A médica mineira Maria da Consolação Vieira Moreira figura na lista dos cientistas mais produtivos e influentes da América Latina. Ela é cardiologista do Hospital Felício Rocho e pesquisadora pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O título é do relatório AD Scientific Index 2021, que avalia a relevância de cada profissional da ciência. A análise é feita por meio da combinação de diferentes índices e bancos de dados que calculam o desempenho de produção dos cientistas e o impacto de seus estudos nos respectivos campos de pesquisa.
Maria da Consolação possui uma rica trajetória na medicina. Ao Edição do Brasil, ela fala mais sobre sua carreira e os trabalhos que, para ela, foram mais desafiadores. “Durante meu trabalho de tese de doutorado nos Estados Unidos, princípio da década de 90, desenvolvi estudos pioneiros na área de citocinas. Estes estudos foram muito utilizados e citados nas publicações atuais sobre a COVID-19”
Como você avalia a sua trajetória na medicina até aqui?
Me formei na Faculdade de Medicina da UFMG, em 1980, em uma turma de 160 médicos, com 49 mulheres, o que representava cerca de 30% da classe. Somente eu fiz a opção pela cardiologia, que era uma especialidade médica pouco procurada pelas mulheres. Eu já era casada e mãe de dois filhos. Decidi fazer a residência na Universidade de São Paulo (USP) e depois fui estudar fora do Brasil.
Desde então, segui carreira docente, sou professora de medicina há 36 anos. Ingressei na Faculdade de Medicina da UFMG por concurso público, em 1985. Iniciei minha carreira como docente auxiliar de ensino e cheguei à professora titular. Ou seja, há décadas venho enfrentando a difícil tarefa de exercer ensino, assistência médica, principalmente, na área de transplante de coração, pesquisa, administração e participação nas Sociedades de Cardiologia. Enfrentei dificuldades de toda natureza.
Considero ter contribuído para o fort.alecimento da minha Instituição e para a formação de muitos alunos que deverão multiplicar os conhecimentos. Valeu a pena, tenho o privilégio de ter o reconhecimento de meus pares, no Brasil e no Exterior, dos meus alunos, orientandos e dos meus pacientes
De todas as suas pesquisas, qual você tem mais orgulho e por quê?
Construí com muita dedicação o Programa de Transplante de Coração que, além do grande alcance social, é um Centro de Excelência no nosso País. Além desse, durante meu trabalho de tese de doutorado nos Estados Unidos, no princípio da década de 90, desenvolvi estudos pioneiros na área de citocinas. Esses trabalhos foram muito utilizados e citados nas publicações atuais sobre a COVID-19. São pesquisas que ajudaram um pouco na compreensão dessa nova doença.
Como você recebeu a notícia sobre o relatório da AD Scientific 2021?
Ter meu trabalho reconhecido por uma instituição tão renomada como a AD Scientific é uma honra e uma vitória. Não só para mim, mas para tantas pessoas que, de alguma forma, se envolveram com minha pesquisa e contribuíram em virtude do desenvolvimento da ciência médica e da cardiologia. Me sinto honrada e feliz por perceber a valorização de tanto empenho coletivo.
Estamos em um período onde a ciência tem sido desrespeitada constantemente no nosso país. Como tem sido ser pesquisadora nessa realidade?
Fazer pesquisa nunca foi fácil. Estamos vivendo uma crise sem precedentes, que atingiu todos os setores, inclusive as cadeias produtivas da ciência. Mesmo assim, continuamos em frente fazendo o que é possível. Quando tudo passar, teremos que enfrentar o pós-Covid. Porém, não sabemos como será a medicina, a pesquisa e o mundo quando chegar esse momento.
Dados apontam que as mulheres ainda são minoria na ciência. O que pode ser feito para mudar essa realidade?
A pergunta é complexa e não tem uma resposta simples. Já está havendo mudanças. Hoje, cerca da metade dos alunos de Medicina são mulheres. Segundo os dados do nosso Conselho Federal de Medicina e da Sociedade Brasileira de Cardiologia, 30% dos cardiologistas no Brasil são mulheres. Na pesquisa, as mudanças têm sido mais lentas. Ou seja, ainda precisa de muita luta e resiliência. É preciso mais incentivo, treinamentos, oportunidades, presença de mestres inspiradores para que um número maior de jovens mulheres ingresse na pesquisa.
Qual sua mensagem para estudantes e futuros pesquisadores?
Descubram a sua vocação científica. A pesquisa é um extraordinário desafio, mas que precisa ser encarado com os meios que estão ao nosso alcance. Ainda há uma grande luta pela frente que deve ser enfrentada por jovens que irão continuar.