O Brasil está em chamas. No Cerrado, savana mais biodiversa do mundo, foram registrados mais de 38 mil focos de calor. Na Amazônia, o número de queimadas e incêndios florestais já superou o mês de setembro do ano passado, um crescimento de 86%.
Mas é no Pantanal, maior planície interior inundada do mundo, que as queimadas preocupam mais. Isso porque a quantidade de focos de incêndio já é a maior desde 1998, quando a taxa começou a ser monitorada. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), 18,6% do território já queimou. A área é equivalente a 3 milhões de Maracanãs. No total, 2,3 milhões de hectares foram devastados.
Marcelo Laterman, porta-voz da campanha de Clima e Justiça do Greenpeace, explica que as queimadas chamam a atenção por não serem fenômenos naturais. “Há duas razões principais: um governo que promove o desmonte dos instrumentos de controle ambiental, incentivando – pela certeza de impunidade – os crimes como os que deram origem às queimadas no Pantanal; e as mudanças climáticas, responsáveis pelo aumento de eventos extremos como a estiagem prolongada que atinge a região pantaneira e dificulta a contenção do fogo”.
O episódio é resultado da queima proposital de áreas. Segundo ele, isso é feito para limpeza de pastagem, de material de desmatamento e estradas. “Dados do Prevfogo/ Ibama mostram que 98% dos incêndios no Pantanal são oriundos de ações antrópicas, ou seja, realizadas pelo homem”.
Além disso, a sucessão de anos com poucas chuvas, ventos secos e baixa umidade do ar auxiliaram na propagação dos incêndios. “Os rios do Pantanal receberam pouca água no último ano, isso reduziu as áreas de inundação, promovendo a propagação de incêndios. Fora isso, o governo desmantelou órgãos ambientais de prevenção e controle a incêndios como o Prevfogo/Ibama, cortando verbas por 2 anos seguidos, além de não apresentar nenhum plano de ação e prevenção ao desmatamento do Pantanal ou qualquer outro bioma”.
Laterman diz que o Pantanal possui a maior concentração de vida selvagem do continente. “É um paraíso ecológico com centenas de espécies de animais como pássaros, milhares de variedades de borboletas, macacos-prego e outros. Além da onça pintada, ameaçada de extinção, assim como as araras azuis e ariranhas. Toda essa riqueza está em risco”, alerta.
Hábitos e destruição
Os hábitos de vida do brasileiro impactam nas queimadas. O professor de Ciências do Ambiente e Sustentabilidade nas Organizações, Carlos Cerqueira, explica que devemos nos atentar mais a política. “Não podemos achar que os incêndios são uma questão cultural e imutável ou que acontece em lugares distantes e não abalam a vida na cidade. O combate ao desmatamento é função de todos, precisamos cobrar dos governantes ações que protejam o meio ambiente, os indígenas, valorizar os produtores locais e orgânicos. Entender que nossas escolhas em termos políticos e de consumo tem impacto importante nos biomas do Brasil”.
O porta-voz do greenpeace, inclusive, dá como exemplo a produção de gado, que é o principal motor do desmatamento. “O consumo de carne mais do que dobrou nos últimos 60 anos, à medida que a terra foi convertida para uso agrícola em um ritmo sem precedentes. A maioria dos incêndios foi criada por fazendeiros para limpar a terra, portanto, a quantidade de carne que consumimos tem impacto na floresta”.
Laterman acrescenta que as autoridades brasileiras têm feito um esforço de narrativa e propaganda para esconder o que de fato ocorre no Brasil. “As queimadas estão sem controle e a responsabilidade disso é da política antiambiental do governo federal, com o falso discurso de que a destruição ambiental é necessária para o desenvolvimento econômico. Está na hora de todas as pessoas, empresas e governos que estão realmente comprometidos com o futuro desses biomas, da vida e do planeta, exigirem providências para acabar com a destruição e impedir que os maiores tesouros do nosso país virem cinzas para o lucro de uma pequena minoria”.
E o futuro?
O porta-voz do Greenpeace esclarece que as queimadas chegaram a um ponto que a solução imediata de contenção é a chuva. “Há muito esforço das brigadas, no entanto, mesmo depois dos temporais, tem que haver um trabalho de prevenção, monitoramento e uma regulamentação de proteção, além do uso responsável da terra. É necessário ter brigadas de prevenção e combate ao fogo de forma permanente e o fim da impunidade aos crimes ambientais”.
Quando tudo isso passar, ainda será preciso fazer um trabalho de controle. “É fundamental termos uma regulamentação que garanta a proteção de todos os biomas e o estabelecimento de normas, procedimentos, fiscalização e punição aos responsáveis por esses crimes. Além disso, é essencial que haja um esforço, não só de preservação, mas também de recuperação de áreas degradadas e reflorestamento, assim como a demarcação de terras indígenas – que garantem historicamente o uso sustentável das florestas”