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Em Minas, 153 filhas solteiras receberam mais de R$ 8 milhões em pensões da União

O Edição do Brasil teve acesso à base de dados de pensionistas herdeiros de servidores federais que mostra o tipo de beneficiário, pensão e valor, entre outros detalhes, de cada estado. Os dados obtidos pela agência Fiquem Sabendo, via Lei de Acesso à Informação (LAI), nunca antes divulgados, mostram que a União pagou, em um único mês, mais de R$ 8 milhões em benefícios a um grupo de apenas 153 filhas solteiras e maiores de 21 anos, em Minas Gerais. No total, o governo federal arcou com mais de R$ 4,8 bilhões com pensões a familiares de funcionários públicos federais só nos dois últimos meses de 2019 – sendo que uma única viúva recebeu R$ 573 mil em dezembro.

As pensões contemplam desde viúvas, viúvos e ex-cônjuges divorciados a filhos inválidos*. No ranking dos salários mais altos de filhas solteiras em Minas destaca-se o contracheque de R$ 54.176,64 de uma só pessoa. A mineira está no topo de um seleto grupo de 153 filhas que receberam, em novembro de 2019, pensões acima de R$ 50 mil. Como justificativa para concessão do benefício são citados o Montepio Civil e as leis 3373/58 e 6782/80.

O advogado e professor de direito civil, Bertie Moura, explica que o Montepio foi uma previdência própria do funcionalismo federal criada ainda no séc. XIX. “Ela foi implementada em 1890 para beneficiar servidores do Ministério da Fazenda (atualmente, Ministério da Economia) e seus familiares. O ingresso no Montepio era facultativo e a contribuição era fixada em um trigésimo da remuneração mensal do servidor. Após o falecimento do contribuinte, seus dependentes teriam direito a uma pensão vitalícia igual a metade da remuneração do servidor”.

Em 1991, o Ministério da Fazenda revogou o decreto que regulamentava a concessão do Montepio e, desde então, não se aceita mais adesões. “Mas os beneficiários que entraram no sistema antes da revogação ainda recebem essa pensão”, acrescenta o advogado. Porém, o Montepio ficou em vigor por mais 100 anos e o que, inicialmente, era previsto para uma categoria específica, atraiu outras alas da esfera federal. “Desde a criação originária do benefício, houve mais 9 normas jurídicas que tratam de questões relacionadas a essa previdência, sempre no sentido de elastecê-lo a uma determinada categoria que não estava contemplada na lei anterior. Isso perdurou até o decreto ser revogado. Foi feito uma colcha de retalhos na legislação”, esclarece o advogado e mestre em direito, Jesmar Silva.

Estendeu-se até mesmo para outros estados civis. Além das solteiras, 13 mulheres divorciadas e filhas de servidores do então Ministério da Fazenda, da Saúde, da Agricultura, INSS, Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) são pensionistas. Três delas receberam da União R$ 53.305,72, cada uma, apenas em novembro do ano passado. A soma das pensões de apenas 13 pessoas, em dois meses, foi de R$ 466.659,95.

Na lista, há benefícios vitalícios e temporários. A pensão mais antiga, apesar de ser classificada como temporária, começou a ser paga em 1926, quando a filha de um escriturário da Delegacia Fiscal do Tesouro Nacional da Receita Federal tinha 4 anos. Atualmente, ela aparece na lista como casada e apenas nos últimos dois meses de 2019, aos 98 anos, a beneficiária recebeu R$ 46.318,56 brutos. Uma outra mulher casada, filha de um servidor da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), aparece como pensionista recebendo R$ 24.141,15 no mesmo período.

Na categoria militar, 161 filhas solteiras de ex-militares mineiros do Comando da Aeronáutica recebem pensões do governo federal. Apesar de serem todas classificadas como temporárias, a primeira começou a ser paga em 1957. O valor mais alto pago a uma filha solteira de militar, em novembro, foi de R$ 15.264, 60. O menor valor é de R$ 848,60 pagos para cada uma das quatro filhas de um único ex-militar.

Atualmente, a previdência do funcionalismo federal mudou. “Com base na Constituição de 88, auxílios previdenciários só são devidos àqueles que não têm condições de subsistência. Já que é um absurdo uma filha ou filho maior, que esteja em plenas condições de saúde física e mentais, com possibilidade de trabalhar, receber esse tipo de pensão. Mas, na ocasião, era legal e previsto por lei”, afirma Silva.

No geral, os estados com mais pensionistas são DF (127.748), RJ (56.957), MG (14.473), PE (13.791) e SP (12.541). De acordo com os dados, em Minas Gerais, a pensão mais cara foi de R$ 100.779,47, paga em novembro ao viúvo de uma ex-servidora do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), que ocupava o cargo de técnico do seguro social. No mês seguinte, em dezembro, ele recebeu R$ 8.202, 06.

*Herdeiros menores de idade e filhos inválidos foram excluídos da apuração.