Na atualização do ranking publicada em janeiro pelo Grupo de Investigação Eleitoral (Giel) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Unirio), Minas Gerais teve oito ocorrências com lideranças políticas como vítimas no último trimestre de 2023, o que o deixa na segunda posição no cenário nacional, atrás apenas de São Paulo, que teve 14 registros. Dos casos, dois foram ameaças e seis foram homicídios, sendo o estado que mais apresentou assassinatos entre outubro e dezembro do ano passado.
Essa violência atinge ambos os sexos, porém, para as mulheres vêm também carregada de misoginia, na intenção de afastá-las da política como se não fosse um lugar a ser ocupado por elas. Para discutir o assunto, o Edição do Brasil conversou com a subcoordenadora de pesquisa do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher da Universidade Federal de Minas Gerais (Nepem/ UFMG), Viviane Gonçalves.
O que é violência política?
Segundo o que estabelece a Lei nº 14.197/2021, entende-se por violência política o ato de “restringir, impedir ou dificultar, com emprego de violência física, sexual ou psicológica, o exercício de direitos políticos a qualquer pessoa em razão de seu sexo, raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Já a Lei nº 14.192/2021 trata especificamente da violência política contra as mulheres, definida por ela como “toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos da mulher”. É importante salientar que as eleições de 2022 foram as primeiras nas quais essas duas leis a respeito da violência política estiveram em vigor no Brasil.
Como isso impacta a nossa sociedade?
Tem um grande impacto por normalizar a barbárie, ir contra a pluralidade de ideias ao passar a mensagem de que não se aceita o diferente, que apenas uma forma de pensar ou agir é legítima nos espaços de poder e de tomada de decisão que organizam nosso cotidiano. Assim, se coloca em risco não apenas os direitos políticos, como também os civis e sociais, configurando um ataque à própria cidadania.
A violência política acontece mais com lideranças femininas?
A violência política pode atingir homens e mulheres, no entanto, as lideranças femininas acabam por sofrer mais justamente porque às mulheres já é colocado que o espaço público não seria naturalmente para elas. O debate sobre violência política contra as mulheres precisa considerar desde a socialização das crianças, passando pela divisão sexual do trabalho, pelas condições diferenciadas de mulheres e homens no mercado profissional, na aposta dos partidos políticos em suas candidaturas e tantas outras camadas que atuam como barreiras para que mulheres atuem nos espaços públicos, em especial, na política em igualdade com seus colegas homens.
Essa violência está ligada somente ao gênero ou também a assuntos defendidos por essas parlamentares?
A violência política que acomete as mulheres não se restringe ao gênero, estando ligada a diversos fatores, como raça, sexualidade, classe social, territorialidade, geracional e agenda programática. É importante considerar que a violência política contra as mulheres pode atingir a todas, independentemente do espectro ideológico ou partido a que se vinculem, visto que quando uma é alvo de ataques ou ameaças, o recado dado a todas as demais é bem explícito: “este lugar (a política) não é para vocês”.
Qual é o caminho para mudar esse cenário?
Estudos sobre o tema mostram que isso não cabe apenas ao poder público, mas também é necessário que cada pessoa no seu grupo de convivência e organizações da sociedade, em âmbito local, nacional e mundial, se coloquem como responsáveis na luta contra a violência política e, em especial, contra a violência política contra as mulheres.
As pesquisadoras Mona Lena Krook e Juliana Restrepo Sanín, por exemplo, dizem que as organizações da sociedade civil podem atuar na conscientização de eleitoras, ativistas e candidatas para lhes explicar o conceito de violência política e prestando serviços de apoio às vítimas. Os membros dos setores de justiça e segurança podem pactuar protocolos e procedimentos para responder às vítimas da violência política contra as mulheres e capacitar policiais para que reconheçam e respondam de maneira adequada às denúncias.
Por último, os meios de comunicação podem capacitar jornalistas para que a cobertura da imprensa seja mais sensível a questões de gênero e usar as redes sociais como ferramenta para denunciar atos de violência política contra as mulheres, a fim de pressionar os responsáveis.