Desemprego, crise hídrica e inflação resultam em aumentos consecutivos nos preços de produtos e serviços. Para o brasileiro, já não há mais tempo hábil para solucionar esses problemas em 2021. Nova rodada da pesquisa Radar Febraban, realizada no início de setembro, mostra que 68% da população estima que a economia só deve dar sinais de melhora a partir de 2022. Esse percentual ultrapassa os 70% na faixa de 25 a 44 anos e 75% entre os que têm ensino superior e recebem de 2 a 5 salários mínimos.
De acordo com o levantamento, feito trimestralmente, somente 9% têm expectativa que a situação econômica melhore este ano, uma queda de 4 pontos em relação a junho e retorno ao patamar de março. Já a parcela que não enxerga quaisquer perspectivas de dias melhores cresceu gradativamente: 9% em março, 12% em junho e 15% agora. E o mais grave: os jovens são os mais desacreditados, 21% dos entrevistados de 18 a 24 anos não têm nenhuma esperança em relação à economia em 2021.
Para o economista e professor de comércio exterior, Leandro Diniz, as pessoas estão realistas. “A perspectiva é de piora. Primeiro, por conta do que a pandemia fez com a atividade empresarial. Segundo, é nítido o maior endividamento das famílias brasileiras devido à redução da capacidade de pagamento por causa de uma renda que é comida pela inflação. E, principalmente, por falta de esperança que as atividades econômicas consigam decolar totalmente em 2022”, afirma.
Parte do negativismo que assola o país pode ser atribuído à próxima fatura de energia elétrica. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou a criação da “bandeira tarifária escassez hídrica” que já está em vigor e adiciona R$ 14,20 às contas a cada 100 kW/h consumidos, o que representa uma alta de 49,63% em relação à bandeira vermelha patamar 2, até então a mais alta do sistema.
Mas, como explica a mentora em finanças Silvia Machado, até o “remédio” para a crise agrava a “doença”. “Essa nova medida foi criada para tentar inibir o nosso consumo. O grande problema é que, além de ser mais cara, ela afeta todos os campos da economia. Energia é como o combustível, quando aumenta todos os produtos encarecem, pois, as empresas vão pagar mais caro para produzir, logo, os preços no supermercado também sobem”, diz.
Silvia reforça que as empresas ficam sem saída. “A indústria continua consumindo a mesma quantidade de energia para a produção, só que com valor da conta mais alto. Então, ela também vai calcular essa despesa e alterar o preço. Por isso, vemos as pessoas mudarem hábitos alimentares, de consumo e até mesmo de transporte. Seja pegar uma carona em vez de ir de carro, usar o transporte público ou a bicicleta porque o orçamento familiar está mais apertado num período de tantas restrições de salário, queda de receita e perda de emprego”, exemplifica.
Diniz concorda com a fala da mentora em finanças. “O Estado aumenta os tributos no afã de coletar mais dinheiro para resolver o problema, só que, ao fazer isso, o próprio governo acaba afetando o custeio de uma produção. A indústria fica mais cara e, automaticamente, o produto encarece”.
Mesmo com uma boa condição financeira, a dona de casa Grazielli Ferraz, 35, precisou cortar uma série de gastos para lidar com os novos preços nas gôndolas. “O principal corte vai ser tirar meu filho mais novo da escola particular no ano que vem, mas o nosso plano, inicialmente, é que ele retorne quando a situação melhorar porque sabemos que a educação precisa ser uma prioridade. Mas, ficou insustentável. Fora isso, tivemos que fazer várias adaptações no supermercado ou simplesmente deixamos de comprar algumas coisas. Sinceramente, estou com medo da próxima fatura de energia”, conta a mãe de três meninos.
Na análise dos dois especialistas, três principais fatores devem impactar no bolso da população nos próximos meses. “Analisando friamente, todos os produtos e serviços que possuem relação com os governos, federal ou estadual, são os que mais pesaram. Combustível, energia e água. Porém, é preciso lembrar que o governo tem gastado um dinheiro absurdo para manter uma série de benefícios sociais, como o auxílio emergencial devido ao alto nível de desemprego. Ou seja, o governo precisa injetar dinheiro na máquina pública para mantê-lo. É um ciclo negativo que nenhuma administração até hoje conseguiu quebrar”, alerta Diniz.
Para Silvia, nesse cenário, restam poucas opções às famílias. “É preciso rever alguns hábitos e o estilo de vida. Considere um aluguel mais barato ou o carro na garagem que é pouco usado, mas que ainda está financiado. É o momento de continuar com esse empréstimo? Infelizmente, já são mais de 67% das famílias endividadas. O principal conselho é respirar, sentar e buscar resolver o que dá em curto prazo. Tente reduzir aquela assinatura de revistas ou streaming que não utiliza. Opte por pesquisa de preços para compras necessárias. Todo valor mais baixo é bem-vindo, mesmo que sejam centavos porque, no final, faz diferença. Reveja contratos, financiamentos e taxas de juros. Em algumas situações, a portabilidade pode fazer com que a parcela seja menor ou a redução do tempo para pagamento”, aconselha.