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Transplantes de órgãos caem 30% em Minas Gerais

No Brasil, número de doadores diminuiu 13% | Foto: Divulgação/Internet

A campanha Setembro Verde é dedicada à conscientização para a importância da doação de órgãos. Dados do MG Transplantes apontam que houve uma queda de 30% nos transplantes realizados em Minas Gerais no comparativo entre 2019 e 2020. Isso tem ocorrido, principalmente, pelo aumento de 50% na recusa familiar em doar os órgãos do ente que faleceu.

No Brasil, a pandemia impactou os índices. Apesar de a taxa de notificação de potenciais doadores ter crescido 13% no primeiro semestre, o número de cirurgias caiu no mesmo percentual. Os dados são da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO). A queda se deve a perda de 24,9% na taxa de efetivação da doação e, também, a alta de 44% na taxa de contraindicação, em parte pelo risco de transmissão da COVID-19, pela dificuldade de se fazer o teste PCR para a detecção da doença ou para obter o resultado rapidamente.

Tudo isso afeta a fila de espera. O último balanço divulgado pelo MG Transplantes assinala que 4.981 pessoas aguardam por um órgão no estado. No Brasil, ainda em 2020, esse número passava de 40 mil. Estima-se que, em todo país, o número de pacientes que morrem a espera seja de 44%. Por isso, aguardar o “sim” de uma família pode ser angustiante.

Para Valeska Porto, mãe de Maria Eduarda Porto que, com apenas 13 anos, travou uma longa batalha até conseguir um novo rim, é preciso falar mais sobre o tema. “A Duda nasceu prematura de 6 meses porque teve uma obstrução no canal do ureter. Ela já estava com sofrimento fetal e, por isso, foi preciso fazer o parto, pois a urina não passava no canal da uretra e isso estava prejudicando os rins. Quando ela nasceu, foi levada para cirurgia a fim de tentar salvá-los. Ela ainda nasceu com má formação urinária por causa da prematuridade”.

Aos 13 anos, Maria Eduarda celebra a nova vida após o transplante | Foto: Arquivo pessoal

De lá para cá, Maria Eduarda passou por 16 cirurgias. “Em novembro de 2019, Duda amanheceu com o rosto inchado, fui ao médico e ela teve uma parada respiratória. Minha filha foi levada ao Centro de Terapia Intensivo (CTI) e recebeu um cateter de hemodiálise. Esse tratamento seria feito até conseguirmos um novo rim. Na minha família, só meu marido era compatível, mas, com a pandemia, o processo se tornou mais lento, uma vez que o quadro dela estava relativamente controlado. Em novembro de 2020, estávamos na hemodiálise e o médico me ligou avisando que havia um órgão compatível com ela chegando de Ipatinga. Uma criança da mesma idade da Duda sofreu morte encefálica e a família iria doar seus órgãos. Fomos para o hospital, ela fez todos os exames e estava apta a receber a doação”.

O tempo de espera não foi fácil. “É difícil ter uma criança diagnosticada com uma doença que não tem cura. Nós sabíamos que o transplante traria uma qualidade de vida que ela não tinha. Há 10 meses, Duda pesava 25 quilos e tinha 1,10m de altura. Hoje, pesa 40 kg e tem 1,43m de estatura. A doação mudou a vida dela. Por isso, é preciso falar mais sobre o tema. É necessário tratar o assunto nas escolas para que as crianças cresçam entendendo a importância disso e, num futuro próximo, a gente tenha famílias que entendam e respeitem a vontade do doador”.

Quando a doação é para uma criança, como no caso de Maria Eduarda, tudo fica ainda mais delicado. É o que explica o gastro hematologista Antônio Marcio Andrade. “A morte de uma criança é algo incomum, inesperado e difícil de aceitar. Desse modo, é ainda mais duro para a família, em um momento de tanta dor, tomar esta decisão, porque provavelmente a ideia nunca tinha sido discutida antes. Como esse tipo de doação é mais raro, a fila move-se lentamente, sobretudo, em casos onde não é possível fazer transplante intervivo – rins, fígado e medula, por exemplo”.

Essa situação reforça a importância de se falar sobre transplante infantil, segundo o nefrologista José de Resende Neto. “Existe um protocolo a ser seguido e, no Brasil, isso funciona muito bem. Quando uma pessoa apresenta o quadro de morte encefálica, passa por uma série de exames para que isso seja confirmado. Após a conclusão, a família é avisada. Por isso, é essencial que a pessoa fale em vida que quer ser doadora”.

Ele acrescenta que essa postura deve ser adotada, porque é complexo abordar a família que está passando por esse processo de luto. “Isso reduz muito o potencial de doação. É preciso reforçar que uma pessoa salva várias vidas com a doação de órgãos. É um gesto nobre e conversar com os familiares e amigos sobre esse desejo é fundamental para que ele seja respeitado”.