Tempos de incertezas. Vivemos de perguntas: Quando sai a vacina? E a volta às aulas? E meu emprego? Quando voltaremos ao normal? Como será o amanhã? Estes e tantos outros questionamentos borbulham em milhões de cabeças pelo mundo. Mas, uma faixa etária conhecida pela intensidade parece especialmente afetada pela pandemia da COVID-19. Segundo levantamento da consultoria Eureka, 70% dos jovens afirmam que o isolamento social impacta negativamente em sua saúde psíquica, intensificando sentimentos como ansiedade e nervosismo.
Quando perguntados sobre como está sua saúde emocional nos últimos meses, metade dos 2.300 entrevistados, com idade média de 26 anos, afirmou que poderia estar melhor. Enquanto 25,5% classificou sua saúde mental como ruim e apenas 10% notaram algum tipo de melhoria nesse sentido nos últimos meses.
Para o psicoterapeuta Weslley Carneiro, é natural que, diante de um cenário sem precedentes, as pessoas sintam-se despreparadas. “Devemos partir da ideia de que somos seres gregários e, apenas por essa questão biológica, já poderíamos prever o impacto do isolamento em nossa saúde mental. Grande parte dos adolescentes e jovens adultos está vivenciando um período de experimentação e de uma hora para outra precisaram rever várias de suas rotinas e comportamentos. Além disso, inseguranças sobre a vida escolar e o futuro profissional se fazem presentes, tornando esse momento ainda mais delicado”, avalia.
Como reagimos à ansiedade?
A pesquisadora e psicóloga especialista em terapia cognitivo-comportamental, Renata Borja, estuda como a pandemia do novo coronavírus expõe as vulnerabilidades emocionais dos jovens. De acordo com ela, mudanças drásticas como essas, ainda que temporárias, podem servir de gatilho para a adoção de hábitos tóxicos, como o consumo descontrolado de ansiolíticos, antidepressivos e bebida alcóolica.
“É muito comum os jovens tentarem aliviar a ansiedade por meio de um sistema de recompensa mal adaptativo. O que é isso? Quando não nos sentimos bem, automaticamente, nossa mente busca algo em coisas prazerosas e, para um grande número de pessoas, isso pode ser comida, bebidas alcóolicas, drogas, compras, entre outras. Esse tipo de recompensa pode ser uma busca de prazer imediato para que se sinta melhor diante de uma situação de estresse. No entanto, esse alívio é superpreocupante porque criamos pessoas viciadas, ou seja, uma sociedade disfuncional”, explica.
“Para que um adoecimento mental aconteça é preciso o fator vulnerabilidade, que diz respeito às questões genéticas, biológicas, crenças e o contexto em que a pessoa está inserida e, por outro lado, o agente de estresse. Para quem tem alta vulnerabilidade, um pequeno fator estressor cria a possibilidade de adoecimento. Se o indivíduo tem baixa vulnerabilidade, ele vai precisar passar por um estresse muito grande para adoecer. A pandemia é um desses fatores porque gera uma série de dificuldades na rotina, problemas financeiros, isolamento social, medo de pegar a doença, etc. Isso tudo ativa a vulnerabilidade das pessoas”, esclarece Renata.
Segundo estudos realizados pela psicóloga em uma escola particular de Belo Horizonte, 75% dos alunos com idade entre 14 e 16 anos revelaram sofrer de ansiedade. Apenas 22,54% dos estudantes demonstraram ser pouco ou nada ansiosos, 13,56% responderam moderadamente, 23,11% afirmaram ser muito e 40,7%, totalmente. O mais preocupante, entretanto, foi na resposta à pergunta: a ansiedade me atrapalha e me prejudica? 9,54% responderam nada, 15,57% pouco, 19,09% moderadamente, 22,61% muito e 33,16% totalmente.
Como cuidar da mente?
De maneira simplificada, a resposta para essa pergunta é “crie uma rotina saudável”. “É até engraçado falar, mas o grande problema que estamos vendo com relação à saúde mental está atrelado à falta ou mudança de rotina”, diz Renata.
“Precisamos de uma série de questões para alcançar o bem-estar mais equilibrado como atividade física, sono adequado, espiritualidade, lazer, conseguir adaptar nossas tarefas de forma organizada, planejada e sem procrastinar, etc. Quando todas essas áreas estão organizadas, possivelmente, essa pessoa vai estar bem. Muitos já tinham uma rotina estruturada, mas foram obrigados a abandoná-la e não criaram uma nova forma de funcionar”.
Para Carneiro, a adoção de hábitos de autocuidado específicos para saúde mental também são essenciais. “De maneira geral, já sabemos que alimentação e atividade física regular contribuem positivamente para nossa saúde integral, mas algumas práticas como mindfulness pode ser um meio de desenvolver maior autoconsciência e com isso alcançar maiores índices de satisfação com a saúde mental. De todo modo, as transformações às quais estamos sendo expostos fazem deste um bom momento para buscar ajuda profissional e os benefícios da psicoterapia”, recomenda.