A Lei 8.213/91, popularmente conhecida como Lei de Cotas, foi um importante mecanismo para proporcionar a inserção da pessoa com deficiência no mercado de trabalho. No entanto, apesar da norma ter mais de 26 anos de existência, a realidade de contratações em Minas Gerais ainda está distante do número adequado. De acordo com dados do Ministério do Trabalho (MT), 2.937 empresas no Estado estão sujeitas a cumprir a legislação, o que resulta em 59.930 vagas que teriam que ser direcionadas exclusivamente para deficientes. Mas apenas 31.689 (52%) desses postos de trabalho estão ocupados. E para falar sobre esse assunto, o Edição do Brasil entrevistou Luiz Henrique Porto Vilani, diretor de Políticas para Pessoas com Deficiência.
As empresas ainda têm preconceito na contratação da pessoa com deficiência? Por que isso acontece?
Infelizmente sim. Temos avançado na sensibilização da sociedade sobre o potencial das pessoas com deficiência, mas ainda falta conhecimento e uma cultura social de inclusão. As companhias buscam um perfil que supostamente é o ideal e desprezam outras características do portador de alguma deficiência que seriam fundamentais para avançar em processos produtivos. Parte do empresariado ainda não se tocou sobre essa importância na contratação para além de cumprir a Lei de Cotas.
As instituições financeiras já perceberam esse potencial de produção e de geração de renda. Os bancos são modelos de acessibilidade, pois a maioria tem caixas adequados e um programa especial de leitura de tela para cegos e, geralmente, quem desenvolve isso são portadores de deficiência contratados pelo banco.
Como seria possível mudar esse perfil?
Temos que sensibilizar as empresas e também os próprios funcionários, tanto aqueles com e sem deficiência. Nós precisamos transformar essa cultura e isso não vai acontecer se não houver uma mudança de atitude de quem trabalha diretamente com essas pessoas. Sem a Lei de Cotas não teríamos a contratação de tantas pessoas como a gente tem hoje. Não há dúvidas que a gente precisa aperfeiçoar os mecanismos de fazer essa lei ser cumprida, principalmente de mudar a atitude do empresariado e dos próprios funcionários. Ao longo dos anos, muitas empresas já avançaram sensivelmente nesse sentido, o que aconteceu somente depois que eles passaram a conviver com os portadores de deficiência.
Existe algum grupo de deficiência que mais sofre na busca por vagas? Quais as razões?
Com certeza são os deficientes intelectuais. As agências que fazem a mediação de vagas citam que as empresas querem um perfil com uma deficiência mínima. A lógica atual do mercado ainda tem uma visão de que a pessoa é que tem se adequar a empresa. Falta essa formação interna para compreender que as diferenças e potencialidades da pessoa com deficiência não são barreiras. Hoje existe a tecnologia assistiva que pode facilitar a acessibilidade ao trabalho. Temos também uma série de procedimentos e de apoio que trazem resultados para a própria empresa, mas isso ainda não é amplamente conhecido pelo empresariado.
A pessoa com deficiência tem direito à jornada de trabalho especial?
A lei prevê uma jornada de trabalho variável e até horário flexível, mas essa é uma prerrogativa do trabalhador. Vou citar o exemplo do portador de tetraplegia que não têm o controle do movimento das pernas e comprometimento nos membros superiores. A sua rotina para se deslocar até o trabalho é bem diferente. Geralmente acorda mais cedo para chegar no mesmo horário e tem dificuldades para fazer necessidades. Isso faz com que tenha que ter uma adequação. E se você exigir as mesmas condições de uma pessoa comum, você estaria penalizando o trabalhador duas vezes. Uma em função da própria deficiência e outra por não reconhecer essa característica e essas necessidades que ele teria.
Como fica a disposição dos cargos? Eles são compatíveis?
Infelizmente a maior parte da oferta de cargos está associada a uma menor exigência sobre o intelectual. São serviços com tarefas mais burocráticas, repetitivas e muitas vezes menos valorizadas. Não que isso seja incompatível, mas as pessoas com deficiência possuem um potencial para além disso. Elas têm as mesmas possibilidades dos demais colaboradores e pode alçar voos maiores.
Quem fiscaliza o cumprimento da Lei de Cotas e quais as sanções previstas?
A fiscalização é de responsabilidade do Ministério Público do Trabalho (MPT) e a empresa pode sofrer a incidência de multa. Atualmente, Minas está com uma proposta diferenciada. O MPT abriu uma relação de quem ainda não está cumprindo a lei e criou um Fórum de Inclusão e Acessibilidade das Pessoas com Deficiência no mercado de trabalho, com participação de órgãos públicos e privados. As empresas foram notificadas e mais de 8 mil vagas serão abertas. É uma grande conquista e a gente espera que essa estratégia possa acelerar esse processo de mudança cultural. Atualmente, existem grandes corporações que preferem pagar a multa do que cumprir a lei. Mas nós percebemos que isso tem mudado e a ideia do fórum é justamente mostrar para a empresa que existem soluções diferentes.
FIQUE SABENDO!
As empresas com cem ou mais empregados são obrigadas a preencher de 2 a 5% dos seus cargos com pessoas portadoras de deficiência.
De 100 a 200: empregados 2%
De 201 a 500: 3%
De 501 a 1.000: 4%
De 1.001 em diante: 5%