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De olho no “mercado da saudade”, empresas mineiras querem globalizar o pão de queijo

Em tempos de polarização extrema, fica difícil apontar uma unanimidade, mas, pelo menos por aqui, em terras mineiras, é fácil arriscar um palpite: o nosso pão de queijo tem o poder de unir todas as tribos e posições políticas em volta de uma mesa. Quando ele está servido – acompanhado de uma xícara de café coado – é sinal de que a conversa vai ser boa. Nas lanchonetes e padarias é possível encontrá-lo a qualquer hora do dia. E, até mesmo na ALMG, a bolinha de queijo virou projeto de lei para que seja declarado patrimônio cultural e imaterial do estado.

Conscientes do potencial da quitanda tipicamente mineira, as fabricantes do estado investem na exportação do produto. De acordo com dados da Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais, a exportação de Minas Gerais para outros países de misturas e pastas para preparados de padaria, pastelaria e indústria de biscoitos, o que inclui o pão de queijo, somaram US$ 7,379 milhões de janeiro a junho, crescimento superior a 37%, em comparação com mesmo período de 2018, quando foram contabilizados US$ 5,374 milhões. Os principais destinos desse produto mineiro no primeiro semestre de 2019 foram os Estados Unidos e Portugal.

O pão de queijo ao lado do feijão, da tapioca, do açaí e tantos outros alimentos característicos do Brasil fazem parte do chamado “mercado da saudade”. O segmento, como explica a analista de Negócios Internacionais da Fecomércio MG, Juliana Peixoto, é responsável por exportar produtos e serviços nacionais. Apesar de ser pensado, principalmente, para os brasileiros que moram no exterior, empresários viram uma outra oportunidade de negócio. “Também serve como porta de entrada para os mercados internacionais, fazendo com que a população nativa passe a experimentar e consumir os produtos brasileiros e conhecer a nossa cultura”, diz.

De acordo com a analista, além de alimentos, vestuário e outros bens de consumo, os empreendimentos englobam também serviços como salões de beleza e academias de musculação, de dança e de capoeira. “Minas Gerais, famosa em sua gastronomia, tem atuado nesse mercado com a exportação de produtos tradicionais como café, doce de leite e o famoso pão de queijo”, explica Juliana.

Fundada na cidade João Pinheiro, a Forno de Minas começou quando Maria Dalva Mendonça queria trilhar um caminho diferente da maioria das garotas da sua idade naquela época, que planejavam casar e ter filhos. Já em 1990, Dalva optou por fazer pães de queijo para vender e fundou a empresa. Quase três décadas depois, sua receita ganhou o mundo. A empresa tem um plano para globalizar seu pão de queijo e segue avançando. Neste mês, México e Argentina receberam 32 toneladas de produtos. “Atualmente, a Forno produz 1.700 toneladas de pão de queijo por mês. O que equivale a 68 milhões de bolinhas. 7% dessa produção é exportada”, afirma Gabriela Cioba, gerente de Comércio Exterior da empresa.

A companhia exporta para 18 países. “Somos líder no mercado nacional de pão de queijo, com 39,2% de share de valor, segundo a Nielsen. Em relação ao mercado internacional, as exportações correspondem a 7% do faturamento da companhia. Nosso foco principal segue sendo nosso maior e primeiro mercado, EUA. Além disso, estamos buscando crescimento na América Latina e novas soluções para Europa”, diz Gabriela. E não para por aí, a meta é triplicar a receita de exportação até 2024.

Outra gigante do segmento, a Maricota Alimentos, que foi fundada e mantém sua fábrica em Luz, na região Central de Minas, não divulga dados, mas garante em seu site que é a maior produtora de pães de queijo do mundo e vende o alimento congelado para mais de 15 países. Entre eles, Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Botswana, Chile, Uruguai, Angola, Arábia Saudita e Coreia do Sul.

Juliana explica que as empresas que pretendem internacionalizar os seus produtos e/ou serviços devem se preparar para um mercado de concorrência acirrada, que requer um alto controle de qualidade. “Principalmente no setor alimentício, cada país tem sua legislação específica e o empresário deve garantir que as regras sejam respeitadas, adequando seus processos de criação e produção, para que o empreendimento tenha todas as licenças necessárias para estar em pleno funcionamento”.

Ainda que obedeçam aos critérios de qualidade, o exportador pode se deparar com outra barreira: alguns países, visando proteger mercados sensíveis de seus importadores, restringem detalhadamente a entrada de produtos de origem animal. “Um exemplo disso é o embargo ao pão de queijo em alguns países da Europa. Segundo estudo da Confederação Nacional das Indústrias (CNI), divulgado em 2018, a proibição vem da legislação que impede a importação de produtos com mais de 50% de derivados de leite. No entanto, o pão de queijo tem apenas 20% de lácteos na composição e deveria, segundo a CNI, ser liberado”, acrescenta Juliana.

Para além das burocracias, Gabriela conta que o desafio tem sido fazer com que o estrangeiro prove a delícia. “Muitos países não têm o hábito de consumo de pão de queijo assado ou congelado. Assim, precisamos gerar experimentação para o sucesso do produto. Temos tido uma ótima experiência. O pão de queijo fica a uma mordida de conquistar”. Alguém duvida do potencial do nosso patrimônio gastronômico?