Apesar da prática de home office e teletrabalho já existirem no mercado há bastante tempo, muitas empresas ainda não são familiarizadas ao regime não-presencial. Pegos de surpresa pela pandemia da COVID-19, tanto funcionários quanto empregadores precisaram adotar a esta alternativa, porém, muitas dúvidas quanto ao fornecimento de equipamentos e reembolso de despesas ainda pairam sobre o assunto. O advogado trabalhista André Leonardo Couto esclareceu alguns destes questionamentos em entrevista ao Edição do Brasil.
Quais são as principais diferenças entre o home office forçado, mas que o contrato de origem é presencial, e o teletrabalho previsto na CLT?
O home office é uma forma alternativa de trabalhar, usada em períodos curtos e não exige a formulação de adendos ao contrato de trabalho, o que já é exigido para o teletrabalho, que também obedece a uma série de determinações. Vale destacar ainda que, apesar de serem institutos semelhantes, o teletrabalho possui previsão legal, nos artigos 75-A ao 75-E da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com as alterações introduzidas pela reforma Trabalhista, enquanto que home office não tem qualquer previsão na CLT ou legislação específica.
Com a COVID -19, empresas foram pegas de surpresa e, em muitos casos, não houve formulação de adendos aos contratos vigentes. Porém, já avançamos para o sexto mês de home office. Essa falta de oficialização dos termos deve se estender até o fim da pandemia?
Em um primeiro momento, a Medida Provisória (MP) 927, vigente em março deste ano, reduziu a burocracia para a adoção do home office ou teletrabalho, podendo o empregador, por exemplo, a seu critério, alterar o regime de trabalho presencial para teletrabalho ou home office, independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho. Contudo, a MP 927 está extinta desde julho. Assim, entendo que o home office pode ser aplicado para situações eventuais e se houver necessidade de prática do trabalho fora das dependências da empresa de forma habitual, entendo que a legislação vigente, Lei 13.467/17, mediante seus artigos 75-A e seguintes, já autorizam a adoção do teletrabalho, precisando, para isso, tão somente, a adoção da previsão no contrato de trabalho ou aditivo contratual.
Como fica, por exemplo, a questão de apoio ao funcionário em casa em relação às ferramentas necessárias para execução do trabalho? (notebook, internet, serviço de armazenamento, segurança da informação, etc)?
A MP 927 falou um pouco de teletrabalho e trouxe no Artigo 4 – Parágrafo III, que as questões relativas à aquisição, manutenção e fornecimento de equipamentos deveriam ser ajustados entre as partes e, na hipótese do empregado não possuir a infraestrutura tecnológica, que o empregador poderia fornecer em regime de comodato. Porém, essa MP não está mais vigente. Portanto, considero o que está previsto no Artigo 75-D, da CLT, que diz que as disposições relativas pela aquisição, manutenção e fornecimento de equipamentos tecnológicos necessários e adequados à prestação do trabalho remoto, bem como o reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstos em contrato escrito. Ou seja, a lei não especifica se será do empregado ou empregador. Também não há jurisprudência sobre esse assunto, lembrando que são temas novos. Se eu fosse empregado de uma empresa e o empregador me pedisse para trabalhar de casa, porém não fornecesse os equipamentos, eu iria notificá-lo. Diria que estava tendo tais custos e que gostaria do reembolso. Qual é o risco disso? De o empregador mandá-lo embora e contratar outro. Não há previsão legal de que seja obrigação do empregador. Isto tem que ser ajustado pelas partes, com previsão em contrato escrito ou aditivo contratual, podendo ficar os custos com a infraestrutura a encargo do empregador e os custos não mensuráveis como água e luz, por exemplo, por conta do empregado. Tudo tem que ser combinado entre ambos.
Quais benefícios devem ser mantidos e quais devem ser cessados nesses casos?
Todos os benefícios que forem necessários para o empregado, tanto no trabalho presencial como no home office e teletrabalho devem ser mantidos, como, por exemplo, plano de saúde. Agora, benefícios que não serão utilizados pelo empregado em casa, como vale transporte podem ser cessados durante a adoção destas atividades.
Benefícios que não existiam, como ajuda de custo na energia, telefone e internet, já que as despesas do funcionário aumentaram, devem ser criados?
Tudo vai depender de ajustes entre as partes, frisa-se, sempre formalizado em contrato individual de trabalho ou aditivo, ou seja, pode o empregador suportá-los ou não e, caso o empregador passe a arcar com os gastos, fica ajustado que após o término do home office ou teletrabalho, os custos serão cessados. Vale registrar, que essas despesas, não integram a remuneração do empregado, ou seja, não tem cunho salarial.
Como o funcionário pode provar, por exemplo, que fez horas extras em casa para atender a demanda?
Não obstante as demandas por teletrabalho ou home office serem externas, se houver qualquer tipo de ingerência do empregador quanto a jornada, por exemplo, sistemas tecnológicos como câmeras de filmagens, sistema de computador que acusa em tempo real as atividades realizadas, telefonemas, dentre outros, podem, a princípio, ensejar direito a horas extras. Agora, se a função for exercida pelo empregado com total autonomia, não há que se falar em horas extras, porque ele pode iniciar e encerrar as atividades no horário que melhor lhe aprouver, o que interessa para o empregador é o resultado e não os horários trabalhados em si.