Especialista afirma: “Sua carreira não funciona na velocidade 4G” (Foto: divulgação)
“O que você vai ser quando crescer?”. Quem nunca escutou essa pergunta dos pais, familiares ou amigos? Escolher uma profissão não é uma tarefa simples, principalmente quando se é jovem, pois em alguns casos é uma decisão para a vida toda. Após as provas do Enem e a chegada do período de vestibular de algumas faculdades, muitos estudantes passam por esse dilema: “que carreira devo seguir?”. Os dados do Ministério da Educação (MEC) apontam que os cursos mais concorridos (candidatos por vaga) em 2015 foram: medicina (120,4), direito (67,86), psicologia (63,87) e engenharia civil (58,53).
O relatório de Análise Setorial da Educação Superior 2016 da Hope Educacional, mostra que os cursos de engenharia e os demais que também envolvem matemática e física, apresentam um número maior de desistência, principalmente nos 2 primeiros semestres, quando as disciplinas em questão se concentram. Outro fator característico da área é o baixo indicador de concluintes.
De acordo com o Censo da Educação Superior de 2016, de 2010 a 2014 a taxa de desistência total nos cursos superiores saltou de 11,4% para 49%. Nas engenharias esse número foi de 12,8% (2010) para 56,4% (2014), seguido por matemática com 12,8% (2010) e 52,6% (2014). Na terceira posição está o curso de química que foi de 10,6% (2010) para 52,3% (2014), índices que afetam diretamente na quantidade de alunos formados, criando um déficit de profissionais, inclusive de professores.
A professora universitária de matemática Norma Saraiva Soares, leciona para os cursos superiores de Administração e Ciências Contábeis. Segundo ela, a dificuldade dos estudantes nas disciplinas de raciocínio lógico é muito grande. “Toda vez que envolvemos números e o aluno tem que pensar um pouco mais, ele trava. E isso é uma deficiência que vem da base escolar”, afirma. De acordo com ela, a situação dos estudantes do curso de Administração é mais grave. “Geralmente que escolhe contábeis já tem um pouco mais de facilidade e afinidade com os números”, ressalta.
Para tentar reduzir o número de desistentes e reprovados, as universidades têm oferecido cursos para o nivelamento de conhecimento. A professora comenta que esse tipo de estratégia serve para apoiar os alunos e para os resultados serem efetivos, as aulas estão sendo ministradas por docentes. Ela acrescenta que o problema na educação de base é um conjunto de fatores que passam por dois extremos, quando nas escolas particulares há um grande volume de conteúdo que alguns alunos não conseguem absorver, e na escola pública existe a falta de conteúdo. “Isso resulta nesse problema que estamos vivenciando”, acredita.
A coach de carreira e professora da Fundação Getúlio Vargas, Daniela do Lago, conta que, há 4 anos, uma faculdade a contratou para incluir na grade dos alunos do primeiro período uma disciplina chamada gestão de carreira devido à grande evasão de estudantes. Segundo ela, o primeiro sintoma é que a geração é imediatista, muitos se enxergam na capa da revista como o arquiteto do ano, mas para isso acontecer é preciso se formar e passar por etapas na carreira. “As pessoas querem o benefício sem ter o ônus de alcançar o que se almeja. E isso é um grande perigo, pois independente da geração e idade, esse comportamento de enxergar as coisas de forma imediata é prejudicial. Pois a vida não é fácil”, afirma.
Para a especialista, a geração ‘facebookiana’ cria uma expectativa irreal de que a vida é só felicidade. “Sua carreira não funciona na velocidade 4G. Que em pouco tempo você está no topo, mas também não há lugar no topo para todos é uma competição acirrada e você terá que se preparar”, destaca.
A coach alerta que desistir de algo por não gostar de alguma coisa é uma atitude ruim, pois em toda carreira você terá que fazer coisas que você ama e outras não. De acordo com ela, a expressão: “tem que” (termo utilizado pela especialista para denominar atividades que são realizadas por obrigação) é parte da rotina. “A medida que você mostra os resultados para o mundo, essa parcela de ‘tem que’ vai reduzindo, mas não some. As pessoas tem uma expetativa irreal que só irá fazer o gosta. Isso não existe! Com isso vem a frustação e o indivíduo não consegue se encaixar em nenhuma carreira ou lugar”.
Escolha sem neura
São raras as pessoas que sabem que carreira irão seguir aos 17 anos, comenta a especialista. Ela sugere que um bom caminho é começar pelo o que você não quer. Segundo ela, essa é a fase da experimentação, um exemplo são os jovens americanos que trabalham durante o período de férias em atividades simples. “Eles tem uma cultura empreendedora, diferentemente da nossa”, aponta.
A estudante do ensino médio Marilia Almeida, 16, conta que ainda não escolheu qual carreira vai seguir. “Tenho dificuldade porque tem que ser algo que eu tenha certeza vou me sair bem. Quero uma profissão que me proporcione prazer em seguir e que tenha bom retorno financeiro”, almeja a estudante. Para ela, ter uma formação é essencial para que surjam oportunidades. “Independente do curso que eu escolher, eu sei que terei que estudar muito, principalmente nos pontos em que eu tiver dificuldade”, destaca.
Daniela garante que não ter expectativas irreais já é um grande passo na hora de se decidir. “No início você irá ganhar um salário baixo e terá muito tarefas “tem que”. Todo mundo terá que fazer coisas chatas pelo resto da vida, não é privilégio de ninguém”, frisa. Ela orienta: “Faça algo, estude! O problema do Brasil é que não existem bons exemplos. Apenas 0,4% dos brasileiros têm pós-graduação. É um número muito baixo. Como vamos crescer dessa forma?”, questiona a professora.
A coach diz ainda: “Se escolheu, finalize, pois é importante para o país. As empresas olham as habilidades técnicas e comportamentais, mas essa última te impulsiona ou te derruba. E a indecisão é um fator prejudicial”.
Mudança de rumo
O caminho de empreender foi o que Gabriela Senra decidiu trilhar. Ela desistiu do curso de direito no 6° período e conta que depois dessa decisão tudo mudou. “Abrir uma empresa na área de engenharia e, atualmente, devido a minha posição, curso engenharia”.
O curso técnico supriu as necessidades da técnica de enfermagem, Juliana Maria, 32, que desistiu do curso superior de enfermagem. Ela já atuava em um hospital e ingressar na faculdade seria a melhor opção, mas não foi bem assim. “Hoje trabalho com técnica de enfermagem e não me arrependo de ter desistido do curso. Naquela época eu não tinha maturidade para faculdade e o custo era muito alto”, relembra.
Linha do tempo da carreira
“Como a expectativa de vida está maior, podemos afirmar que todos terão duas carreiras. Independente da área escolhida, nenhum conhecimento será perdido. Esse é o momento que chamo de ‘será que?’”, prevê a especialista.