Na última semana, o Edição do Brasil deu início a série #LeiteDeMãe, que visa abordar sobre o aleitamento materno. Durante a campanha Agosto Dourado, muito se fala sobre a importância de se amamentar, porém, algumas mães não conseguem passar por esse processo. Uma pesquisa feita pela Famivita aponta que 31% das brasileiras não atingem o objetivo de amamentar seus filhos exclusivamente com leite materno por 6 meses – período indicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Uma delas é a contadora Eleuza Santos. João, seu filho, nasceu prematuro e, por isso, precisou ficar internado por 50 dias. Ela recorda que notou sua baixa produção logo no hospital. “Não saía a quantidade prescrita para a dieta dele. Lembro-me de ficar espremendo meu peito, tentando tirar, mas só vinha o que as enfermeiras chamavam de ‘gotinhas de amor’”.
Essa impossibilidade deixou Eleuza abalada. “Eu sabia que a amamentação era o melhor para o meu filho, ainda mais por ele ser prematuro. No hospital, não medi esforços para tentar ajudá-lo. Ele foi alimentado com leite doado, até mesmo o colostro – leite mais concentrado que é produzido no início da amamentação e ideal para recém-nascidos -. Mas achei que seria algo transitório, quando percebi que não era, fiquei muito triste. Chorava bastante e passei por situações que só eu e Deus sabemos”.
Após João receber alta, a contadora foi orientada a suplementar o leite materno. “Para ele foi tranquilo, eu que não queria aceitar. Mas confiei em Deus e fui vivendo um dia de cada vez. E, para as mamães que estão passando pelo mesmo que eu passei, digo uma coisa: se não conseguirem amamentar, bola para frente, pois mãe de prematuro têm muitas lutas para enfrentar, além disso, não amamentar, não nos torna menos mães, porque dá para compensar com muitos beijos e carinhos nos nossos bebês”.
Esse afeto, segundo a psicóloga Alessandra Augusto, é essencial para que o vínculo afetivo seja criado, mesmo sem a amamentação. “Fisiologicamente, a mãe é capaz de suprir todas as necessidades de uma criança, mas, em alguns casos, infelizmente, ela não consegue. Atualmente, porém, existem bancos de leite e até suplementos para o bebê. Na hora de amamentar com essas opções, ela pode acariciar o filho, estimular o contato pele com pele e a troca de olhares, que é muito importante para criar o laço entre eles”.
Reforçando a ideia da campanha Agosto Dourado, ela elucida que esse suporte às mães que não conseguem amamentar é fundamental. “Algumas mulheres, por estética ou outros fatores, optam por não amamentar. Entretanto, algumas mães sonham com esse momento e quando não conseguem sentem sensações de insuficiência e desvalia. E, mesmo sendo algo de ordem da natureza, acreditam que a culpa é delas. Isso tudo pode gerar frustração e até depressão”.
Além das consequências emocionais, a não amamentação pode gerar um desconforto para a mulher. É o que explica a mastologista e membro da Sociedade Brasileira de Mastologia – Regional Minas Gerais, Natália Motta. “Na teoria, as mulheres no pós-parto tem a capacidade fisiológica de produzir o leite, mesmo às com baixa reserva energética e proteica. Na prática, porém, alguns fatores cessam essa produção ou geram um desconforto grande para elas”.
Segundo a especialista, mulheres ansiosas, que não foram bem orientadas ou que não tiveram a ajuda da família, podem ter essa dificuldade. “O estresse e a dor dificultam o processo de amamentação. Isso porque a mãe tende a trocar o bebê de seio e, com isso, acaba provocando o ingurgitamento mamário. Muitas vezes, a mulher produz o leite, mas a dificuldade vem na hora de esvaziar a mama. E, para isso, é preciso um ambiente adequado, orientação e uma pega correta do bebê. Do contrário, a mulher pode passar por um problema crônico de dor, a mama pode ficar avermelhada, endurecida, podendo até mesmo inflamar ou infeccionar, causando problemas como fungos e até a mastite”.
Leite de mãe
Por situações como a de Eleuza e de tantas outras mães que não conseguem amamentar, a doação de leite se torna extremamente importante. A coordenadora do Banco de Leite da Maternidade Odete Valadares, Maria Hercília Barbosa, ressalta que a doação contribui para melhorar a sobrevida de bebês prematuros e dos que estão nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) neonatais.
Apesar das doações terem diminuído no começo da pandemia, algumas mudanças foram feitas para que os índices voltassem a um nível satisfatório. “Nós entramos em contato com todas as doadoras e indicamos que continua sendo seguro o procedimento. Hoje, todo o cadastro é feito pelo telefone, elas enviam os exames por e-mail e, após avaliação da nossa médica, agendamos tudo para que a doação seja feita com segurança. Para doar, a mulher deve estar saudável, não fumar, beber ou fazer uso de medicamentos que contraindiquem a prática. Ela precisa ainda ter todos os exames de HIV, hepatite e sífilis negativos. Por fim, ter excedente de leite, afinal, ela doará o que estiver sobrando”.
A nobreza do ato fez com que a empresária Thais Afonso decidisse se tornar uma doadora. “Em um curso preparatório de amamentação, falou-se muito sobre a importância dos bancos de leite e antes da minha filha chegar, pesquisei os locais, comprei uma bomba de extração e passei pela triagem. Depois de mais de um ano, sou ‘mãe de leite’ de tanta criança e não conheço nem o rostinho delas. Mas me sinto realizada por fazer parte do crescimento de cada uma”.
Para ela, a maior dificuldade foi encontrar o tempo necessário para a doação. “Leva cerca de 40 minutos todo o processo. É preciso esterilizar tudo, seguindo os protocolos do banco de leite. Além de preparar um ambiente calmo e silencioso para que a extração seja possível. É uma logística difícil, mas vale a pena, principalmente pelo resultado final”, assegura.