Um estudo da Inteligência em Pesquisa e Consultoria (Ipec), realizada a pedido da Pfizer, acende um alerta em relação à saúde das brasileiras: quase metade delas (47%) continua com os exames de prevenção ao câncer de mama atrasados. Apesar de o índice ainda estar alto, essa taxa já foi de 62% durante a pandemia no ano passado.
Outra análise que ajuda a visualizar o cenário de apagão de diagnósticos no país é a do Conselho Federal de Medicina (CFM). De acordo com o levantamento da entidade, houve queda de 27 milhões de exames, cirurgias e outros procedimentos eletivos no Sistema Único de Saúde (SUS) desde março de 2020. Ao comparar o volume de atendimentos médicos registrados no Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA-SUS), entre março e dezembro do ano passado e comparado com o mesmo período de 2019, o CFM constatou a redução de 16 milhões de exames com finalidade diagnóstica, 8 milhões de procedimentos clínicos, 1,2 milhão de pequenas cirurgias e 210 mil transplantes de órgãos, tecidos e células.
“A pandemia da COVID-19, por causa do distanciamento social e do medo do vírus, fez com que houvesse uma redução na procura de consultas médicas e também na realização de mamografias em 50%, de um modo geral. Houve também uma redução em 39% no número de biópsias”, preocupa-se a mastologista e presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), Annamaria Massahud.
Diagnosticar qualquer doença na fase inicial costuma ser um fator determinante para a cura, mas, sobretudo, no caso do câncer de mama, o segundo tipo mais comum da enfermidade no país e a principal causa de morte de mulheres. “A possibilidade de cura pode chegar aos 90% desde que a detecção e o tratamento sejam feitos precocemente. Porém, as realidades são diversas. Normalmente, 70% dos casos tratados em planos de saúde são identificados no início. Já cerca de 60% das pacientes do SUS recebem o diagnóstico na fase final. A população do SUS representa 70% dos atendimentos no Brasil. Por isso, o índice de morte anual é ainda crescente”, esclarece Thadeu Provenza, porta-voz da Associação de Prevenção do Câncer na Mulher (Asprecam), que lidera o Movimento Mamamiga pela Vida.
Acostumada a manter seus exames em dia, a empreendedora Juliana Armond, 53, pulou a realização da mamografia em 2018. Foi o suficiente para o diagnóstico de câncer de mama em fevereiro de 2019. “O exame acusou uma calcificação e os médicos pediram para retornar em 6 meses para acompanhar. Como a minha irmã havia sido diagnosticada 3 meses antes, resolvi prosseguir com a biópsia. Optei por mastectomia bilateral preventiva e quimioterapia oral por 5 anos”, conta.
Morando nos Estados Unidos, a empresária fundou o grupo “Elo Feminino – Networking de Brasileiras pelo Mundo” e lidera o projeto Empower Mulher, que incentiva mulheres pós-câncer de mama a empreenderem e aumentarem sua renda. “A ficha caiu só depois e ainda continua caindo. O exame é crucial. Um ano que eu pulei, desenvolvi o câncer. Precisamos ser advocatícias da nossa saúde e, mesmo perante um diagnóstico obscuro, devemos seguir com esclarecimento por conta própria”, defende.
No caso de Vanete Rodrigues, 59, o rastreamento anual é uma conduta permanente na família. “Do lado materno, temos uma sensibilidade para o câncer, não necessariamente de mama. Praticamente todas as minhas tias morreram de alguma forma da doença e a minha mãe faleceu devido a um câncer de períneo, ela sempre reforçava a importância de fazer os exames anualmente. Em 2012, tive câncer de mama, aos 49 anos, do tipo 1, detectado bem no início. Acredito que pela prevenção que sempre fiz”, relembra a aposentada que retirou a mama direita e está no nono ano do tratamento de uma década de quimioterapia oral.
Para ela, é preciso que as mulheres cuidem de si como costumam zelar pelos outros. “Se você tem um filho, marido, pais ou até mesmo um animalzinho de estimação, você cuida deles. Se algum deles necessitar de uma cirurgia, você vai precisar tomar uma decisão. Que você faça isso A empreendedora Juliana Armond desenvolveu a doença durante o ano que pulou a mamografia Manter rotina de rastreamento foi essencial para cura da aposentada Vanete Rodrigues por amor-próprio, ninguém pode tratar melhor de você, do que você mesma. Por que não ir ao médico para saber se está bem antes de sinais? Entendo que pode haver medo, mas a mulher tem capacidade de vencê-lo. Na minha experiência, enxergo o câncer como algo que fez parte do meu curso da vida e sou grata pelo que passei porque tudo aquilo me fez pensar melhor e refletir meus valores e o sentido de viver”, celebra.