Um levantamento feito pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), apontou que 37 crianças e adolescentes, com idades de 0 a 19 anos, sofrem os efeitos da intoxicação pela exposição inadequada à medicamentos. De acordo com dados do Sistema Nacional de Informações Toxico-Farmacológicas (Sinitox), nos últimos 18 anos, foram mais de 245 mil casos de intoxicação atingindo essa faixa etária, com o registro de 240 mortes.
Os riscos de intoxicação são maiores nas crianças entre 1 e 4 anos. Estima-se que 130 mil ocorrências acometeram esse grupo. O segundo mais atingido são pessoas de 14 a 19 anos, com 42.614 casos, seguido dos de 5 a 9 anos, 32.668 e de 10 e 14 anos, 24.282.
Segundo o pediatra e membro do Departamento de Toxicologia e Saúde Ambiental da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Anthony Wong, a maioria das causas de intoxicação na infância são provenientes de acidentes. Ele aponta que existe também uma negligência e omissão dos pais. “Largam remédios e produtos de limpeza em qualquer lugar achando que a criança não vai tomar. Além disso, é grande a quantidade de remédio disponível no mercado. Se a pessoa deve tomar um antibiótico, precisa de 10 comprimidos, mas na caixa vem 14. Ela não descarta a sobra e acaba armazenando, passando a ter um estoque em casa”.
Wong acrescenta que esses medicamentos, muitas vezes, são coloridos, cheirosos e saborosos. “Isso aguça a curiosidade infantil. A criança pode experimentar pelo fato de ser atrativo ou, até mesmo, confundir com bala, doce ou outra guloseima”.
Outro ponto é a automedicação. “Os pais acham que podem dar qualquer remédio para os filhos e essa prática é perigosa. A dose para crianças é diferente da de adultos, além disso, certos remédios não são feitos para o organismo infantil. Como se não bastasse, o sistema de excreção e eliminação desses medicamentos tem velocidade diferente entre adulto e criança”.
Por fim, o especialista diz que outro problema é o fato dos pais tentarem convencer a criança de que o remédio tem um sabor gostoso. “Convencem a criança de que é docinho para que ela aceite a medicação quando passa mal, só que ela acaba tomando escondido achando que está fazendo um favor aos pais”.
Consequências
Em alguns casos, a criança toma uma dose menos tóxica do remédio, mas, em outros, pode ser até fatal. “Às vezes, a criança sente o gosto ruim, cospe e acaba não ingerindo muita coisa. Porém, quando a quantidade ingerida é grande pode ocorrer envenenamento, provocando sintomas graves, como alterações no ritmo do coração, coma, parada cardiorrespiratória, queda da respiração sanguínea, inclusive por choque e sonolência profunda”.
Foi assim que a vendedora Luciana Guerra reparou que algo estava errado com João Victor, seu filho de 4 anos. “Notei que ele estava suando frio e um pouco pálido. Cheguei a pensar que poderia ser uma gripe, mas de repente ele desfaleceu no meu colo. Fui pegar a minha bolsa e vi que ela estava revirada. Só assim, percebi que João tinha ingerido um comprimido de Diazepam que, normalmente, produz um efeito de sonolência. “Fiquei com muito medo, porque sei que é uma medicação forte. Corremos para o médico e foi feito uma lavagem intestinal, depois ele adormeceu e ficou em observação por algumas horas”.
Após o ocorrido, ela redobrou os cuidados. “Me senti culpada, porque ele pegou o remédio na minha bolsa que estava no chão. Agora coloco tudo numa caixinha trancada na parte mais alta do guarda-roupas”.
O melhor passo é a prevenção. “Os pais devem ter na cabeça que as crianças são mais exploradoras, curiosas e inocentes. Elas podem, de fato, se confundir. O melhor é deixar tudo longe do alcance e ficar sempre de olho”, conclui Wong.