A economia do cuidado desempenha um papel crucial na sociedade, abrangendo uma variedade de tarefas domésticas e esforços voltados para dependentes, como crianças, idosos, doentes e pessoas com deficiência. Mas existe um fator de discriminação neste setor: 65% do trabalho é feito por mulheres. Se fosse computado, esse esforço acrescentaria ao menos 8,5% ao Produto Interno Bruto (PIB) do país, segundo pesquisadores do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre). No total, incluindo as tarefas executadas por homens, a economia do cuidado representa 13% do PIB.
Pesquisas mais antigas usaram como base a quantidade de horas dedicadas a tarefas domésticas declarada na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) por homens e mulheres. À época, essa quantidade de horas foi multiplicada pelo rendimento médio das trabalhadoras domésticas. A conclusão é que o tempo gasto com os cuidados com o lar e a família correspondeu a 11,2% do PIB, em média, entre os anos de 2001 e 2005.
Em outubro deste ano, ao atualizarem o estudo, considerando os dados da Pnad Contínua entre 2016 e 2022, chegou-se à cifra de ao menos 13% do PIB brasileiro, em média, se o trabalho com a casa e a família fosse remunerado. O valor é considerado subestimado porque, nos cálculos, os pesquisadores multiplicaram as horas gastas no trabalho invisível pela remuneração do trabalho doméstico, uma das mais baixas do país. As mulheres dedicam, em média, 21,3 horas por semana à economia do cuidado. Os homens gastam 11,1 horas.
Outras profissões de cuidado com pessoas, como professores, babás e cuidadores têm remuneração mais alta que a dos trabalhadores domésticos, o que elevaria o valor do trabalho invisível e, portanto, a porcentagem do PIB que ele representa. A alta de 11,2% para 13% do PIB entre os dois períodos, segundo os pesquisadores, se deve ao aumento da remuneração das domésticas.
“Não se trata, obviamente, de propor uma remuneração à mãe, à filha, irmã ou qualquer mulher na família que desempenhe a tarefa de cuidados com o lar e com as pessoas que nele vivem, mas de apontar que o trabalho delas é tão relevante que representa um percentual importante para a economia do país. É tempo dedicado aos outros, que precisa ser melhor compartilhado com os demais integrantes da família”, diz o economista Claudio Considera.
De acordo com o estudo, mulheres sem instrução ou com o ensino fundamental incompleto dedicam 23,3 horas por semana à economia do cuidado, contra 18 horas das que têm a formação superior completa.
A economista Marcela Andrade diz que à medida que a mulher melhora o seu nível de instrução, o tempo dedicado aos trabalhos domésticos e aos cuidados com a família diminui. “Na maioria dos casos, as mulheres que possuem mais formação também ganham mais e podem terceirizar esse serviço. Se ela tiver um trabalho fora, não terá sempre a mesma disponibilidade de horários que um funcionário homem, por exemplo, e ela será cobrada tanto no emprego quanto em casa. Além disso, a desigualdade não está apenas nas horas dedicadas ao cuidado da casa entre os homens e as mulheres, ela está também nos salários. No Brasil, o rendimento dos homens é 26,8% maior do que o das mulheres, em média”.
Magna Andrade, que é professora, mãe e esposa, conta que esse trabalho quase sempre acaba caindo nas costas das mulheres por conta do machismo na sociedade. “A mulher fica sobrecarregada e pode acabar perdendo chances de ascender na carreira ou até mesmo de ter uma carreira. O Estado deveria auxiliar e prover mais alternativas para que esses cuidados não fiquem 100% por conta das mulheres como creches e escolas em período integral, assim como asilos públicos. Assim elas teriam mais tempo para si e para se dedicarem ao que desejam seguir”.