Dados divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontaram que Minas Gerais é o segundo estado brasileiro que mais registrou feminicídios no país. Em 2022, foram 171 mortes, o que representa um aumento de 9,9% em relação a 2021, quando foram 155 registrados.
Para discutir o tema e as possíveis soluções para diminuir o índice, o Edição do Brasil conversou com a presidente da Comissão de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Minas Gerais (OAB/MG), Isabella Pedersoli.
Quais fatores têm contribuído para o aumento no número de feminicídios no estado?
Uma das explicações é a ausência de investimento em políticas públicas no combate à violência contra a mulher e de campanhas de conscientização. Precisamos sempre lembrar que o feminicídio é uma tragédia anunciada e é a última etapa de um ciclo de violência que vai aumentando gradativamente e termina na morte da mulher.
Por quais razões e quem são os autores mais comuns desses crimes?
Na realidade brasileira, onde mais se pratica crimes de feminicídio, o conceito é baseado nas relações domésticas e de relacionamentos amorosos. São homens que não aceitam o fim do relacionamento ou rejeitam a independência e a autonomia da mulher.
Há alguma diferença na legislação entre feminicídio e homicídio comum?
Com a sanção da Lei nº 13.104/2015, passamos a ter no Código Penal uma modalidade de homicídio qualificada, com penas mais altas. Mas não se trata que qualquer mulher que for assassinada que vai acabar se enquadrando no crime de feminicídio. A motivação precisa ser em relação ao menosprezo à condição do gênero feminino.
Existe relação entre a violência doméstica e os casos de feminicídio?
Antes de se cometer o crime de feminicídio, existe um histórico de violência, seja verbal, física, psicológica, moral, sexual ou patrimonial em relação àquelas mulheres. O feminicídio é precedido por diversas formas, sendo necessário que as mulheres fiquem atentas aos sinais que podem aparecer antes e durante os relacionamentos.
Quais são os principais desafios enfrentados pelas autoridades no combate a esse crime?
Acredito que o maior desafio do poder público ao lidar com mulheres que sofrem violência doméstica é a falta de capacitação e de qualificação dos agentes do estado, sejam policiais militares, policiais civis, Ministério Público e Justiça. É preciso que as pessoas que vão trabalhar com essa temática estejam verdadeiramente capacitadas e qualificadas, porque não se trata de um crime comum. Violência contra a mulher tem as suas particularidades.
Outro grande desafio é a ausência de efetivo. Faltam delegacias de mulheres no nosso país e quase 90% das cidades brasileiras não têm delegacia da mulher. A situação fica mais difícil no interior, onde as delegacias são, na maioria das vezes, ocupadas por homens. Então já acontece um desconforto ao se registrar uma denúncia. Não temos, infelizmente, o investimento ideal para combater as formas de violência contra as mulheres.
Quais caminhos seguir para a redução das estatísticas?
É preciso investir na rede como um todo, além do desenvolvimento de políticas públicas e campanhas de conscientização. É necessário fazer um acompanhamento da mulher, oferecer assistência social, apoio jurídico e amparo psicológico, porque sabemos o quanto a violência destrói a sanidade mental, a saúde psíquica e psicológica dessas mulheres.
Precisamos investir em um maior efetivo policial, delegacias de mulheres, mais juizados de combate à violência contra as mulheres na Justiça, assim como mais órgãos do Ministério Público especializados nesse atendimento. É necessário investir em educação de base para que a gente consiga mudar a cultura do nosso país, porque não é à toa que ocupamos o quinto lugar no mundo entre 180 países que mais assassinam mulheres.