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Brasil ocupa nono lugar em ranking de desigualdade social

Mário Pires de Moraes

O Brasil é o nono país com mais desigualdade social no mundo. Os dados são da Síntese de Indicadores Sociais, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base nos parâmetros do Banco Mundial (Bird). De 2012 a 2019, a quantidade de pessoas que estão na miséria passou de 6,5% da população para 13,5%, o que representa 13,6 milhões de cidadãos.

A pandemia agravou a situação. Somente durante a primeira onda, mais de 30% dos 211,8 milhões de residentes nos 5.570 municípios brasileiros tiveram de ser socorridos na etapa inicial do auxílio de R$ 600 aprovado pelo Congresso. Em entrevista ao Edição do Brasil, o pesquisador de racialidade, desigualdades e educação, Mário Pires de Moraes, afirma que há um abismo entre os mais ricos e os mais pobres

O Brasil é o nono país com mais desigualdade social. A que você atribui isso?
Isso vem da nossa construção histórica, herdeira da violência da escravidão e da desumanização de negros e indígenas. Além da usurpação das terras e culturas indígenas, a exploração das riquezas da terra e sua distribuição desigual que favoreceram o homem branco, europeu, heterossexual e cristão. Para além disso, o Brasil fomenta seu projeto de desigualdade e exploração da pobreza como classe altamente consumidora e desprivilegiada no aproveitamento das suas riquezas. Ou seja, o país foi historicamente construído como desigual em raça, gênero e classessociais, e permanece reproduzindo isso.

Quais são os tipos de desigualdade social e quais estão presentes no país?
A desigualdade está evidente basicamente no abismo entre os mais ricos e os mais pobres, na estrutura racista que segrega o povo negro, sobretudo os retintos, e na estrutura patriarcal que alimenta uma falsa impressão de igualdade de gêneros entre homens e mulheres. Isso sem entrarmos no mérito da diversidade de autodeclaração de gênero, onde essa realidade se torna ainda mais perversa. Toda forma de desigualdade diz respeito à negação do acesso dessas populações a direitos constitucionalmente reconhecidos ou a situaçõescotidianas de discriminação, visão estereotipada e de deslegitimação de suas histórias e até mesmo de suas existências.

Como a pandemia impactou nessa questão?
Existem estudos internacionais que mostram que os mais ricos acumularam ainda mais capital durante a pandemia. O isolamento fez com que o trabalhador, que usa todo o seu salário para se sustentar durante o mês, tivesse o seu poder de compra diminuído, por isso ele não tem reservas financeiras.

Fez também com que essas pessoas chegassem a situações mais críticas, como não contar com o básico. Em contrapartida, grandes empresários dispensaram mão de obra, abriram braços digitais dos seus negócios e conseguiram surfar na onda do aumento da miséria. A pandemia escancarou aquilo que já sabíamos: o capitalismo é um motor de produzir desigualdades e desumanidades.

O que falta para que o Brasil reduza os índices de desigualdade social?
Falta muito e em diversas frentes. A taxação de grandes fortunas e reformas que diminuam impostos sobre itens básicos para a sobrevivência, como alimentos da cesta básica e gás de cozinha são pontos importantes. Investimento em modernização da seguridade social e, urgentemente, repensar o modelo de Previdência, favorecendo as pessoas e não as empresas. Precisamos de acesso à educação de qualidade, profissionalização com qualificação do pensamento e disseminação de bens culturais. Falta bastante, principalmente, vontade política.

Em sua opinião, o poder público tem feito pouco nessa questão?
O poder público não tem feito nada. Aliás, tem sim: fomentado a desigualdade e cavado com as próprias mãos o abismo que alimenta a miséria de uns e o enriquecimento de outros. Desde o golpe de 2016, o sucateamento dos aparelhos de estímulo à cultura,a perseguição a uma educação libertária e emancipadora, as reformas Trabalhista e Tributária e, em breve, a Administrativa, a desaceleração das políticas afirmativas para população negra e LGBTQIA+ e o reforço dos discursos meritocráticos tem dado o tom da elitização e militarização do nosso país.

Quais as consequências de não combater a desigualdade?
É termos um povo explorado e miserável economicamente, colonizado culturalmente, perseguido racialmente, objetificado nos seus padrões de gênero, deixado à morte pelas necropolíticas, infeliz, improdutivo e se pensando incapaz de reagir. Um prato cheio para os atuais governantes.