Por unanimidade, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), aprovou no final de setembro, a criação da regra que promove a paridade de gênero no preenchimento de vagas de juízes da segunda instância nos Tribunais federais, estaduais, militares e trabalhistas, nas promoções por merecimento. Com a decisão, as Cortes deverão utilizar a lista exclusiva para mulheres, alternadamente, com a lista mista tradicional. A cota de paridade em Tribunais valerá a partir de janeiro de 2024.
Paula Cunha e Silva, desembargadora do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), afirma que para além de buscar a viabilização da ascensão profissional de magistradas, a participação paritária de mulheres na composição dos Tribunais, que têm a função de interpretar e aplicar a lei, conduz a constituição de um Judiciário mais democrático.
“Com uma composição mais diversa e plural, representativa da formação da sociedade brasileira, sobretudo em seus órgãos de cúpula, responsáveis pela elaboração da política judiciária, pela eleição das prioridades institucionais e respectivas dotações e alocações orçamentárias. Tais decisões, que regem os rumos do Judiciário, hoje, são tomadas por homens brancos, majoritariamente”, explica Paula.
Segundo dados do levantamento da Justiça em Números, do CNJ, apenas 38% da magistratura, composta por cerca de 18 mil juízes, é formada pelo sexo feminino. Enquanto entre desembargadores, o índice chega a 25% e, entre os ministros de Cortes superiores, esse percentual é ainda menor, de 18%. A aprovação da medida tem o intuito de ampliar o número de mulheres nos cargos de desembargadoras.
Paula ressalta que essa regra representa um grande avanço civilizatório. “A sub-representação no Poder Judiciário não se compatibiliza com o estado democrático, pois as decisões judiciais se destinam a homens e mulheres, demandando, assim, diferentes perspectivas que devem espelhar uma sociedade heterogênea”.
“Mas, ainda há muito a ser feito para alcançarmos uma sociedade igualitária nos moldes em que é propalada constitucionalmente, especialmente quanto à paridade de gênero nos espaços de poder. A despeito do avanço, essa discussão é apenas parte do problema. Também é preciso debater e construir soluções para o primeiro grau, garantir condições de trabalho para que as mulheres magistradas se movimentam e ascendem na carreira de forma paritária”, acrescenta.
Situação em Minas
A desembargadora relata que a realidade do Estado não é diferente dos demais tribunais. “Na Corte mineira, dos 150 cargos de desembargadores, apenas 30 são desempenhados pelo sexo feminino. Uma mulher nunca ocupou o cargo de presidente do TJMG, nem de presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) ou de Corregedor-Geral de Justiça, nem mesmo presidiu a Associação dos Magistrados Mineiros, demonstrando a exclusão das mulheres dos espaços institucionais de decisão”.
Paula destaca ainda que além das desigualdades resultantes de construções sociais, como estereótipos de gênero, é de se considerar outros problemas. “Por exemplo, vieses em bancas examinadoras e critérios estruturais como o que, durante todos esses anos, prevê, no processo de preenchimento de novos cargos de desembargadores, a votação pelos próprios integrantes das Cortes, que são em sua maioria homens, resultando em barreira de gênero à ascensão de mulheres aos espaços de liderança”.
“É extremamente importante e necessária a adoção de ações afirmativas para assegurar maior envolvimento institucional da mulher nos cargos mais altos dos Tribunais. Por exemplo, na participação feminina nas bancas examinadoras de concurso; nas mesas de eventos; como professoras/palestrantes das Escolas Judiciais, em comitês e grupos de estudos destinados a incrementar a atuação feminina na magistratura; estímulo à produção científica do sexo feminino; e nomeação paritária de magistradas para os cargos de alto escalão da carreira, dentre outras”, finaliza.