Nos últimos 20 anos, uma grande variedade de produtos eletrônicos como tablets, smartphones, videogames e computadores passaram a fazer parte do cotidiano de milhões de pessoas. Seja para conversar com amigos, acessar as redes sociais, consultar informações na internet ou simplesmente lazer.
Mas o uso dessas tecnologias em excesso pode causar dependência e acarretar diversos transtornos. Para falar sobre esse assunto, o Edição do Brasil conversou com Camila da Silva (foto), psicóloga e especialista em Terapia Cognitivo Comportamental (TCC).
O vício pode ser considerado uma doença? Como isso surgiu?
Sim. O nome é nomofobia. É um termo surgido na Inglaterra, em 2008, a partir da expressão “no-mobile-phobia”, que do inglês abreviado virou nomofobia. Ele é usado para descrever o medo de ficar incomunicável devido à falta do aparelho celular. Mais tarde, se estendeu também para o pavor de ficar sem o computador e outras tecnologias.
Todo mundo que usa tecnologia demais é dependente?
Nós temos que diferenciar o usuário abusivo, que é aquele dependente normal por lazer ou trabalho, daquele patológico e que precisa de tratamento. Hoje, todo mundo usa celular em teatros, cinemas, salas de espera, metrô e, para quem observa, parece que são viciados apenas porque passam muitas horas por dia no aparelho. Vira doença quando a pessoa se não tiver a tecnologia funcionando, seja por falta de bateria ou wi-fi, apresenta sintomas de angústia, ansiedade e nervosismo. A dependência patológica tem sempre algum transtorno associado. O que precisamos é de uma etiqueta digital, ou seja, uma educação para utilizar a tecnologia na sociedade sem cometer gafes ou ser inconveniente.
Quais os sinais de uma pessoa viciada?
Quando os indivíduos procuram ajuda, eles não sabem exatamente o que tem, mas já perceberam algum problema na vida pessoal, social, familiar, acadêmica ou profissional, porque estão usando muito a tecnologia. Há casos em que a pessoa repete o ano na escola, fica jogando até tarde e perde o sono, não almoça mais com a família ou deixa de praticar atividades físicas.
Como funciona o tratamento?
É feita uma avaliação psicológica e psiquiátrica. Colhemos os dados, verificamos o que está acontecendo e se a pessoa possui algum transtorno relacionado, normalmente é ansiedade, pânico, compulsão, depressão, dentre outros que podem estar associados a esse uso abusivo de tecnologias. Traçado o perfil do que é preciso, a gente programa um melhor tratamento.
Qual o grupo mais atingido?
De 1990 até a alguns anos, os adultos foram os mais atingidos. Mas, atualmente, temos muitos jovens dependentes de jogos on-line, já que o mercado tem fabricado alternativas cada vez mais interessantes, o que é muito atrativo para esse público.
De que maneira esse vício pode prejudicar a vida de alguém?
Em vários sentidos. Na vida pessoal, por exemplo, se você tem um relacionamento e ao chegar em casa seu companheiro não te dá atenção, por ficar grudado em alguma tecnologia, já está prejudicando. Se você é estudante e deixa de entregar algum trabalho, porque passa o dia todo jogando, terá problemas no colégio ou faculdade. Se fica até tarde ou não dorme, no dia seguinte você vai estudar ou trabalhar cansado. Ao deixar de fazer atividade física para ficar no computador, também está se lesando. A criança que não brinca mais na rua com os colegas, não está socializando e fica propensa a desenvolver obesidade e diabetes futuramente.
Quais são os riscos e consequências?
Existem prejuízos em todos os aspectos por conta do uso abusivo da tecnologia. Podem aparecer dores na coluna, pescoço, problemas de visão e articulação por ficar usando algum equipamento todos os dias e por muitas horas. Por exemplo, uma pessoa que é alta e utiliza a mesma mesa de computador de alguém que é baixo, está usando de uma forma inadequada. Outra questão é com relação ao uso do celular. O peso da cabeça é, em média, oito quilos e se você abaixa cem vezes por dia para olhar o celular, ao longo dos anos, terá um problema sério na coluna cervical.
Como os pais ou a família deve lidar com essa situação?
Os pais são os responsáveis pelo mau uso das tecnologias pelas crianças. Muitos dizem que seus filhos estão viciados, quando, na verdade, eles é que estão dando toda a condição. Colocam o computador no quarto e deixam o filho ficar horas mexendo no equipamento. A criança não é responsável por ela e os pais devem colocar limites. Como deixar usar somente uma hora por dia, depois que fizer o dever de casa, após almoçar na mesa. E depois o lazer pode ser brincar no computador. Ela precisa ser educada da maneira certa desde pequena, porque depois se acostuma mal e fica mais difícil controlar.