárias. Entre as pessoas brancas, 16,5% foram diagnosticadas com o transtorno, índice que era de 11% antes da crise sanitária. Já na população negra, o percentual passou de 8,8% para 11,8%.
A psiquiatra Andréa Ladislau explica que a depressão é uma doença que gera sintomas psíquicos e físicos que alteram o humor e a rotina, como tristeza, pensamentos negativos, desinteresse pela vida, dificuldade de concentração, alteração do apetite e do sono, perda ou ganho de peso, sentimento de culpa, fracasso, entre outros.
“A depressão pode ser classificada por meio de episódios de intensidade leve, moderado ou intenso. As causas são diversas, podendo estar relacionada a fatores internos (que dizem respeito ao próprio indivíduo) ou externos (fogem do controle da pessoa na maior parte dos casos). Entre elas, podem estar experiências negativas do passado; pressões da vida contemporânea e fatos marcantes; fatores fisiológicos, como alterações hormonais e genéticas por meio do desequilíbrio nos níveis de neurotransmissores; bullying; perseguição ou chantagem emocional; doenças graves e crônicas; utilização de medicação cuja a depressão seja efeito colateral; luto intenso por perdas, etc”.
O psiquiatra e diretor do Centro de Atenção Integrada à Saúde Mental da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Elson Asevedo, relata que é importante diferenciar a depressão de tristeza passageira. “Esta última é uma emoção humana saudável e adaptativa. Estar triste mobiliza recursos internos e ambientais para a recuperação. Pode durar minutos, horas, dias, semanas ou meses. Mas, geralmente, é proporcional aos eventos e não gera impacto duradouro na qualidade de vida. Já a depressão é um conjunto de alterações nas emoções, pensamento e no corpo que produz prejuízo na capacidade de realização de tarefas diárias e de bem-estar, com impacto negativo nas mais diversas áreas. Tristeza não é nem a característica central da depressão. Pessoas deprimidas podem não se sentir tristes, mas apenas um vazio ou a ausência de qualquer sentimento”.
Asevedo diz que a família tem papel fundamental nestes casos. “Em primeiro lugar, os familiares devem promover um clima de conversas sobre dificuldades emocionais. O exemplo costuma ser mais eficiente do que qualquer discurso. Ao conversar, é importante saber que, muitas vezes, quem tem sintomas de depressão sente vergonha. Por isso, garantir que estará ao lado da pessoa para enfrentar esse momento difícil é essencial. Ao oferecer a ajuda, saiba que os recursos que serão úteis provavelmente partirão do próprio sujeito. Ajude-o a acessá-los”.
A estudante T.M.* foi diagnosticada com depressão aos 15 anos, após vivenciar determinados eventos familiares e anos de bullying na escola. “Eu não sentia vontade de acordar, de levantar da cama, de comer, de fazer nada. Tentei suicídio duas vezes, da primeira vez, fiquei internada por 9 dias e, na segunda, por duas semanas. Quando saí do hospital o sentimento de culpa era imenso. Comecei a melhorar quando um psiquiatra usou uma combinação de medicamentos associada à psicoterapia e, hoje, estou mais equilibrada. Uso apenas um antidepressivo, além de fazer exercícios físicos e ter melhorado minha alimentação”.
A estudante conta que a cada nova recaída, aplica estratégias que funcionam para ela. “É preciso salientar que não existe cura para a depressão, mas sim controle. Não se pode abandonar o tratamento, pois uma reincidência pode ser fatal”.
Asevedo ressalta que reconhecer-se doente é um desafio. “O que ocorre de mais grave na depressão é que há um enorme estigma social. Como se ela fosse um problema de caráter, e não de saúde. Fica mais difícil ainda reconhecer essa patologia quando existe tanta carga de preconceito na sociedade. Ele é tão grande que se expressa, inclusive, no financiamento público de serviços que cuidam de doenças mentais”.
Andréa acredita que a melhor forma de prevenir a depressão é cuidando da mente e do corpo, com alimentação saudável e prática de atividades físicas regulares. “Saber lidar com o estresse e compartilhar os problemas com amigos ou familiares é outra alternativa, que pode ser aliada à atividade integrativa e complementar, como ioga ou meditação. Também ajudará uma boa leitura, aprender coisas novas, ter hobbies, viajar e se divertir”.