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Quem ganha menos, paga mais tributos

Você já fez os cálculos de quanto paga de impostos para comprar algo no país? Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), as pessoas gastam uma média de 150 dias – ou seja, 5 meses – de trabalho para quitar os tributos. Para se ter uma ideia de como os produtos consumidos são tributados, paga-se, aproximadamente, 50% do valor da cerveja, tênis importado, gasolina e a conta de luz em impostos. Já um carro 1.0 possui 35% e uma vodka tem 82% do seu preço destinado ao governo. Porém, esse valor não incide da mesma forma para todos os cidadãos.

De acordo com um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os 10% mais pobres da população destinam 32,8% da sua renda para o pagamento de tributos, enquanto que para os 10% mais ricos, o ônus estimado é de 22,7%. Utilizando o salário mínimo como referência para classificar os níveis de rendimento, os números são ainda mais contundentes confirmam a regressividade da tributação no Brasil: famílias com renda de até dois salários-mínimos pagam 48,8% – que equivale a R$ 914,51 – em taxas, já os com receita acima de 30 salários-mínimos, cerca de 26,3%, saldam R$ 7.392,93.

O professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e pesquisador do Centro de Estudos Republicanos Brasileiros (Cerbras) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ronaldo Teodoro, explica que a forma de arrecadação tributária é considerada regressiva, porque beneficia quem menos precisa e incide mais para os que ganham menos. “Por envolver fortes interesses políticos e econômicos, a tributação vai incorporar o nível de influência que cada um desses grupos tem. Em outras palavras, é a economia desenhando a arena política”.

Teodoro afirma que essa distorção acontece, porque o maior volume da arrecadação está no consumo. “É óbvio que o preço das coisas vai incidir com mais perversidade sobre o poder de compra daquelas pessoas menos empoderadas. Uma garrafinha de água comprada por alguém que ganha um salário mínimo ou por quem recebe R$ 20 mil, terá a mesma carga tributária, ou seja, o impacto sobre o assalariado será maior”.

Outras tributações

Ele explica que existem ainda mais duas formas para se arrecadar: renda e propriedade. A primeira impacta sobre o salário ou acúmulo de receitas de uma empresa e é nesse quesito que está a maior pressão para se retirar as taxas, pois os empresários acreditam que esses tributos encarecem o trabalhador com carteira assinada. “Nos países que resolveram essa questão, a empresa tira a tributação que impacta a contratação do trabalhador, mas joga para o lucro líquido. Assim, fica mais fácil para se contratar, mas não significa que ficará sem essas taxas”.

O imposto de renda de pessoas físicas também está nessa faixa de arrecadação. Teodoro acredita que é neste quesito que pode-se fazer justiça tributária, pois o IR cobra mais de quem ganha um maior salário. Caso o Brasil aperfeiçoasse essa cobrança, parte da taxa que incide sobre o consumo poderia ser retirado e repassado para renda, afinal essa modalidade é mais difícil de sonegar e alivia-se o problema relatado acima. “As alíquotas de imposto de renda ainda têm escalas muito dilatadas, e, às vezes, o mesmo imposto é cobrado de uma pessoa que ganha R$ 5 mil e de quem recebe R$ 15 mil. Deveria criar percentuais mais variados para captar essas mudanças de remuneração que a sociedade tem”.

A outra forma de se arrecadar é por propriedade, onde há o maior gargalo, afinal é nesta faixa que se tem muita sonegação fiscal. “Podemos passar pela região da Pampulha, ver aqueles casarões e o que eles pagam é muito pouco, proporcionalmente, ao que ganham. Se a gente for pensar na propriedade rural, o escândalo é ainda maior, porque declara-se o tamanho da propriedade e, a partir daí, calcula-se o imposto. Por exemplo, eu sou dono de uma fazenda do tamanho de Belo Horizonte – o que não é raro no Brasil – e declaro que a metragem da terra menor. Com isso, acaba-se aliviando os setores mais altos da sociedade”.

O professor destaca que, para se ter justiça social, é necessário que haja a cobrança desses valores. “Impostos são fundamentais para a sociedade e podem ter efeitos muito positivos para as camadas mais pobres da população”, finaliza.

Conheça os impostos existentes no Brasil:

Consumo Renda Propriedade
PIS/COFINS: Programa de Integração Social/Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – De 0,62% a 7,6%; Imposto de renda pessoa física:  De 7,5% a 27,5%

 

IPVA: Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – Imposto anual, cuja alíquota varia de acordo com o modelo e o valor venal
ICMS:  Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – Alíquota varia de acordo com o produto e o Estado; Imposto de renda sobre ganho de capital (pessoa jurídica): De 15% sobre lucro anual

 

IPTUImposto sobre a Propriedade Predial e Territorial e Urbana – Imposto anual cobrado pelas prefeituras, com alíquotas variáveis de acordo com o valor venal e localização do bem.

 

IPI: Imposto sobre Produtos Industrializados) –  Alíquota varia de acordo com o produto
ISS: Imposto Sobre Serviços – Incide sobre a prestação de serviços e varia de acordo com a cidade
IOF: Imposto sobre Operações Financeiras – Incide sobre empréstimos e varia de acordo com a operação

Impostos simplificados

O Movimento Brasil Eficiente, criado pelo empresário Paulo Schneider, tem como principais objetivos simplificar os impostos da circulação de produtos para evitar a sonegação fiscal e criar um Conselho de Gestão Fiscal para atuar de forma estratégica, visando otimizar a gestão pública. Segundo a coordenadora do grupo, Erika de Oliveira e Silva, o movimento quer “facilitar a vida do cidadão, reduzir o número de leis e, consequentemente a burocracia, facilitando o caminho do dinheiro para que ele caia de maneira correta e direta, ao final do dia, na conta de cada ente responsável”.

A instituição conseguiu que o Projeto de Lei que permite a Instalação do Conselho de Gestão Fiscal fosse aprovado, de maneira unânime, pelo Senado Federal. A proposta está, desde 2015, aguardando a apreciação por parte dos deputados. “Com essas duas medidas, o Brasil iniciará um verdadeiro círculo virtuoso: a arrecadação mais eficiente aumenta a receita do governo que, por sua vez, passa a gastar melhor o dinheiro que arrecada e o sistema fica mais transparente”.


Operação Zelotes, deflagrada pela Polícia Federal em 2015, investiga um esquema de corrupção no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), órgão ligado ao Ministério da Fazenda e responsável por julgar os recursos administrativos de autuações contra empresas e pessoas físicas por sonegação fiscal e previdenciária. Estão sob suspeita 74 processos que somam R$ 19 bilhões em valores devidos ao fisco.