
As Defensorias Públicas do Brasil realizaram mais de 29,5 milhões de atendimentos em 2024, quase 20% a mais do que em relação ao ano anterior. O número de manifestações processuais também subiu, alcançando 25,9 milhões, alta de 45,3%. E os processos judiciais iniciados somaram 4,4 milhões. Os dados são da Pesquisa Nacional da Defensoria Pública 2025. Segundo o estudo, em Minas Gerais, a Defensoria Pública realizou 1.786.492 atendimentos no ano passado.
O co-coordenador-geral da pesquisa, Júlio Camargo de Azevedo, destaca que o crescimento é resultado de múltiplos fatores. “De um lado, temos o agravamento de questões socioeconômicas, como endividamento familiar, desemprego e retração de políticas públicas. De outro, nota-se uma elevação importante na conscientização da população sobre seus direitos, impulsionada pela atuação institucional da Defensoria e por canais de informação mais acessíveis”.
“Soma-se a isso a ampliação, ainda que gradual, da presença da Defensoria Pública em diversos Estados, bem como o uso crescente de ferramentas digitais, que vêm facilitando o atendimento remoto. Esses avanços têm permitido que mais pessoas encontrem na Defensoria, um caminho concreto para acessar a Justiça”, acrescenta.
Sobre o número de manifestações processuais, Azevedo avalia que entregar mais com menos recursos é o maior desafio das Defensorias Públicas. “A equação é sustentada, em grande parte, pela dedicação e pelo compromisso de defensores, servidores e estagiários, que têm atuado com admirável senso de missão pública. Além disso, a incorporação de soluções tecnológicas e a modernização da gestão institucional vêm permitindo maior racionalização dos fluxos de trabalho. Ferramentas digitais têm sido fundamentais para otimizar a atuação e qualificar a prestação dos serviços, mesmo diante da limitação de quadros. Com mais estrutura e financiamento adequado, a Defensoria Pública certamente poderia alçar voos ainda maiores”.
Conforme o levantamento, 52% das comarcas brasileiras (1.334 de 2.563) contam com atendimento regular. Em outras 1.029 comarcas (40,2%), o serviço é prestado de forma complementar, muitas vezes por meio da advocacia dativa. Azevedo aponta que a diferença de orçamento para outros órgãos da Justiça atrapalha o cumprimento da Emenda Constitucional nº 80/2014, que determina a presença da Defensoria em todas as comarcas. “Os orçamentos do Ministério Público e do Judiciário foram, respectivamente, 261,9% e 1.432,5% maiores do que os da Defensoria. Isso compromete seriamente a universalização da assistência jurídica gratuita”.
“Outro entrave é o desvio de recursos públicos para o pagamento de advogados particulares designados para atuar em locais onde deveria haver atuação direta da Defensoria Pública. Embora a advocacia dativa suplementar exerça um papel relevante, ela não substitui a função pública da Defensoria, que vai além da judicialização”, completa.
Em todo o Brasil, hoje são 7.520 defensoras e defensores públicos, o que equivale a um profissional para cada 31.107 habitantes. Quando se considera apenas a população em situação de vulnerabilidade, a média sobe para um defensor a cada 27.363 pessoas. Já na Justiça Federal, há apenas um defensor da União para cada 309.889 habitantes.
Essa limitação impõe sobrecarga aos serviços jurídicos e compromete a universalização do acesso à Justiça, avalia o coordenador-geral da pesquisa. “A principal iniciativa para reverter esse quadro passa pela correção das distorções orçamentárias que afetam a Defensoria. É preciso assegurar, por meio de vontade política e mobilização social, os meios materiais e humanos necessários para que a Defensoria Pública esteja efetivamente presente onde o povo está. Só assim o acesso à justiça deixará de ser promessa constitucional para se tornar realidade cotidiana”.
Para os próximos anos, Azevedo aponta que três frentes devem ser priorizadas. A ampliação da presença territorial das defensorias públicas, investir em transformação digital para aumentar a capilaridade dos serviços e fortalecer a atuação extrajudicial e coletiva, especialmente junto a grupos vulnerabilizados. “A Defensoria Pública tem demonstrado, dia após dia, sua capacidade de fazer muito com pouco. O que ela precisa, agora, é de condições institucionais para fazer o necessário com a dignidade que a Constituição exige”, finaliza.