Dados da 10ª edição do Relatório de Situação da Mídia 2019, feito pela empresa norte-americana Cision, apontam que o Brasil é o país onde os jornalistas mais sentem que a liberdade de imprensa tem diminuído. Segundo a análise, 67% dos profissionais brasileiros entrevistados sentiram que tiveram a liberdade na condução de seus trabalhos reduzida. Atrás do Brasil está a França e a Alemanha, ambos com 64%.
O índice é bem acima da média global, que é de 49%. O estudo revela ainda que 65% dos profissionais disseram já ter tido que mudar de tom nas reportagens. Outros 35% se preocupam com sua segurança e a de seus colegas.
Em entrevista ao Edição do Brasil, o vice-presidente da Associação Brasileira da Imprensa (ABI), Cid Benjamin, fala mais sobre o assunto.
A que você atribui essa sensação de liberdade reduzida por parte dos jornalistas brasileiros?
Ao clima de intolerância reinante no país. Quando o presidente da República e alguns porta-vozes mais credenciados, sejam ou não de sua família, fazem ameaças explícitas aos veículos, é natural que haja a sensação de que a liberdade de imprensa está em risco. Quando o presidente afirma ter como modelos de sua preferência regimes ditatoriais e acena com pressão sobre a imprensa por meio da asfixia econômica, cortando diretamente publicidade ou pressionando anunciantes para sufocar veículos cujas linhas editoriais não sejam de seu agrado, é claro que os profissionais da área sentem a sua liberdade ameaçada.
Vivemos um período no qual a liberdade de imprensa brasileira está comprometida?
Sim. Basta ver a hostilidade do presidente da República e de pessoas do seu entorno em relação a veículos de imprensa. Da mesma forma, as ameaças de corte de verbas publicitárias oficiais e a adoção de critérios não objetivos para a sua distribuição ou os acenos a pressões contra anunciantes privados para que não veiculem publicidade em determinados veículos.
Hoje, quais são nossos principais obstáculos?
O monopólio dos meios de comunicação é o primeiro deles, a concentração de renda nas camadas mais ricas da sociedade, que detêm também a propriedade dos veículos de comunicação, além das ameaças advindas de um governo inimigo da liberdade de imprensa.
Qual a importância de uma imprensa livre para democracia?
Não é exagerada a afirmação de que não há democracia real sem uma imprensa livre. Sem liberdade de imprensa, não há informação correta para os cidadãos. E sem uma informação correta, não há possibilidade de exercício real da democracia.
Atrás do Brasil estão França e Alemanha. Há algo em comum na imprensa desses países com a brasileira?
Os três são países capitalistas, mas nem a França, nem a Alemanha têm, no momento, governos inimigos da liberdade de imprensa, como é o caso do Brasil. E, se pensarmos em veículos como rádio e TV, que em todo o mundo funcionam à base de concessões, a diferença é brutal. Em nenhum desses dois países se têm a concentração e os monopólios encontrados no Brasil. Aqui, boa parte das concessões foram dadas por critérios que fogem até mesmo das regras estabelecidas em nossa Constituição.
Há países que são exemplos de imprensa livre?
Numa sociedade capitalista, os veículos de imprensa são também empresas e, como tal, têm interesses de classe. Assim, mesmo que não haja restrições jurídicas ou policiais ao exercício da liberdade, dificilmente será possível pensar numa total liberdade de imprensa pelos trabalhadores, já que a existência de um veículo da grande imprensa pressupõe um robusto capital envolvido.
Há países capitalistas em que existe ampla liberdade de imprensa, mas não se vê neles veículos da grande imprensa com posições editoriais anticapitalistas. Por outro lado, por diferentes razões, como as ameaças imperialistas ou a adoção de doutrinas que não pressupõem ampla liberdade de crítica – nas experiências socialistas nunca houve ampla liberdade de imprensa ou de crítica