Em 2018, a Organização das Nações Unidas (ONU) emitiu um alerta sobre a necessidade de se evitar o aquecimento da Terra em até 20 C entre 2030 e 2052. Algumas medidas foram tomadas, mas não se mostraram suficientes. É o que revela o relatório divulgado pelo próprio órgão, em agosto, informando que não é mais possível limitar o aquecimento global em 1,50 C nos próximos 30 anos.
A pesquisa foi divulgada pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), baseada em 14 mil artigos científicos sobre o assunto. Segundo o documento, as alterações no clima e a influência humana sobre esse fenômeno são inquestionáveis. Cada uma das últimas quatro décadas tiveram aumentos significativos de temperatura, índices que são registrados desde 1850. O IPCC alertou ainda que se ações não forem adotadas para redução do dióxido de carbono (CO2) e outros gases que contribuem para o efeito estuda, o aquecimento da Terra de 1,50 C a 20 C será alcançado ainda neste século.
Em entrevista à imprensa, a vice-presidente do IPCC, Thelma Krug, afirma que se nada for feito, vamos presenciar inúmeros efeitos extremos, como ondas intensas de frio e calor, tempestades, queimadas, etc. Todos se tornarão cada vez mais violentos. “O que se espera é que esse relatório faça com que os governos assimilem e tomem as decisões mais apropriadas a respeito da questão”, declarou.
Para a engenheira ambiental Maria Constantino, uma série de fatores nos trouxe aqui. “O que vem sendo cultivado é um planeta de egoísmo, apego, materialismo e consumismo. Tudo isso pensando somente no que vemos, agindo pela própria conveniência e aprisionando uma ambição desmedida e inconsequente. Focamos em um modelo de economia linear, onde extraímos da natureza, transformamos em matéria-prima, fabricamos, distribuímos, consumimos e jogamos fora. Só que o ‘fora’ não existe e o descarte é feito no ar, na terra ou no mar”.
No Brasil, a política ambiental tem sido controvérsia. Pressionado, o presidente Jair Bolsonaro antecipou para 2050 a meta de neutralizar poluentes. Ele prometeu ainda dobrar o orçamento para ações de fiscalizações, com o objetivo de acabar com o desmatamento ilegal até 2030. “O que é contraditório, já que, em mais de 2 anos, o governo promoveu o desmonte das estruturas de fiscalização e controle de desmatamento, protegeu desmatadores, grileiros e garimpeiros ilegais e fez tudo que conseguiu para fomentar uma política antiambiental”, critica o editor-chefe do Instituto Ciência na Rua, Thiago Marconi.
Para o especialista em sustentabilidade, João Carlos Salgueiro de Souza, a cada fração de aumento do aquecimento global, os efeitos deletérios são potencializados. “Estamos em uma linha tênue na qual o tempo está se esgotando e o custo da inação fica cada vez mais alto. Definitivamente iremos vivenciar uma piora das condições de vida e isso acarretará em extrema desigualdade social, pois as populações mais pobres e vulneráveis serão as mais afetadas”.
Marconi acrescenta que estamos colocando em risco uma quantidade enorme de espécies e que isso causa desequilíbrios ecológicos. “Por exemplo, as microalgas que vivem em simbiose com os corais os abandonam conforme a temperatura sobe, o coral perde seu alimento e morre. E, com isso, uma pequena espécie de crustáceo que dependia dele para alimento ou abrigo desaparece. Um tipo de peixe que comia o pequeno crustáceo não encontra mais o alimento e por aí vai. Além disso, as consequências na vida dos humanos tendem a piorar: secas que tornem os alimentos mais caros, inundações em cidades pelo aumento das chuvas fortes, elevação do nível do mar comprometendo locais habitados, etc”.
Maria ressalta ainda que o estilo de vida da nossa sociedade também será afetado se todos continuarem a agir como atualmente. “Se isso persistir, é certo de que o homem acabará destruindo o planeta e a si mesmo. Cada um de nós precisa ser o 1% que a sociedade necessita para que, juntos, consigamos mudar este cenário”.