O sonho de dirigir já não parece uma prioridade para o mineiro. Levantamento exclusivo do Departamento de Trânsito de Minas Gerais (Detran- -MG) ao Edição do Brasil mostra que a emissão da primeira habilitação caiu 54% nos últimos 8 anos no estado.
Os dados mostram que, em 2013, 295.669 pessoas foram aprovadas no exame de prática da Polícia Civil de Minas Gerais e foram licenciadas a dirigir. Esse índice caiu gradativamente todos os anos até alcançar o menor número em agosto de 2021, quando apenas 135.778 tinham tirado sua Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
O declínio não surpreende Alessandro Dias, presidente do Sindicato dos Proprietários de Centros de Formação de Condutores de Minas Gerais (Siprocfc-MG). “Esta queda já é observada desde 2015, porém, em 2016, de fato, o impacto foi maior”, diz. Segundo os dados disponibilizados pelo Detran-MG, a baixa entre os anos mencionados por Dias foi de 13,9%.
Uma pesquisa da Junior Mackenzie Consultoria, feita a pedido da empresa de cartões Alelo, já mostrava que, em 2018, 53,4% dos jovens brasileiros entre 18 e 22 anos não tiraram a CNH. Na ocasião, 41,1% responderam que não tinham interesse/necessidade de dirigir, enquanto 38,2% disse não ter a carteira de motorista por falta de dinheiro. Ainda de acordo com o estudo, 58% dos que não tiraram a habilitação disseram ter interesse pela carteira no futuro, sendo o custo, novamente citado como principal razão de impedimento.
Para o presidente da categoria, há vários fatores que explicam a diminuição do número de motoristas. “O cenário econômico, que reduziu o poder de compra das pessoas é um deles. A chegada dos aplicativos de transporte, que acabam gerando uma maior facilidade de deslocamento a um custo mais acessível também. E, de fato, o desinteresse efetivo dos jovens, que representam a maior parcela de alunos das empresas. O sonho de ter a habilitação tem sido adiado, mas o interesse ainda permanece, ele só não tem sido uma prioridade mais”, avalia.
Trabalhando como estagiário de design gráfico, Mateus Rocha, 19, precisou adiar o sonho do carro próprio. “Em minha opinião, seria um gasto que pesaria no bolso em um momento que não posso. E um pouco desnecessário, porque eu não tenho carro na família e não conseguiria comprar um agora. Mas tenho planos de ter o meu no futuro. A pior coisa é ficar esperando horas no ponto e ainda entrar num ônibus lotado, especialmente na pandemia”, conta. Em média, o processo para adquirir habilitação na categoria B, que autoriza dirigir automóveis, é de R$ 2 mil.
Mas não são apenas os jovens que têm se afastado dos automóveis. “Eu acho um absurdo as despesas para manter um carro. Quando eu e meu marido colocamos na ponta da caneta, os gastos com gasolina, impostos, seguro, manutenção e estacionamentos estavam comendo nosso orçamento, enquanto as condições da economia só pioravam. Quando perdi meu emprego, em 2019, resolvemos vender nosso carro, o que também foi um prejuízo porque, diferente de outros bens, ele só desvaloriza com o tempo”, relata a administradora de condomínios, Vanessa Massarani.
Desde então, Vanessa afirma não sentir falta do veículo. “Lembro que, na época, o preço da gasolina estava em torno de R$ 4,40. E olha quanto está agora! É claro que tem um lado negativo, por exemplo, na hora de viajar. Mas, acabamos experimentando alugar um carro para isso e deu supercerto. Já para circular na cidade, não há dúvida que nossos custos diminuíram bastante”, diz.
Apesar dos centros de formadores de condutores já sentirem o impacto do desinteresse por dirigir, Dias acredita na recuperação. “2020 foi um ano que, dentro das nossas projeções, teríamos uma estagnação ante as quedas de quase 40% entre 2014 e 2019. As mudanças anunciadas pelo governo federal, com a flexibilização de algumas regras, geraram esta expectativa, mas surgiu a pandemia e as autoescolas do estado e do país ficaram fechadas por meses. Agora, 2021 tem sido um período de grandes perspectivas de recuperação. Se continuarmos no mesmo ritmo poderemos, pelo menos, voltar ao patamar de 2019. Não é o melhor cenário, mas ameniza um pouco os impactos”.
Ele acredita ainda que, para mudar estes números, de forma mais efetiva, é preciso ter o interesse pela CNH reaquecido. “Isso se mostrou extremamente importante na pandemia, seja pela necessidade de se buscar uma fonte de renda, como tem sido atualmente com os serviços de entregas e aplicativos, seja pela segurança e saúde, já que os transportes públicos ficaram ainda mais precarizados neste cenário”.