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Ao menos 56 crianças morreram em desafios on-line nos últimos anos

Caso mais recente foi o da menina que inalou desodorante / Foto: Rawpixel.com/Chanikarn Thongsu

Segundo o Instituto DimiCuida, de 2014 a 2025, ao menos 56 crianças e adolescentes, com idades entre 7 e 18 anos, morreram no Brasil em decorrência de desafios compartilhados nas redes sociais. Os dados se baseiam em relatos de famílias e casos noticiados em jornais.

A ocorrência mais recente foi a da menina de 8 anos, Sarah Raissa, do Distrito Federal, que morreu após inalar um desodorante aerossol. A tia da menina disse nas redes sociais que a garota participou de um desafio no Tik Tok que consiste em inalar o produto pelo máximo tempo possível. Porém, esse não é um caso isolado, segundo a Polícia do Rio de Janeiro, nos últimos anos, 50 menores de idade, entre crianças e adolescentes, morreram depois de serem induzidas a cometer crimes em plataformas digitais. No início do ano, por exemplo, um adolescente de 14 anos, Davi Nunes Moreira, morreu após misturar uma borboleta morta com água e injetar no próprio corpo em Vitória da Conquista, na Bahia, o denominado “Desafio da Borboleta”.

A advogada civilista, Gabriela Maciel Campos, explica que embora não haja uma legislação específica para punir esses desafios que colocam em risco a vida ou a integridade física das pessoas, quem cria ou divulga esse tipo de conteúdo não fica impune. “Os artigos 122 e 132 do Código Penal, por exemplo, punem o induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, bem como, quem expõe a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente”.

“Cabe destacar que, recentemente, foi criado um Projeto de Lei que propõe alterações no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), pois as crianças e jovens são as vítimas mais afetadas por esse tipo de conduta. O projeto visa criminalizar a criação e o incentivo, além do compartilhamento desses desafios que o induzem a participar de jogos perigosos de forma on-line ou off-line com consequências prejudiciais à saúde física ou mental”, afirma a profissional.

Ela ressalta também que as plataformas podem sim sofrer sanções e serem responsabilizadas pelos conteúdos postados e veiculados por seus usuários. “Contudo, é necessário que haja omissão, ou seja, só podem ser responsabilizadas civilmente pelos conteúdos postados por terceiros se não tomarem providências após uma ordem judicial que determine a remoção”.

Recentemente, o governo federal disse que pretende retomar a discussão da regulamentação das redes no Congresso. A advogada afirma que essa retomada do debate no Congresso Nacional pode ajudar significativamente a reduzir crimes ligados a esses desafios perigosos na internet. “Isso porque podem ser criadas normas que imponham deveres e responsabilidades a plataformas como Tik Tok, YouTube, Instagram, entre outras, quanto ao conteúdo que circula nelas, além de regras que obriguem as plataformas a monitorar e bloquear preventivamente conteúdos de alto risco, com algoritmos de moderação reforçados”.

Cuidados

O psicólogo e professor da Faseh, Welder Vicente, pontua os sinais comportamentais que os pais devem prestar a atenção. “Isolamento repentino ou evitação de interações familiares; mudanças no sono, alimentação ou humor; uso excessivo de dispositivos digitais, especialmente em segredo; mentiras frequentes sobre o que está fazendo on-line; participação em brincadeiras perigosas ou com riscos físicos; e interesse por conteúdos sombrios, violentos ou autodepreciativos. Esses indícios, quando aparecem juntos e de forma persistente, indicam que algo precisa ser investigado com cuidado”.

Vicente esclarece que a prevenção começa com a educação emocional e digital. “Criar um espaço seguro de diálogo em casa, onde o jovem se sinta ouvido sem julgamento; estimular o pensamento crítico; ensinar habilidades sociais e de enfrentamento, que fortalecem a autoestima e a capacidade de dizer ‘não’; entre outras medidas”.

“Vale lembrar que esses desafios on-line muitas vezes exploram uma fase de maior vulnerabilidade emocional. Crianças e adolescentes estão construindo sua identidade e precisam de modelos seguros, limites claros e escuta ativa. A prevenção mais poderosa ainda é o vínculo: jovens que se sentem pertencentes, valorizados e compreendidos tendem a buscar menos esses caminhos perigosos”, alerta.