Segundo o relatório anual do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, foram detectados 136 incidentes racistas no ano passado, 39% a mais que os 98 registrados em 2022. É o maior número desde que a organização começou a fazer a contagem, em 2014, ano em que o Brasil sediou a Copa do Mundo da Fifa.
De acordo com o Observatório, desde 2016, observa-se um avanço anual, à exceção em 2020, em função da pandemia de COVID-19. Em relação a 2014, primeiro ano do monitoramento, os incidentes aumentaram em 444% (de 25 para 136). Para discutir o assunto, o Edição do Brasil conversou com o diretor-executivo do Observatório, Marcelo Carvalho.
Qual é o impacto desses atos de racismo nos jogadores e na sociedade como um todo?
Uma questão importante é que a maioria dos casos acaba sem punição aos envolvidos, sendo o maior impacto na sociedade. Para os jogadores, afeta um pouco a saúde mental, naquela questão de ter que se provar o tempo inteiro. Há alguns anos, os esportistas não falavam sobre o tema, passavam pela situação e silenciavam. Hoje, o assunto é mais abordado, porém, muitos não denunciam com medo de represália.
Como as organizações de futebol, Fifa e federações locais têm respondido a esses incidentes?
Na maioria das vezes, aplicam uma punição financeira, o que não resolve o problema. Eles precisam trabalhar com a questão da educação e conscientização. Mas existe uma grande dificuldade de ter campanhas assertivas, visto que os membros que administram essas instituições não sabem o que é racismo e nem como lidar com ele. Enquanto não começarem a trabalhar a questão da diversidade dentro desse espaço, vamos continuar tendo problema.
Qual é o papel da mídia na cobertura dos casos de racismo?
Tem um papel fundamental, porque antes de 2014 havia poucas referências aos casos de racismo que aconteciam. Hoje o tema é mais divulgado e debatido na sociedade por causa da mídia. O ponto negativo é que a imprensa precisa não apenas noticiar, mas também acompanhar o desfecho e questionar as autoridades competentes sobre a punição.
Quais medidas educativas poderiam ser implementadas para combater o problema?
As pessoas precisam entender o que é o racismo e como ele afeta a sociedade. Muitas vezes vem disfarçado de uma brincadeira, mas com resultados devastadores para a população negra. Uma das possíveis mudanças que podem acelerar o processo de combate ao racismo no futebol é o papel dos patrocinadores. Quando começarem a dizer que não vão investir em uma competição com casos de racismo, as entidades esportivas vão passar a agir.
Você acredita que o futebol pode ser um veículo eficaz para a mudança social em relação ao racismo?
Acredito muito que o futebol pode ajudar no combate ao racismo. O esporte nos dá essa possibilidade de discutirmos de forma ampla e com uma parcela muito maior da sociedade algumas mazelas, por conta de pessoas públicas estarem envolvidas e chamar mais atenção da mídia.