Conseguir perdoar alguém que nos magoou é para muitos uma tarefa difícil. Mas, há quem diga que o perdão faz bem para a alma e o coração. Mas, será que, de fato, esse ato é tão libertador quanto falam? A psicóloga Luisa Conrado explica que sim.
Ela acrescenta que perdoar é liberar o outro da dívida que tem com a gente. “Não se trata de esquecer o que passou, mas deixar de querer uma compensação por aquilo. O ato alivia ambas as partes, é como parar de cobrar e ser cobrado”.
Contudo, Luisa explica que é difícil pois ficamos apegados à dor. “Não entendemos porque o outro agiu daquela forma, ou seja, não temos empatia com quem nos causou dor. Somos todos humanos e, inevitavelmente, vamos machucar outra pessoa”.
A psicóloga diz que, mesmo perdoando, é possível seguir sem a pessoa na sua vida. “Perdão não significa voltar a ficar tranquilo com alguém, mas que você compreendeu e sabe que ela não pode fazer nada para que você se recupere do que te machucou”.
Ela faz uma analogia para que se possa compreender melhor como cada indivíduo pode agir nesses casos. “Perdoar e não querer mais contato com quem te magoou é super-humano e um direito. Liberamos o outro da dívida, mas não precisamos continuar fazendo negócios com ela”.
Luisa esclarece que é essencial compreender o contexto da situação, as partes e refletir o espaço que aquilo ocupa em nossas vidas. “Tem uma frase do filósofo Sartre que diz: ‘Não importa o que fizeram de mim, o que importa é o que eu faço com o que fizeram de mim’. Guardar ressentimento não é bom”.
O caminho até o ato de perdoar é delicado, mas, às vezes, o sentimento vem sem percebermos. “A gente segue em frente sem a necessidade de cobrar, tirar satisfação ou querer uma compensação e isso já é uma forma de perdão”.
Cada situação uma sentença
Foi o que aconteceu com A.R* e seu pai. “Minha mãe queria se separar e ele não aceitava, no Réveillon íamos para a casa da minha irmã e ele se opôs. Queria manter ela presa. Fui tentar conversar e ele começou a quebrar tudo, tentou me agredir e começou a me enforcar. Depois desse dia, ele morreu pra mim. Eu falava para as pessoas que não tinha pai”.
O sentimento começou a mudar após a perda de um tio. “Ele era uma das pessoas que eu mais amava na vida e fiquei pensando em como as coisas acontecem sem avisar. Pensei muito no meu pai e refleti que, apesar do erro dele, a vida poderia tirar ele de mim na mesma velocidade, mas relutava porque a mágoa era grande”.
O tempo foi passando e, mesmo sem receber um pedido de perdão, a dor no peito foi aliviando. “Foi difícil, principalmente porque ele não me procurou depois, mas eu estava leve, a mágoa e o ódio não faziam mais parte de mim. Senti que perdoá-lo foi melhor até pra mim do que pra ele, e realmente foi. Para ele, foi receber a ligação de uma filha, pra mim, foi tirar uma dor que não deveria mais carregar no meu coração”.
B.P* está buscando formas de encontrar o perdão. “A pessoa que estou me relacionando me traiu. No começo foram mentiras que acabei descobrindo e depois a traição. Foi um processo doloroso e ainda está sendo. Queria conseguir perdoar e seguir em frente, mas não sei se consigo”.
Ela se sente, de alguma forma, presa ao relacionamento. “Eu tenho medo de não perdoar e ser injusta, também temo perdoar, passar por um longo processo de cicatrização e acontecer tudo de novo. Quando a pessoa te machuca tantas vezes seguidas, você nem sabe se vale a pena”.
Para ela, o perdão a ajudaria seguir com a vida. “É muito confuso, mas, às vezes, parece que é impossível entender o porquê da pessoa ter feito aquilo e tentar continuar”, declara.
Já L.B* decidiu que, após ser enganada por uma amiga no trabalho, não há possibilidade de perdão. “Eu indiquei ela para a empresa na qual trabalhava. Passou um tempo e nós começamos, indiretamente, a concorrer por uma promoção. Só nós duas podíamos ser promovidas, dependia da chefia escolher quem. E ela fez o possível e o impossível para que eu não fosse a escolhida. Não vou ser hipócrita de dizer que torcia por ela, afinal, do outro lado da disputa estava eu. Mas se eles escolhessem ela, eu não ficaria com inveja, ficaria feliz”.
A situação ficou ainda mais delicada quando tudo isso custou o emprego de L.B. “Ela fez fofoca, intriga, me colocou contra algumas pessoas importantes na empresa. E, por fim, manipulou uma situação para parecer que eu não havia feito meu trabalho direito. Meu chefe percebeu isso e, em uma conversa franca, acabamos concordando que seria melhor me desligar da companhia”.
Para ela, a amizade acabou ali. “Eu a indiquei para a vaga e, antes de qualquer trabalho, éramos amigas há anos. Nunca imaginei que ela faria isso. Após um tempo, ela começou a me procurar, se disse arrependida, mas, pra mim, não tem perdão. Isso só mostrou o tipo de pessoa que ela é e não quero gente assim na minha vida”.
De acordo com a psicóloga, perdoar é um processo. “Muitas vezes não dá para desculpar quando a dor está na carne viva. Mas quem sabe daqui há uns dias, meses ou anos? A gente tem que respeitar o próprio tempo até para perdoar”.
Ela garante que a consciência do que houve é muito importante. “O que aconteceu, o que esperava que o outro fizesse, quais eram minhas expectativas, como me sinto etc. O autoconhecimento nessa hora é muito importante, assim fica mais fácil entender porque aquilo doeu”.
O autoperdão também é essencial. “A gente vive em um mundo de culpa e em uma sociedade pouco suscetível a erros. É fundamental reconhecer que a gente fez o melhor que conseguimos naquele momento da nossa vida, estamos sempre aprendendo e evoluindo. Se perdoar é um ato de amor próprio”, finaliza Luisa.
*A pedido, os nomes das personagens foram preservados