Aceitar o calendário do futebol brasileiro não é tarefa fácil. Jornalistas e especialistas tentam desvendar este mistério, mas entra ano, sai ano, tudo permanece inalterado. Nosso calendário esportivo é um monstro difícil de ser domado.
Tudo começa com os estaduais. Contestado por muitos, defendido com unhas e dentes pelas federações e times menores. Fonte única de receita para vários times do interior, vem ao longo dos anos distribuído cotas polpudas para os grandes.
Normalmente ocupa o primeiro trimestre de cada ano. O drama é que os clubes menores montam seus elencos focados nesta disputa. Quando não conseguem arrumar vaga para outras competições simplesmente param de funcionar.
Os times maiores e mais fortes seguem numa ciranda impressionante. Tem o Brasileiro das series A e B, Copa do Brasil, Copa Sul-Americana e Libertadores. Tudo ao mesmo tempo. Tudo misturado.
Só para disputar o Brasileiro é preciso realizar 38 jogos e 19 viagens pelo Brasil. Jogos aos domingos e muitas vezes em outros dias da semana. Aí tem os jogos das outras competições nacionais e internacionais com mais viagens e enfretamentos em dias e horários estranhos. Os jogadores passam mais tempo viajando do que treinando ou jogando.
O calendário é tão maluco que parece feito para punir o time mais forte, aquele que consegue mais vitórias soma mais pontos. Quanto melhor a situação na tabela mais viagens e jogos.
Um time bom, vencedor, costuma decidir em curto prazo de tempo, o Brasileiro, a Copa do Brasil e a Libertadores. Mais do que uma aventura, uma loucura. O resultado deste calendário maluco é que nem sempre o melhor consegue chegar ao título. Perde no desgaste físico, nas contusões ou suspensões dos seus jogadores.
Na Copa Libertadores os times dos outros países levam sempre grande vantagem, justamente porque viajam e jogam bem menos. Assim podem se preparar melhor tanto fisicamente, como tecnicamente. O reflexo deste calendário maluco está bem nítido dentro de campo. Os times brasileiros estão piorando a cada ano. Os jogadores são fracos nos principais fundamentos e no coletivo deixam muito a desejar.
Sem tempo para treinamentos, aprimoramento das virtudes ou recuperação das contusões ou desgastes, a impressão é que os atletas se reúnem na porta do estádio, pegam o uniforme e entram no gramado. Como o custo para manter elencos enormes é cada vez mais alto e a receita cada vez mais exprimida, a saída é promover muitos jogos, participar de várias competições, priorizando a quantidade no lugar da qualidade.
Não vejo em curto ou médio prazo qualquer possibilidade de racionalização do calendário do nosso futebol. É uma questão mais econômica do que esportiva. Pode ser que daqui alguns anos, com a situação do Brasil melhorando, os próprios dirigentes encontrem uma fórmula, no mínimo, menos desgastante para os atletas e torcedores. Por enquanto, por falta de coisa melhor, nos resta conviver com esta overdose de futebol.
O perigo é que este calendário maluco faça o futebol brasileiro ir perdendo seu brilho e magia a cada ano, correndo o risco de ir tomando distância dos torcedores, principalmente os mais jovens.
*Presidente da Associação Mineira de Cronistas Esportivos (AMCE) – amce@amce.org.br