Na quarta-feira, 18, durante pronunciamento em uma rede social, o prefeito Alexandre Kalil (PDS) anunciou que, na sexta-feira seguinte, como forma de conter a disseminação do novo coronavírus, decretaria que restaurantes e bares só poderiam funcionar por delivery ou retirada no local. Pedro Oliveira, empresário do segmento e proprietário da Cervejaria Furst, localizada no bairro Santo Agostinho, zona Sul da capital, teve de correr. Seu bar que recebia, em média, 60 clientes por dia, até àquela quarta-feira, não entregava pedidos em casa. “Tivemos que adaptar refrigeração, equipe, embalagem, cadastro nas plataformas e fazer um investimento considerável em comunicação por redes sociais”, conta.
Com pouco mais de uma semana atendendo por entrega em domicílio, o retorno, segundo o empresário, apesar de crescente, ainda é pouco comparado às vendas do seu salão. “Estou vendendo de 25 a 30% do que vendia”, diz. Oliveira faz parte do universo dos empresários do ramo que não tinham uma estrutura própria de delivery antes da pandemia.
Ricardo Rodrigues, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes de Minas Gerais (Abrasel-MG), afirma que ele não está sozinho. “Não há dados de quantos estão trabalhando com delivery. Quem não tinha essa opção e começou agora está tentando rodar, fazendo a implementação às pressas, outros não. Os que já operavam com entregas, não tiveram aumento tão significativo em determinado dias e horários, em outros períodos houve algum aquecimento”, avalia. A Abrasel-MG representa 20 mil estabelecimentos do setor de alimentação fora do lar de Belo Horizonte e região metropolitana que, juntos, empregam 120 mil pessoas.
O motivo pelo qual nem todos conseguem migrar para modalidade das plataformas de entregas de pedidos é a alta competitividade. “Delivery não é simplesmente colocar numa vasilha e mandar. Você pode até começar nesse patamar, só que o mercado, por si só, vai te cercear. Por isso, nem todos aderiram e alguns tentaram e viram que estavam tendo mais despesa que receita”, explica o presidente da associação.
Novato nas plataformas, Oliveira se deparou com o que chama de “competitividade irreal”. Para ele, os aplicativos de pedidos on-line de alimentação são campos de guerra. “Tem restaurante vendendo um prato a R$ 5 e até cozinhas conceituadas vendendo pratos a R$ 25, longe do ticket-médio. Isso inflama as plataformas e gera uma competitividade irreal”, conta.
E como manter um caixa saudável funcionando nessas condições? “Vai virar uma bola de neve. Não vou ter condição de pagar imposto, aluguel, luz e água. Hoje, as prioridades são funcionários e alimentos, mas não sei por quanto tempo consigo mantê-las”, diz o empresário.
Mas mesmo quem opera há anos na modalidade não vê nela a solução da crise. É o caso de Lindoval Conegundes, proprietário de duas unidades do restaurante Paracone na capital. Em um de seus estabelecimentos, o delivery foi inaugurado em 1999 e possui estrutura, além de presença nos aplicativos, de call center e app próprio. “Nessa unidade, o faturamento do delivery já representava 40% e permanece estável com uma pequena alta de 10%”, diz.
Na outra loja, a estimativa é que as vendas tenham aumentado 50%, mas ainda assim é insuficiente para manter o caixa e as despesas. “É uma estrutura grande, diferente de quem monta uma loja pequena já pensando em operar por delivery. Tenho uma estrutura gigante pensada para servir 300 almoços por dia, mais as entregas e o movimento da noite. Portanto, 100 pedidos por dia passam longe de pagar essa conta, mesmo colocando grande parte do efetivo em férias coletivas”, afirma.
Sobre a equipe com mais de 50 funcionários, o momento é de incerteza. “Temos vivido um dia de cada vez, literalmente. Estamos nas mãos dos governantes e representantes”.
Dados dos aplicativos
Consultados se as vendas em sua plataforma, tanto no Brasil quanto em Minas, aumentaram, os aplicativos não divulgaram os dados. O iFood respondeu: “não abrimos esses valores nem recortes regionais”. A 99Food, que também não divulga dados sobre pedidos ou faturamento, enviou nota dizendo que “está operando normalmente em Belo Horizonte e Divinópolis e a empresa está acompanhando e monitorando as medidas indicadas pelo governo estadual e municipal”. Já a Rappi respondeu que, apesar de não divulgar o volume de pedidos por cidade, notou que, desde janeiro, quando começaram as conversas sobre o coronavírus, a plataforma percebeu um aumento significativo no número de pedidos de supermercado. “O que acreditamos ser uma resposta dos usuários preocupados com o tema incerto e medidas de quarentena sendo tomadas em diferentes cidades. As categorias que registraram um aumento maior foram farmácias, restaurantes e supermercados”, respondeu a empresa.