O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) divulgou que 3.190 trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão no Brasil em 2023, sendo o maior número dos últimos 14 anos. Ao longo dos 12 meses anteriores, foram fiscalizados 598 estabelecimentos urbanos e rurais. De acordo com o MTE, além dos resgates, essas ações também possibilitaram o pagamento de mais de R$ 12,8 milhões em verbas salariais e rescisórias. Em 2022, foram 2.587 trabalhadores resgatados pela fiscalização, em 531 ações realizadas, com pagamento de R$ 10,4 milhões em indenizações trabalhistas.
O maior número de ações e resgates em 2023 foi realizado na região Sudeste, com 1.153 resgatados, seguida do Centro-Oeste (820) e Nordeste (552). Já entre os estados, Goiás, Minas Gerais e São Paulo foram os que tiveram mais trabalhadores resgatados, com 739, 651 e 392 respectivamente.
Segundo o advogado trabalhista, João Castro, o trabalho análogo à escravidão é definido pela submissão do indivíduo a trabalhos forçados, jornadas excessivas, sem intervalo para refeições, sem descanso, em ambientes que contenham condições degradantes e sem estrutura necessária. “Além disso, acrescenta-se descaso com a saúde e integridade física e psíquica do trabalhador, quando não há remuneração pelos serviços prestados, ou seja, quando todos os direitos trabalhistas estão sendo descumpridos”.
Na avaliação de Castro, existem muitos aliciamentos e acordos de melhoria de vida que fazem com que os casos sejam tão altos. “Motivos como extrema pobreza ou, até mesmo, falta de conhecimento da legislação trabalhista ou ainda de ter alguém que os ampare faz com que a gente ainda tenha no país um índice alto de trabalho análogo à escravidão. Não resta dúvida que a maior concentração do trabalho escravo ocorre na zona rural, por meio de plantação de milho, café, criação de gado, garimpo ilegal, exploração de madeira, entre outros. Entretanto, na zona urbana também há várias ocorrências que, inclusive, já saíram na mídia, de trabalhadores domésticos que não tinham seus direitos cumpridos”.
Ele afirma que uma das possíveis soluções para a diminuição de casos seria dar dignidade às pessoas. “Um indivíduo que tem o mínimo em moradia, alimentação e educação e que possui o básico de conhecimento de seus direitos trabalhistas será uma vítima mais difícil de cair nessa cilada do trabalho análogo à escravidão. Com um maior investimento do governo nessas áreas e também melhor fiscalização do Ministério Público do Trabalho, poderíamos reduzir bastante os casos”.
Um levantamento do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) aponta que 2023 teve também o maior número de denúncias de trabalho escravo e análogo à escravidão no Brasil. Segundo a pasta, foram 3.422 denúncias protocoladas em 12 meses (61% a mais que em 2022, e o maior número desde que o Disque 100 foi criado, em 2011). Denúncias desse tipo corresponderam a 19% do total de violações de direitos humanos informadas ao serviço. Ou seja, em cada cinco denúncias protocoladas em 2023, uma era de trabalho análogo à escravidão.
O advogado lembra que as denúncias de trabalho escravo são centralizadas no Sistema Ipê, uma plataforma digital criada pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) do Ministério do Trabalho e Previdência. “A partir dessa ferramenta, qualquer pessoa pode registrar denúncias de maneira anônima, com praticidade e segurança. É importante que no registro da denúncia sejam fornecidas o máximo de informações possíveis, como o nome do estabelecimento, a quantidade de trabalhadores no local, as condições em que esses trabalhadores se encontram, as atividades que eles exercem, entre outras. Já o Disque 100 é voltado a quaisquer violações dos direitos humanos e gerido pelo MDHC”.