As empresas não são as únicas a lidar com os prejuízos e insatisfações motivados pela COVID-19 no Brasil. A maioria dos consumidores (64%) também está frustrada e afirma que o desrespeito aos seus direitos aumentou desde o início da crise sanitária, segundo aponta a pesquisa do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) realizada em 436 cidades com 1.140 pessoas das classes socioeconômicas A, B e C.
De acordo com o levantamento, o sentimento de desrespeito foi maior entre os moradores do Sudeste e Nordeste (65%) e entre a população da classe C (66%). Os exemplos mais citados foram dificuldade de cancelar um serviço ou devolver ou trocar um produto (19%), cobrança indevida (17%), venda de produto danificado, estragado ou alterado (15%), ausência de nota fiscal ou garantia (14%) e atendimento inadequado (13%).
Dentre os motivos, quatro foram responsáveis por mais de 50% do total de menções: falta de informação e conhecimento de seus direitos por parte dos consumidores (70%), falta de fiscalização/impunidade (68%), excesso de burocracia para reclamar e exigir (60%) e desvantagem do consumidor em relação às empresas que se aproveitam disso (50%).
Simultâneo ao aumento de desrespeito, as vendas no e-commerce também cresceram. Dados divulgados pela Ebit|Nielsen revelam que o desempenho do comércio eletrônico avançou 41% no ano passado, totalizando 194 milhões de pedidos on-line.
Para Plauto Holtz, advogado e especialista em direito do consumidor, essa elevação explica o aumento da insatisfação. “A alta demanda pelo comércio eletrônico aliado ao confinamento social podem ser apontados como causas desses números. O motivo principal é que muitos clientes, para diminuir as frustrações e conflitos por conta desses fatores da pandemia, acabam comprando mais e até além da necessidade, e ainda, não se informam adequadamente sobre o produto e as condições de frete, qualidade e prazos de entrega. Assim, as más empresas acabam se beneficiando disso, cometendo muitos abusos e, em algumas situações, até crimes contra quem consome”, afirma.
Quando perguntados se conhecem seus direitos como consumidores, a esmagadora maioria (94%) declarou que tem algum conhecimento, mas apenas 15% das pessoas afirmaram que tem muito ciência de seus direitos e 6% disseram não saber.
Grande parte dos clientes também declarou não se acomodar quando sente algum direito desrespeitado: 82% afirmaram que reclamam sempre ou na maioria das vezes, contra 14% que se queixam poucas vezes e 4% que não levam adiante a insatisfação. Além disso, 67% disseram que resolveram seus problemas em todas ou na maioria das vezes que apresentaram descontentamento.
No geral, os entrevistados acreditam que as autoridades públicas agem pouco neste quesito durante a pandemia. Para 52%, a avaliação sobre a atuação do governo em defesa dos direitos do consumidor é negativa: 28% entendem que o governo está se omitindo e 24% creem que ao invés de ajudar está prejudicando. Já para 35%, a avaliação é positiva: 25% acham que o governo está fazendo algum trabalho neste sentido e 10% julgam que está intervindo muito neste sentido.
“Cabe ao poder público, principalmente o Judiciário, aplicar o direito de forma mais eficaz. De uma maneira a desestimular algumas empresas a pararem de cometer os mesmos erros contra o consumidor. Fazendo doer no bolso da empresa, ainda é um dos fatores determinantes, pois, elas já sabem as boas práticas. O mais urgente é a criação de varas especializadas, até mesmo para prestar uma sentença efetiva e justa que atenda as expectativas da sociedade”, defende Holtz.
Para o advogado, historicamente, houve uma melhora no tratamento aos consumidores no país, mas ainda está aquém do ideal. “O maior exemplo de respeito vem dos Estados Unidos. Lá, a mão do Judiciário é pesada para quem não respeita essa relação, e os comerciantes estão atentos a construir uma relação de confiança. Não há espaço para empresas que praticam fraudes”, diz.