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“Partidos políticos artificiais iriam acabar”, defende Gabriel Azevedo sobre candidaturas independentes

Recentemente diagnosticado com o novo coronavírus, o vereador de Belo Horizonte Gabriel Azevedo, com passagens pelo PSDB e PHS, nunca escondeu de ninguém que prefere ser um político sem partido. Emancipado, mas não sozinho. Já foi subsecretário da Juventude no governo de Anastasia (PSDB) e coordenador de mídias sociais da campanha vitoriosa de Kalil (PSD) à Prefeitura de Belo Horizonte. Com fama de incisivo, ele é defensor das candidaturas independentes. Entretanto, a Constituição Federal de 88 decreta a filiação a algum partido como uma das obrigações para ser eleito a cargos políticos no país. Prestes a ter que escolher uma sigla para concorrer a uma possível reeleição no próximo pleito municipal, o Edição do Brasil conversou com o vereador sobre sua defesa pela emancipação partidária.

Por que você é defensor das candidaturas independentes?

A democracia não é o regime da maioria. Ela é o regime de qualquer um. O princípio democrático é a participação. Exigir a filiação partidária para uma candidatura é limitar esse direito. Mais de 90% das nações adotam essa ideia e o Brasil faz parte de um grupo minoritário. No nosso caso, há um agravante, as legendas não são democráticas internamente e, muitas vezes, servem de barreira a quem deseja se candidatar. Isso não é bom para nossa sociedade.

E quais seriam os benefícios para sociedade?

São dois grandes benefícios. Primeiro, o fluxo para a participação da sociedade iria aumentar e os partidos políticos artificiais, que servem apenas de cartório eleitoral acabariam. As legendas verdadeiramente ideológicas e comprometidas com a democracia interna iriam se fortalecer. Se ninguém fosse obrigado a participar de uma legenda, apenas aquelas que, de fato, se constituíssem como um grupo com valores, teriam chance de seguir existindo. É fundamental dizer que não sou contra partidos políticos. Pelo contrário, entendo que eles podem ter um papel a agregar. Todavia, no caso brasileiro, a obrigatoriedade gera estruturas hierárquicas que não contribuem para nossa sociedade.

Para o vereador, é impossível que o político concilie suas prioridades com a do partido?

Não é impossível. Pode ocorrer. Entretanto, não deveria ser obrigatório. Quem quiser participar de um partido político e defender suas bandeiras pode. Quem preferir proteger suas bandeiras sem um partido também tem essa permissão. Fica difícil compreender por qual razão as pessoas acham que alguém não pode ter ideias sem ter um partido político. E também fica difícil entender porque alguns insistem na hipocrisia de que estar num partido significa obrigatoriamente defender ideias. Não é o caso.

O vereador defende as candidaturas independentes para concorrer a todos os cargos políticos?

Sim. Nas eleições majoritárias, de senador, prefeito, governador e presidente, é fácil, quem tem mais votos vence. Nas eleições proporcionais, de vereador, deputado distrital, deputado estadual, deputado federal, defendo o sistema distrital-misto, onde metade das cadeiras adota o modelo first-past-to-vote (o país é dividido em distritos com a mesma porção de eleitores em cada, o que faz o tamanho territorial dessas partes variar, ganha o candidato a deputado federal que for mais votado no distrito*) e outra metade adotaria o modelo proporcional de lista aberta para valorizar as legendas. Se o sistema proporcional permanecer, defendo a formação de chapas sem partido num modelo de lista cívica.

Sem base partidária, um parlamentar independente não ficaria fragilizado? Como ele faria para articular suas pautas?  

Não. Não é meu caso na Câmara Municipal e estou sem partido há um bom tempo. Aprovo projetos de lei com urbanidade, participo de comissões e atuo com desenvoltura. Às vezes, as pessoas se esquecem que o Brasil é imenso e que, para começo de conversa, quase todas as câmaras municipais de 5.570 municípios possuem apenas 9 vereadores. Na maioria das vezes, cada um é de um partido político. O excesso de legendas também criou uma fragmentação nas assembleias e no Congresso Nacional. Em vários casos há um parlamentar para cada legenda ou poucos. O que deve unir as pessoas no parlamento não é necessariamente a agremiação partidária, mas a defesa de ideias.

O que a Constituição diz sobre o tema?

A Constituição, ao mesmo tempo que defende o pluralismo de posições, no seu artigo primeiro, afirma, no artigo 14, que a filiação partidária é condição de elegibilidade. Há ainda a adoção do Pacto de San Jose da Costa Rica, que tem valor de emenda constitucional e permite as candidaturas independentes. Por isso, a questão está até no Supremo Tribunal Federal, que convocou audiência pública para discutir a validade das candidaturas independentes.

Como funcionaria a questão de financiamento da candidatura de um político sem partido?

Hoje, a questão do financiamento funciona de duas formas: doações de pessoas físicas e o Fundo Partidário Eleitoral. O fundo, como existe, é um absurdo. Não há critério de distribuição e os donos dos partidos entregam o dinheiro para quem preferem. Isso é fatal para a democracia por criar condições desiguais de disputa. A maioria dos candidatos continua sem recursos e os valores vão em geral para quem já possui mandato. Isso é comprovado por alguns estudos. O candidato sem partido não teria o fundo e contaria com doações de pessoas físicas.

Pela defesa das candidaturas sem partido, já sofreu algum tipo de preconceito ou rejeição na Câmara?

Pelo contrário, quase todos os meus colegas defendem a ideia e adorariam vê-la implementada. A maior parte não gosta de estar no partido em que está e gostaria de exercer o mandato sem partido. Aliás, no âmbito da Câmara Municipal não há a menor lógica partidária. É o caso de quase todos os parlamentos brasileiros. Vivemos uma artificialidade hipócrita e há muitos desavisados que permanecem a defendendo. Em geral, nunca se candidataram e nunca exerceram um mandato. Falam sobre o que não conhecem.

*Explicação do próprio vereador em sua conta no Twitter, no dia 7 de novembro de 2018.