A gagueira de Lucas Barreto foi descoberta na adolescência, entre os 16 e 18 anos. Hoje, aos 24, o técnico de informática lembra das inúmeras situações relacionadas aos tropeços nas sílabas. “A gente tenta se expressar e não consegue algumas vezes. Quase sempre viramos motivo de chacota por conta desta situação”, diz. Assim como ele, dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Fluência (IBF), grupo voltado à divulgação de informações sobre o distúrbio da fala, revelam que cerca de 2 milhões de brasileiros são gagos e 9 milhões passam pelo problema momentaneamente. A maior parte desse número é de crianças e 55% dos casos são motivados por herança genética.
O técnico de informática conta que, durante a infância, a família não entendia o distúrbio e achava que era coisa de criança e logo passaria. “Recebi o diagnóstico tardio e iniciei o tratamento com a fonoaudióloga. Minha gagueira aparece em momentos diferentes. Percebo que travo mais nas palavras quando estou nervoso ou tentando explicar algo”.
Ele afirma que evitava determinadas situações para não ser motivo de piadas e constrangimentos. “No ensino fundamental e médio, raramente apresentava trabalhos na frente de todos. Mesmo assim, ainda era alvo de chacota, ficavam me imitando ou deixando irritado para que eu me enrolasse nas palavras. Procurava não me abalar com isso e superar essa dificuldade”.
Segundo Barreto, as entrevistas de emprego também eram muito desagradáveis. “Não posso provar com toda certeza, mas acredito que já perdi oportunidades por ter o problema. As pessoas julgam o gago como incapaz só por conta do seu distúrbio. Muitas vezes a gente perde espaço social e profissional”.
A fonoaudióloga Cláudia Silva explica que a gagueira é caracterizada pela repetição de sons e sílabas ou por paradas involuntárias, que comprometem a fluência e a comunicação verbal. A pessoa não consegue ajustar o tempo e a duração dos sons. Assim, articula com dificuldade determinadas palavras, repetindo-as ou prolongando a sua emissão. Alguns sentimentos, tais como medo, ansiedade, insegurança, timidez ou vergonha podem piorar a disfunção, pois diante de uma situação dessas, o organismo congela e reduz drasticamente os movimentos responsáveis para a produção da fala”.
Ela salienta que a disfunção pode ser causada por diversos fatores. “Dentre eles, genéticos, sociais e psicológicos. Geralmente, começa na infância e pode ou não persistir durante a vida adulta. Segundo estudos, cerca de 75% das crianças entre 2 e 4 anos apresentam o problema. Isso porque elas possuem o pensamento acelerado, associado àquela vontade de contar algo importante de forma rápida, o que acaba contribuindo para a dificuldade no ritmo regular da fala”.
Questionada sobre a razão das pessoas portadoras da disfunção não gaguejarem quando cantam, Cláudia diz que a parte do cérebro usada no canto é diferente da fala. “Têm dois sistemas pré-motores: o medial e o lateral. O primeiro é ativado quando a pessoa fala e o outro quando ela produz sons mais ritmados. Além disso, o problema é mais aparente na hora de fornecer informações novas ou de emitir uma opinião. Assim, a gagueira não some apenas com músicas, mas também em coisas que já são conhecidas e que foram treinadas antes”, afirma.
Diagnóstico e tratamento
De acordo com a especialista, a gagueira não possui cura, mas tratamentos eficazes que proporcionam uma excelente qualidade de vida. “É preciso que os pais fiquem de olho durante o desenvolvimento da fala da criança. Elas podem ter dificuldade de expressão e costumam apresentar sinais da gagueira. No entanto, pode ser uma coisa esporádica ou apenas aquisição normal da linguagem. Tudo deve ser avaliado por um fonoaudiólogo”.
Ainda segundo ela, não existe um padrão para estabelecer um diagnóstico. “Durante a consulta, verificamos o número de rupturas na fala em um intervalo de tempo, assim como fazemos uma análise do ritmo e da naturalidade da fala e observamos a tensão e movimentos associados. Levamos em conta ainda o histórico pessoal e familiar do portador do transtorno. Normalmente, o fator decisivo é o indivíduo demonstrar que, há 6 meses ou mais, está consciente da própria dificuldade de fluência”.
O tratamento deve ser iniciado assim que percebidas as manifestações, conforme reforça Cláudia. “Ele leva em conta a idade e as características do distúrbio de cada paciente. O objetivo é ajudar a melhorar a fluência do discurso e a capacidade de comunicação. São ensinados exercícios específicos durante a fala, controle da tensão muscular, utilização de pausas silenciosas com maior frequência, entre outros. A participação dos pais ou familiares também é fundamental para se obter sucesso. É recomendado ainda a psicoterapia, que pode auxiliar a pessoa que gagueja a reconhecer e a lidar com o estresse, ansiedade e medo, que podem piorar o prognóstico do transtorno”.