A empreendedora Francielle Oliveira, 33, costumava ter uma rotina pré-pandemia agitada, tanto no trabalho quanto socialmente. “Desde o meu estágio, com 23 anos, que sempre trabalhei muito, umas 9h, 10h por dia. Acordava cedo para malhar antes de ir para agência e, depois de lá, encontrava amigos em algum bar. Era raro quando ia para casa direto”, recorda. É difícil saber exatamente todos os efeitos que uma pandemia mundial pode causar no ser humano, mas um deles é o ganho de peso devido ao isolamento social brusco. E foi o que aconteceu com Francielle, que está com 4kg a mais do que considera ser seu peso ideal. Mas, ela não é a única. Pesquisa liberada em novembro pela PUC Minas mostra que 52,3% da população de BH engordou entre os meses de março e junho, período em que o distanciamento estava mais forte.
“Ficar um período maior dentro do próprio lar, sem poder se exercitar e executar suas atividades normais, somando-se a isso, a alimentação, geralmente hiperfágica, ou seja, comendo uma quantidade maior de alimentos, justamente por estar mais tempo em casa. Além disso, a maioria dos cidadãos buscam alimentos fáceis, ultraprocessados, que basta colocar no microondas e, geralmente, ricos em carboidratos, como açúcares e massas. Essa é a soma de fatores que fizeram com que as pessoas ganhassem peso durante a pandemia”, avalia Bruno Sander, médico cirurgião endoscopista, especialista em gastroenterologia.
Paralelo ao isolamento social, o cuidado com a alimentação também ficou de lado e o consumo de ultraprocessados saltou de 9%, em outubro de 2019, para 16% em junho deste ano, segundo estudo do Datafolha, encomendado pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). O levantamento foi feito com indivíduos entre 18 e 55 anos pertencentes a todas as classes econômicas e de todas as regiões do Brasil, e revela que salgadinhos de pacote ou biscoitos salgados foram os produtos campeões de consumo em comparação com o levantamento realizado em 2019, subindo de 30% para 35% a proporção de pessoas que os consomem. O segundo lugar no ranking ficou para margarina, maionese, ketchup ou outros molhos industrializados, cuja ingestão subiu de 50% para 54% em 2020.
Como explica Sander, o principal efeito dos alimentos ultraprocessados, como os salgadinhos, é justamente o aumento de peso. “São alimentos ricos em carboidratos e sódio, substâncias que não fazem bem, muito menos para quem quer emagrecer, portanto, apesar da facilidade de preparo, eles também facilitam o sobrepeso”, alerta.
Segundo o gastroenterologista, mudanças de hábitos são necessárias. “Basicamente, é a reeducação alimentar, ou seja, preferência por comidas saudáveis e diminuir o consumo de carboidratos. Associado a isso, outro fator determinante é procurar também uma atividade física, pois a perda de peso será maior”, aconselha.
Fator ansiedade
Ainda de acordo com o estudo da PUC Minas, mais de 70% dos entrevistados afirmaram ter ganhado peso devido à ansiedade excessiva do momento. “O estresse começa frente a qualquer evento que modifique o estado de tranquilidade de uma pessoa, seja enfrentar o trânsito nas grandes cidades, trabalho, o uso de aparelhos eletrônicos, os noticiários na TV e, atualmente, a pandemia, o medo da finitude ou a possibilidade dela. Diante disso, podemos dizer que estamos estressados o dia todo. Quando o indivíduo estressa gera uma resposta metabólica de defesa e proteção, desde os tempos mais remotos, do homem da caverna. O corpo de alguém ameaçado libera o cortisol, hormônio que comanda outros como a adrenalina e a insulina, que são liberados na corrente sanguínea, porque o corpo precisa estar preparado para correr ou fugir. Quando isso acontece várias vezes ao dia, a pessoa sente mais vontade de comer doces e carboidratos simples, que são os que mais engordam. A insulina que está circulando no sangue e no sistema nervoso central entende que o organismo precisa de mais energia atuando nas áreas da fome no cérebro. Isso, ocorrendo durante muito tempo, gera obesidade”, explica a psicóloga Sônia Fonseca sobre como a ansiedade opera no ganho de peso.
Segundo a psicóloga, nesse caso, é possível se autodiagnosticar, basta estar atento aos sinais que o corpo dá. “A ansiedade se manifesta também em outras áreas como nos estados de irritabilidade, modificações no ritmo do sono, descontrole motor em tarefas simples, a pessoa esbarra mais em móveis dentro de casa, deixa cair objetos, sente dificuldade em expressar uma frase com começo, meio e fim usando um vocabulário próprio. Tudo isso serve de alerta. Também foque nas quantidades e qualidades dos alimentos. Quando necessário é bom buscar ajuda profissional. Tanto em nutrição quanto para fazer uma psicoterapia. Em relação à comida é melhor fazer uma lista para supermercado e sacolão, tirando os alimentos mais calóricos e privilegiando os de melhor qualidade”, indica.