Na hora de salvar uma vida, qualquer minuto conta. Por isso, o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) trabalha para responder às solicitações da população o mais rápido possível. Mas, uma parte considerável das ligações atendidas pelo serviço são trotes que podem trazer severas consequências para o pronto atendimento de pacientes que realmente necessitam do socorro.
Estima-se que em 2018 foram registrados 390.218 trotes. De janeiro a abril deste ano, 12,64% das ligações foram trotes ante a 13,66% no mesmo período de 2018. Mesmo com o número diminuindo, os índices seguem preocupando os profissionais da área.
O Edição do Brasil conversou com Jovane Ernesto Constantini, secretário executivo do Consórcio Intermunicipal da Macro Região do Sul de Minas (Cissul Samu), responsável pelos dados e por criar ações de conscientização acerca do tema.
Quais as consequências dos trotes para o atendimento do Samu?
Pode custar uma vida e isso é muito sério. Às vezes, a pessoa liga, passa o trote e nós acionamos uma ambulância para o resgate, a viatura chega no local e não tem ninguém lá. Nesse tempo, podemos receber uma solicitação verdadeira e não conseguirmos disponibilizar o socorro em tempo hábil. O paciente pode morrer e a resposta rápida é essencial.
O autor pode ser punido por esse comportamento?
Sim. O Samu é 100% gravado e binado, ou seja, nós conseguimos acesso ao número que passa o trote. Temos, inclusive, levado informações à Polícia Civil para que haja uma investigação e medidas cabíveis sejam tomadas. Às vezes, o mesmo número liga 5 vezes e o autor pode ser punido visto que trote é crime.
As ligações caem numa central ou há algum filtro para esses trotes?
Ao ser atendida a pessoa passa por um profissional de regulação médica, que é capacitado e requalificado todo ano. Ele tem um filtro para perceber se é ou não um trote. Dependendo do caso, passa para o médico do atendimento que pode, por meio de perguntas, descobrir se é uma solicitação verdadeira. Na maioria das vezes conseguimos perceber o trote, mas têm pessoas que são muito convincentes.
Os dados provam que, devido às ações desempenhadas e a divulgação do tema, o número está diminuindo. Este ano, o primeiro quadrimestre ficou em 12,64%. Contudo, ainda é um índice alto.
A população criou o hábito de passar trote para o Samu?
Sim. Isso porque existe uma cultura, de parte das pessoas, em acreditar que o serviço público é uma brincadeira. É triste reconhecer isso, mas existe quem acredite que é bonito passar trote e, também, quem não meça as consequências desse tipo de ação.
Por que você acredita que as pessoas fazem isso?
Às vezes por influência ou por não entender a dimensão da gravidade que isso tem. Acredito que o principal motivo é a falta de educação, por isso estamos com propostas de conscientização nas redes sociais e nas escolas e conversando com as crianças.
Afinal, as crianças são quem mais passam os trotes?
Não necessariamente. Nós ainda não temos como saber a idade de quem faz a ligação. Decidimos trabalhar com as crianças porque entendemos que a principal arma é a educação, além disso, elas são ótimas para multiplicar uma determinada ideia.
Como esse trabalho tem sido feito?
Por meio do projeto “Samuzinho na Escola”. Além de conhecer mais sobre o Samu as crianças aprendem primeiros socorros também, como massagem cardíaca e a desengasgar uma pessoa. Nós visamos mostrar como o atendimento de resgate é importante a fim de que elas cresçam com essa consciência. Além disso, fazemos a divulgação dessa questão nas redes sociais e mandamos um material gráfico para várias cidades que divulgam, principalmente, nas unidades de saúde.
O que falta para que a população entenda a gravidade de passar um trote para o Samu?
Hoje se fala muito em direitos e se esquece dos deveres. De fato, o poder público tem que garantir os direitos de cada cidadão, mas a população tem o dever de usar o serviço público de maneira correta e coerente. É preciso o entendimento que, hoje você passa o trote e amanhã, quando um amigo ou familiar precisar do serviço, ele corre o risco de não chegar por causa desse tipo de atitude. Falta a empatia de lembrarmos que o outro pode precisar do socorro. Cobrar direitos é essencial, mas exercer os deveres, é fundamental.